A teoria chinesa de “tripla revolução” e a análise marxista

 

 

Cheng Enfu e Yang Jun (*)

 

 

Naquilo que é conhecido como a Nova Era, começando em 2012 com a ascensão de Xi Jinping como presidente do Partido Comunista da China (PCC) e presidente da República Popular da China (RPC), tem-se assistido a um avanço constante da sinização da teoria marxista e do conceito de socialismo com características chinesas, espalhando-se por todos os aspetos da sociedade e adotado como princípio governante para a China como um todo. Esta transformação não é vista, no entanto, como uma rotura brusca com o passado, mas como uma progressão adicional da Revolução Chinesa, simbolizada pelos seus três líderes supremos ao longo da sua história, Mao Zedong, Deng Xiaoping e Xi Jinping, simbolizando os períodos da Tomada Revolucionária do Poder, da Reforma Revolucionária (ou Revolução da Reforma) e da Nova Era, agora vista como representando o período da Revolução de Transição visando completar a revolução. O apelo para "levar a revolução à sua conclusão", introduzido pela primeira vez por Mao, foi retomado por Xi em 2016 e, nos últimos anos, tem sido um tema persistente nos seus discursos e nas estratégias de longo prazo que o PCC tem vindo a promover. Representa, portanto, uma nova fase na Revolução Chinesa, que celebrou recentemente o seu septuagésimo quinto aniversário.

 

Estas mudanças na progressão histórica da Revolução Chinesa levaram a várias tentativas de teorizar as três etapas da revolução. Aqui, Cheng Enfu e Yang Jun apresentam aquilo a que chamam a "Teoria da Tripla Revolução". O seu artigo é um produto da Sinização do Marxismo e foi escrito principalmente para o público chinês e para os marxistas de todo o mundo que têm acompanhado o progresso da Revolução Chinesa. Como o seu argumento é de carácter lógico e histórico, ao mesmo tempo que retrata vários pontos de vista alternativos, deve ser facilmente compreensível para leitores pacientes e atentos. No entanto, encorajamos os leitores que considerem a jornada trabalhosa a saltar para o fim, ou seja, para a conclusão, na parte IV, uma vez que esta aborda o que "levar a revolução à sua conclusão" realmente significa, na visão destes autores. Feito isto, será possível examinar todo o seu argumento do início ao fim, com novos e mais profundos vislumbres sobre a evolução do pensamento marxista chinês no presente enquanto história.

 

- Os Editores de Monthly Review

 

 

No marxismo chinês, Xi Jinping reintroduziu a noção, originada com Mao Zedong, de "impulsionar vigorosamente o espírito de levar a revolução até à sua conclusão". A base para esta posição é que "levar a revolução até à sua conclusão" representa a essência da doutrina marxista e é o tema fundamental que perpassa a história do movimento comunista internacional. Constitui, na conceção de Xi, uma reivindicação urgente do Partido Comunista da China (PCC) na sua busca ativa da Grande Luta.

 

Tal visão exige que nos envolvamos com as ricas e multifacetadas conotações da revolução e, de forma criativa, da revolução científica e tecnológica. Podemos ver isto em termos da "Tríplice Revolução". Em primeiro lugar, a revolução assume a forma de uma tomada de poder, no sentido de derrubar o antigo regime e de estabelecer e defender a nova autoridade dominante. Em segundo lugar, a revolução incorpora a reforma, no sentido do autoaperfeiçoamento e desenvolvimento do sistema socialista. Em terceiro lugar, a revolução é uma "revolução de transição", no sentido de uma transformação do estádio primário da sociedade socialista para o estádio subsequente e para a sociedade comunista. A Teoria da Tripla Revolução aqui proposta é uma categoria geral que envolve sucessão no tempo, ligação ascendente e descendente no espaço e, no campo da lógica, causa e efeito progressivos.

 

Completando a revolução

 

Desde que o socialismo com características chinesas entrou na Nova Era, tem sido comum os pensadores, tanto no país como no estrangeiro, menosprezarem ou mesmo rejeitarem erradamente o marxismo, o socialismo, o comunismo e a revolução, como associados aos comunistas tradicionais, alegando que estes conceitos equivalem a uma "teoria ultrapassada". Neste ponto, Xi, enquanto secretário-geral do PCC, enfatizou em diversas ocasiões que “devemos continuar a erguer a bandeira da revolução” na Nova Era e que precisamos de ser mais “abrangentes” na promoção da revolução (1). Mais significativamente, foi a 30 de dezembro de 2016, no seu discurso no Chá de Ano Novo do Comité Nacional da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, que Xi instou toda a sociedade a “avançar vigorosamente no espírito de levar a revolução até à sua conclusão” (2). Esta foi a primeira vez, desde a Reforma e Abertura, que um dos principais dirigentes do partido e do Estado revisitou o grande apelo do Camarada Mao para “levar a revolução até à sua conclusão”, um apelo feito há mais de meio século num discurso público oficial. Reconhecendo que a revolução ainda não tinha sido completamente bem-sucedida, o Camarada Xi exortou os seus ouvintes a demonstrarem determinação e força para a levarem em frente até à vitória total.

 

A 5 de janeiro de 2018, na cerimónia de abertura de um seminário motivacional do Décimo Nono Congresso Nacional do Partido Comunista da China, Xi destacou ainda mais a identidade e o papel social dos comunistas: "Somos revolucionários. Não nos deixem perder o espírito revolucionário" (3). Na véspera do septuagésimo aniversário da nova China, fez uma visita especial ao memorial revolucionário de Xiangshan, em Pequim, e reiterou: "Continuem e levem avante o espírito revolucionário da geração mais velha de revolucionários". Prosseguiu afirmando: "É melhor ser corajoso o suficiente para perseguir os agressores, não vender o próprio nome e aprender com o suserano" (4). Ao mesmo tempo, a palavra "revolução" figurou com grande frequência nas declarações públicas de Xi, aparecendo mais de mil vezes nos seus importantes discursos sobre governar o país na Nova Era. Frases em que estas referências à revolução aparecem incluem "ideal revolucionário", "cultura revolucionária", "estilo revolucionário", "sentimentos revolucionários", "luta revolucionária", "propósito revolucionário", "vontade revolucionária", "espírito de luta revolucionário", "disciplina revolucionária", "educação tradicional revolucionária", "autorrevolução", "soldados revolucionários na Nova Era", "nova revolução militar", "nova ronda de revolução científica e tecnológica", "nova ronda de revolução tecnológica", "nova ronda de revolução industrial" (e "nova revolução da indústria"), "revolução da produção de energia", "revolução do consumo", "revolução da oferta", "revolução tecnológica", "revolução do sistema", "revolução da casa de banho" e assim por diante. É claro que a simples invocação de um termo não constitui conhecimento verdadeiro, pelo que não podemos deixar de nos interrogar: para além das revoluções na ciência, na tecnologia, na indústria e nos assuntos militares, porque é que Xi enfatizou repetidamente o discurso da "revolução" e insistiu que fosse posto em prática? O que é que esta revolução deveria incluir? Tentaremos destrinçar isso a seguir.

 

I. A inevitabilidade e a racionalidade de "levar vigorosamente a revolução até à sua conclusão"

 

A. “Levar a revolução até à sua conclusão” não é apenas importante, mas também necessário. A base da sua inevitabilidade e racionalidade reside na natureza objetiva do desenvolvimento da lógica teórica, da lógica histórica e da lógica realista. Na perspetiva da lógica teórica, esta é a característica essencial da teoria marxista; na perspetiva da lógica histórica, este é todo o tema da história do movimento comunista internacional; e na perspetiva da lógica prática, este é o requisito urgente para que o PCC responda ativamente à Grande Luta.

 

B. “Levar a revolução até à sua conclusão” representa a essência da teoria marxista. Fundamentalmente oposto às ideologias burguesas do passado, com o seu conservadorismo, vulgaridade e rigidez, o marxismo é “a teoria da revolução em primeiro lugar” (5). Esta revolução está incorporada em todo o processo de estabelecimento, desenvolvimento e aplicação da teoria marxista. Por um lado, o surgimento do marxismo não foi, de forma alguma, o caso de uma teoria sectária que caiu do céu. O marxismo foi o produto inevitável da crítica científica ao modo de produção capitalista e de inovações revolucionárias anteriores nas ciências sociais humanas. Hoje, o mundo atravessa um vasto e interminável processo de desenvolvimento. Consequentemente, a revolução representada pela teoria marxista continuará. Os marxistas continuam a criticar o capitalismo contemporâneo e a envolver-se na luta revolucionária contra as ideias e teorias da burguesia ocidental, de modo a aproveitar todas as conquistas positivas e benéficas da civilização mundial e a permitir que a teoria marxista se desenvolva ainda mais. Na visão marxista, nada no mundo é eterno ou sagrado. Todas as coisas existentes evidenciam o movimento contraditório da unidade dos opostos. A revolução e a crítica constituem a força motriz inesgotável e a fonte interna do desenvolvimento da realidade, sendo também a raiz da eterna vitalidade e juventude da teoria marxista.

 

Visto de outra forma, o marxismo, ao criticar o velho mundo e descobrir o novo, exige a superação das condições anteriores para estabelecer novas condições na prática, revolucionando assim o mundo existente (6). Incorpora, portanto, o conhecimento teórico e prático de como “mudar o mundo” para realizar a libertação completa da humanidade. Durante a sua vida, Karl Marx, como principal fundador do marxismo, passou a ser estimado como pensador, político, filósofo e economista, e muito mais. Friedrich Engels, que partilhou com ele quarenta anos de amizade revolucionária, elogiou o seu antigo camarada, comentando a certa altura: “Marx é, antes de mais, um revolucionário” (7). Na reunião comemorativa que assinalou o bicentenário do nascimento de Marx, Xi salientou que Marx esteve sempre na vanguarda da luta revolucionária, desde a criação do Comité de Correspondência Comunista de Bruxelas até à sua participação na Liga dos Justos, ao redigir o Manifesto do Partido Comunista como o documento programático do comunismo científico; da participação direta nas revoluções europeias de 1848 e da fundação da Neue Rheinische Zeitung, à participação na primeira conferência internacional de fundação da I Internacional e à elaboração de documentos importantes desta, como a Declaração de Fundação e os Estatutos Provisórios. "Ser um revolucionário em primeiro lugar" aplica-se não só a Marx, mas também a Engels e a todos os líderes revolucionários proletários, incluindo Lie Ning, Mao e Deng Xiaoping (8). Em suma, uma vez que "o marxismo é essencialmente uma teoria e um programa revolucionários", abandonar esta "alma revolucionária" equivale a debilitar, sufocar e até mesmo desintegrar a teoria marxista na sua totalidade (9).

 

C. "Levar a revolução até à sua conclusão" é o tema central da história do movimento comunista internacional. A revolução é a locomotiva que impulsiona a história. Como movimento revolucionário mais profundo, abrangente e completo da história da humanidade, o movimento comunista internacional, que se propõe substituir o capitalismo e estabelecer o socialismo de forma a concretizar o comunismo, alterou o processo da história mundial de formas sem precedentes. Da Comuna de Paris em França à Revolução de Outubro na Rússia, da revolução da nova democracia na China ao crescente movimento proletário nos países capitalistas desenvolvidos e em desenvolvimento, desde a Segunda Guerra Mundial, esta série de vagas revolucionárias reconstruiu eficazmente a relação de forças entre o socialismo global e o capitalismo. No entanto, a situação revolucionária é complexa e mutável.

 

No testamento revolucionário que Engels escreveu antes da sua morte (a introdução a As Lutas de Classe em França, de Marx, também conhecido como o "último testamento" de Engels), previu que poderiam surgir diversas tendências oportunistas na II Internacional. Alertou repetidamente os camaradas revolucionários de vários países de que a Internacional, ao mesmo tempo que se adaptava às novas características da situação revolucionária em mutação, deveria também manter as suas posições fundamentais, ou seja, que nunca deveria desistir da sua busca do poder revolucionário: "O direito à revolução é, afinal, o único real 'direito histórico'" (10).

 

No entanto, Edouard Bernstein, o principal representante do revisionismo da II Internacional; Karl Kautsky, o mais importante teórico do Partido Social-Democrata Alemão; e, mais tarde, Mikhail Gorbachev, da extinta União Soviética, adulteraram, abandonaram e até traíram a série de princípios básicos e proposições políticas do marxismo que os concitavam a "levar a revolução até à sua conclusão". Como resultado, o movimento comunista internacional dividiu-se entre o socialismo científico e a social-democracia, e desencadeou mesmo a tragédia histórica da desagregação da União Soviética e as mudanças drásticas na Europa de Leste.

 

A experiência histórica e as suas lições demonstram plenamente que “levar a revolução até à sua conclusão” é o autêntico fio condutor que percorre os 170 anos de história do movimento comunista internacional. Rejeitar e despedir-se da revolução é pôr fim à história, e até ao futuro destino, do movimento comunista internacional. No mundo de hoje, “ainda estamos na era histórica especificada por Marx”, isto é, a “era da transição do capitalismo para o socialismo” (11). A era atual continua a ser dominada pelo novo imperialismo, mas é também a era em que a classe operária de todo o mundo irá realizar uma nova “Grande Revolução”. Enquanto esta grande era histórica não mudar fundamentalmente, o movimento comunista internacional deve aproveitar as oportunidades que se lhe apresentam e, mais uma vez, erguer a bandeira de "levar a revolução até à sua conclusão", para que possa esperar elevar gradualmente a causa socialista mundial do seu atual nível de depressão e avançar para um clímax no século XXI.

 

D. “Levar a revolução até à sua conclusão” é um requisito urgente para que o Partido Comunista da China responda ativamente à “Grande Luta”. Ao longo do século desde o seu nascimento, o PCC cresceu e expandiu-se no decurso das suas lutas. O mundo de hoje está a sofrer grandes mudanças, sem precedentes no século passado, e o desenvolvimento da China, sob a liderança do PCC, viveu o seu período histórico mais bem-sucedido nos tempos modernos. Alguns pensadores, no entanto, afirmam que o desenvolvimento se baseia na estabilidade, defendendo que a luta destrói a harmonia. Prosseguem defendendo a “Teoria da Extinção da Luta”. Esta visão sustenta que o desenvolvimento necessita de um ambiente estável e harmonioso. Na sua superficialidade, tal análise inverte a relação entre causa e efeito. Na sociedade de classes, é apenas através da luta que podemos alcançar a estabilidade e a harmonia. Uma procura unilateral de estabilidade e aparente harmonia levará a riscos e crises. Durante um longo período após o XVIII Congresso do Partido, “falámos apenas de harmonia, não de luta”.

 

Mas hoje, como Xi tem sublinhado repetidamente, estamos a “travar uma ‘Grande Luta’ com muitas novas características históricas” (12). Isto porque, à medida que prosseguimos a nossa viagem para concretizar o grande rejuvenescimento da nação chinesa, enfrentando um ambiente doméstico e internacional complexo, não só estamos a encontrar oportunidades históricas únicas, como também a confrontar desafios, riscos, resistências e contradições sem precedentes. Os comunistas devem envolver-se em “grandes lutas”, em vez de apenas alisarem as suas penas. Desde o XIX Congresso do Partido, Xi tornou ainda mais clara a universalidade da Grande Luta, salientando que estamos perante um grande número de vastas lutas. Estas incluem a construção da civilização económica, política, cultural, social e ecológica; o reforço do exército e da defesa nacional; o envolvimento no trabalho em torno das questões de Hong Kong, Macau e Taiwan; a prossecução do trabalho diplomático; e a continuação da construção do partido (13).

 

A Grande Luta, como a primeira das "quatro grandes" (as outras três são "Grandes Projetos", "Grandes Empreendimentos" e "Grandes Sonhos"), não se limita a um campo específico, mas atravessa toda a construção do socialismo com características chinesas. Vemos isso no esquema geral dos "Cinco em Um" e no esquema estratégico dos "Quatro Abrangentes" e das "Cinco Ideias de Desenvolvimento", envolvendo todos os campos da Nova Era. O espírito do trabalho desenvolvido em todas as frentes reside no reconhecimento de que o nosso trabalho prossegue através de um processo de luta e que devemos ser proativos e ousados na assunção de responsabilidades. Portanto, para conquistar novas vitórias na Grande Luta, durante a nova era, há uma necessidade urgente de levar avante o espírito revolucionário dessa luta.

 

No passado, o PCC conseguiu conquistar o poder estatal através do combate armado devido ao espírito revolucionário que impulsionou a Grande Luta e o movimento revolucionário. Hoje, o carácter histórico da era atual determina que a nova Grande Luta será árdua e de longo prazo, com fatores complexos sobrepostos uns aos outros. Para alcançar a vitória final desta Grande Luta, devemos acompanhar o ritmo dos tempos, manter a natureza revolucionária do PCC, levar avante o espírito revolucionário e perseguir a revolução até à sua conclusão. Pode-se perceber que o PCC não é apenas o partido no poder, mas também o partido da construção e o partido revolucionário. Se isto não for verdade, o partido perderá a sua posição dominante à medida que a sua natureza revolucionária se desvanece. Em tais circunstâncias, as conquistas da construção registadas na Grande Luta não só serão desfeitas, como o partido e o país perecerão e serão eliminados pela história. As lições do colapso dos partidos comunistas da ex-União Soviética e dos países socialistas da Europa de Leste devem ser aprendidas e consideradas.

 

Dado o significado de "revolução" ser tão grande, qual deverá ser o conteúdo da revolução a que se refere o apelo para "avançar vigorosamente o espírito de levar a revolução até à sua conclusão"? Atualmente, existem três principais elaborações teóricas apresentadas nos meios académicos. Uma é a Teoria das Três Revoluções, baseada na lógica vertical (Revolução da Nova Democracia, Revolução Socialista e Reforma e Abertura Socialistas). A segunda é a Teoria de Três Revoluções, construída em torno de uma lógica horizontal (revolução no campo económico, revolução no campo político e revolução no campo ideológico e cultural). A terceira é a posição da "Teoria das Duas Revoluções" (Revolução Social e Autorrevolução), desenvolvida a partir do ponto de vista da lógica subjetiva e objetiva. Cada uma destas três elaborações baseia-se na combinação da visão revolucionária "estreita" com a visão revolucionária ampla. Esta combinação de teorias é de grande valor e, em conjunto, elas resumem e refinam objetivamente a visão revolucionária marxista, a história do movimento comunista internacional e toda a história revolucionária desde a fundação do PCC. No entanto, os defeitos e as deficiências são também evidentes em cada uma destas perspetivas. A Teoria das Três Revoluções não reflete diretamente o princípio de rigor implícito na revolução, enquanto a Teoria de Três Revoluções e a Teoria das Duas Revoluções não refletem as características históricas faseadas da revolução. Neste sentido, devemos realizar uma análise científica mais aprofundada com base nestas três elaborações teóricas.

 

De um modo geral, a revolução envolvida em "avançar vigorosamente o espírito de levar a revolução até à sua conclusão" deve ter conotações ricas em múltiplos níveis e em várias dimensões. Para além da revolução científica e tecnológica e da revolução nos assuntos militares e na produtividade, a revolução manifesta-se principalmente através das suas três propriedades básicas. Em primeiro lugar, envolve uma "Conquista Revolucionária do Poder", no sentido de derrubar o antigo regime e estabelecer e defender a nova ordem; esta é a conotação original de revolução. Em segundo lugar, é uma "Revolução da Reforma" no sentido em que inclui a autorreforma e o aperfeiçoamento do sistema socialista; esta é a conotação alargada de revolução. Em terceiro lugar, trata-se de uma "Revolução de Transição", na medida em que envolve uma transformação do estádio primário do socialismo para o estádio subsequente e para a sociedade comunista, que é o propósito e o significado últimos da revolução. As triplas revoluções da Conquista Revolucionária do Poder, da Revolução da Reforma e da Revolução de Transição têm o significado, o conteúdo e a natureza de: economia, política, cultura (incluindo ideias e teoria, espírito e educação), sociedade (incluindo relações familiares e matrimoniais, atmosfera social e costumes) e as dimensões filosóficas mais amplas de sujeito e objeto. A Teoria da Tripla Revolução aqui apresentada é inter-relacionada e inclusiva, formando uma "trindade", um sistema orgânico com propriedades que abrangem o tempo sucessivo, a conectividade no espaço e a causalidade lógica, e que fornece o cenário para o avanço da sociedade chinesa na direcção do progresso e da civilização. De seguida, apresenta-se uma explicação específica, baseada nas teorias e realidades chinesas e estrangeiras contemporâneas.

 

II. A "revolução" requer uma conquista revolucionária do poder no sentido de derrubar o antigo regime e estabelecer e defender a nova ordem

 

A. A primeira ação necessária para levar a revolução até à sua conclusão é “o derrube do poder existente e a dissolução das antigas relações” (14). O objetivo principal e a questão central é tomar e consolidar o poder político; caso contrário, o socialismo não poderá ser estabelecido. No que diz respeito à China, a fundação da República Popular da China (RPC) marcou uma vitória crucial para o nosso partido na Conquista Revolucionária Do Poder. No entanto, o fracasso da Comuna de Paris e a restauração do sistema capitalista na União Soviética são motivo para sérias reflexões. Mesmo que o PCC tenha tomado o poder, durante muito tempo continuará a enfrentar os problemas de garantir a segurança do sistema e a segurança ideológica, com a possibilidade de as forças burguesas retomarem o poder. Por conseguinte, a Conquista Revolucionária do Poder permanece um assunto inacabado: “Em certo sentido, uma restauração temporária é também um fenómeno regular e difícil de evitar completamente” (15). De uma perspetiva doméstica, “a classe exploradora como classe foi eliminada, mas a luta de classes existirá durante muito tempo dentro de um certo limite” (16).

 

Em termos de fatores internacionais, as forças ocidentais hostis estão a intensificar a sua luta de classes nos campos político e militar, procurando utilizar os métodos da “revolução colorida” para ocidentalizar e dividir a China. Os Estados Unidos da América e os seus aliados consideram a China o seu principal concorrente ou “inimigo principal” e, sob a bandeira do chamado reequilíbrio de poder na Ásia-Pacífico, propuseram-se restringir completamente o desenvolvimento pacífico da China na ciência, tecnologia e outros campos. Em suma, o sistema socialista, após a tomada do poder, depara-se invariavelmente com contradições e conflitos entre subversão e antissubversão, evolução e anti-evolução, e, sob certas condições, as lutas correspondentes podem mesmo intensificar-se. Para defender os frutos da vitória revolucionária, precisamos de consolidar ainda mais a nova ordem política através da construção socialista económica, política, cultural, social e da defesa nacional. Em conjunto, estes aspetos constituem o conteúdo vital do poder estadual, uma vez alcançada a Conquista Revolucionária do Poder.

 

Globalmente, para além dos países socialistas do mundo — o "um grande e os quatro pequenos" (China, Coreia do Norte, Cuba, Vietname e Laos) — os partidos comunistas da maioria dos países continuam os seus esforços incessantes para derrubar a velha ordem e estabelecer o novo poder político. No entanto, o poder do socialismo mundial é ainda fraco em comparação com o capitalismo, e em todo o mundo o socialismo continua na defensiva. A tarefa global representada pela Conquista Revolucionária do Poder enfrenta ainda enormes obstáculos. No meio da crescente globalização, o objetivo estratégico de tomar e depois defender o poder estatal exige que os partidos comunistas da maioria dos países empreguem estratégias revolucionárias corretas e demonstrem um elevado grau de flexibilidade para responder a situações que mudam rapidamente. Só desta forma a classe operária e os trabalhadores do mundo poderão garantir a verdadeira vitória da Conquista Revolucionária do Poder.

 

B. O caminho revolucionário exige o uso flexível da “Tomada Violenta do Poder” e da “Tomada Pacífica do Poder”. Na prática, os países socialistas que garantiram a vitória inicial na Conquista Revolucionária do Poder passaram, basicamente, a controlar o poder político através da revolução violenta. Uma certa corrente da opinião pública considera, portanto, a revolução violenta em termos absolutos como o único meio pelo qual o poder político pode ser tomado, equiparando a Conquista Revolucionária do Poder à revolução violenta. Marx, com efeito, afirmou que os objetivos dos comunistas “só podem ser alcançados pela derrubada violenta de todas as condições sociais existentes” (17). Mas, enquanto Marx e Engels defendiam que “o proletariado não pode tomar o poder político... sem uma revolução violenta”, Marx também observou que “onde a propaganda pacífica e o incentivo podem atingir este objetivo de forma mais rápida e fiável, realizar uma revolta é uma loucura” (18). Engels, no seu prefácio à versão inglesa do primeiro volume de O Capital, em 1886, escreveu sobre Marx:

 

“Deve ouvir-se a voz de um homem cuja teoria é o resultado de um estudo de uma vida inteira sobre a história económica e a situação da Inglaterra, e a quem este estudo levou à conclusão de que, pelo menos na Europa, a Inglaterra é o único país onde a inevitável revolução social pode ser efetuada inteiramente por meios pacíficos e legais. Certamente nunca se esqueceu de acrescentar que dificilmente esperava que as classes dominantes inglesas se submetessem, sem uma "rebelião pró-escravatura", a esta revolução pacífica e legalista” (19).

 

Além disso, Engels advertiu na sua carta a Richard Fisher, a 8 de março de 1895: "A minha opinião é que não tem nada a ganhar ao defender a completa abstenção do uso da força" (20). Percebe-se que os conceitos de "Tomada Violenta do Poder" e "Tomada Pacífica do Poder" devem ser utilizados com flexibilidade. Nos últimos vinte anos, o PCC forneceu um modelo da utilização flexível destes dois métodos para garantir a vitória na Conquista Revolucionária do Poder.

 

C. Os resultados revolucionários exigem o uso flexível da "luta aberta" e da "luta encoberta". A grande maioria dos partidos comunistas do mundo está hoje legalmente estabelecida como partidos de oposição aos partidos burgueses dominantes dos países em causa. Com o advento da globalização e da sociedade da informação e das redes, a densidade das comunicações humanas aumentou milhares de vezes. Se o regime burguês monopolista não se envolver em políticas totalitárias e na repressão violenta, e se as estratégias dos partidos políticos da classe trabalhadora estiverem corretas, estes partidos poderão expandir os seus membros e influência de forma mais rápida e ampla. Mas, na verdade, sempre houve necessidade de duas frentes na luta. Como escreveu Mao, "além do trabalho aberto, deve haver também trabalho secreto para o apoiar" (21). Especialmente quando os Estados capitalistas estão ansiosos por destruir a organização do Partido Comunista, o trabalho secreto pode permitir aos comunistas preservar e acumular eficazmente a sua força enquanto aguardam a oportunidade de tomar o poder.

 

Os comunistas podem, por exemplo, estabelecer e expandir ativamente empresas com fins lucrativos de várias formas, abertas ou ocultas, de modo a fornecer uma base económica fiável para o desenvolvimento do movimento revolucionário proletário. Como os comunistas na sociedade ocidental são estigmatizados e marginalizados, até mesmo vilipendiados e demonizados, podem decidir fundar um partido político que não ostente o nome de "Partido Comunista", mas que o seja na sua essência. Por meio de formas externas dissimuladas, podem alcançar o objetivo da Conquista Revolucionária do Poder a curto prazo. Isto assemelha-se ao modelo dos partidos políticos da classe trabalhadora, como o Partido Republicano do Trabalho e da Justiça, que tem uma ampla influência na Bielorrússia. De forma aberta ou velada, os comunistas, através da criação de editoras, estações de televisão, fóruns, jornais, sítios na internet e outros meios de comunicação, ou através de organizações e canais como sociedades, fundações, escolas, bibliotecas e associações juvenis, cooperam para fortalecer a face pública do marxismo e do socialismo científico e para promover vigorosamente a posição ideológica do Partido Comunista.

 

D. Um princípio revolucionário é o uso flexível da "Independência" e da "União Internacional". O espírito burguês transnacional que rege a lógica do capital privado garantiu que a Conquista Revolucionária do Poder pelo proletariado nunca tenha sido um movimento nacional estrito, mas uma causa internacional inspirada pelo lema "Proletários de Todos os Países, Uni-vos!". Desde 1864, as sucessivas organizações internacionais têm desempenhado um papel inestimável e progressista no reforço da união das forças socialistas mundiais. Embora tenham existido problemas, estes tiveram que ver apenas com formas específicas de união. O princípio básico e o espírito da união internacional do proletariado não podem ser negados. Esta união não tem apenas valor histórico, mas também valor para a Nova Era (22). A unilateralidade de tentar negar completamente qualquer forma de União Internacional e de enfatizar a demonstração bem-sucedida isoladamente reside na separação entre "Independência" e "União Internacional". A realidade é que "a autonomia e a independência estão incluídas no próprio conceito de internacionalismo"; as duas estão unificadas. Mesmo a Constituição adotada pela China em 2017 sublinha que o Estado deve realizar a educação internacionalista entre o povo (23). Consequentemente, não devemos desistir do espírito internacionalista proletário, nem em palavras nem em ações.

 

Algum tipo de União Internacional é indispensável, como Marx nos recordou: “A experiência passada provou que ignorar a unidade fraterna que deve existir entre os trabalhadores de todos os países... irá puni-los — fará com que os seus esforços dispersos sofram um fracasso comum” (24). Apesar das circunstâncias adversas, algum grau de União Internacional é possível, dado que, no mundo de hoje, os partidos comunistas de todos os países exploraram um caminho revolucionário, tendo em conta as suas próprias características. Consequentemente, a “Independência” foi significativamente melhorada. Isto lançou as bases organizacionais para a continuação da União Internacional e criou as condições ideológicas para o seu florescimento. Considerando a tendência geral, “o futuro do socialismo mundial depende da ação conjunta efetiva do proletariado internacional” (25). Os partidos comunistas da maioria dos países alcançaram novas formas de unidade internacional e esperam mais no futuro (26).

 

III. Revolução é uma "revolução reformadora" no sentido do autoaperfeiçoamento e desenvolvimento do sistema socialista

 

A. Marx salientou que "o socialismo é a declaração da permanência da revolução" (27). Podemos falar de Revolução Reformadora no sentido de autoaperfeiçoamento e desenvolvimento contínuos das relações produtivas socialistas e da superestrutura. Porque precisamos de realizar uma Revolução Reformadora? Na visão de Marx, uma sociedade socialista que acaba de emergir do capitalismo transporta inevitavelmente uma grande variedade de traços e resquícios da velha sociedade em muitos dos seus aspetos. É necessário eliminar as restrições e os obstáculos através dos quais os sistemas e mecanismos existentes nos campos das relações produtivas e da superestrutura impedem o desenvolvimento das forças produtivas, a fim de gradualmente alcançar a integridade, transformar a situação geral e administrar um "Salto Revolucionário" sistemático. Na prática, o socialismo não surgiu diretamente nos países capitalistas desenvolvidos, mas sim numa série de países em desenvolvimento onde os níveis de produtividade têm sido relativamente baixos.

 

Atuando num cenário onde a economia mercantil não está totalmente desenvolvida, os países socialistas devem procurar eliminar os vestígios e o legado da antiga sociedade feudal e, ao mesmo tempo que desenvolvem a economia de mercado, ultrapassar os vestígios e o legado da antiga sociedade capitalista. Nesta base, podemos demonstrar as nossas fortes vantagens institucionais sobre o capitalismo e até derrotar o sistema capitalista à escala global. Nos países socialistas, múltiplos fardos e problemas confrontam a Revolução da Reforma, que está a demorar mais tempo do que muitos esperavam e cujos objetivos e tarefas são desafiantes e árduos. A Revolução da Reforma na China começou na década de 1950, um período que testemunhou uma série de conquistas importantes, mas também alguns erros. A Reforma e Abertura, iniciada no final da década de 1970, foi, nas palavras de Xi, "a nova grande revolução liderada pelo partido sob as novas condições históricas" (28). Como afirmou Deng, "a Reforma é a segunda revolução da China" (29).

 

Na Nova Era, a Revolução da Reforma, com o seu esquema geral "Cinco em Um", o seu plano estratégico "Quatro Abrangentes" e as suas principais ideias: os "Cinco Conceitos de Desenvolvimento", as "Quatro Grandezas" e a "Governação Nacional", passou a ser aplicada às principais áreas envolvidas no aprofundamento abrangente da reforma. A Revolução da Reforma não é apenas abrangente e profunda, mas também possui características e objetivos claros, enfrenta as dificuldades e fornece orientações claras.

 

B. O objetivo da Revolução da Reforma é a Governação Nacional. A abrangência e profundidade da Revolução da Reforma reside no seu plano geral de “primeiramente modernizar o sistema de governação e a capacidade de governação da China”, com foco em “melhorar e desenvolver o sistema socialista com características chinesas” (30). Este plano diretor inclui seis objetivos específicos de reforma, destinados a aprofundar o sistema de civilização económica, política, cultural, social e ecológica e o sistema de construção do partido. Ao mesmo tempo, o plano destaca as treze vantagens significativas do sistema nacional e do sistema de governação da China. Para garantir o progresso ordenado da Revolução da Reforma, assegurar que esta tem regras a seguir e consolidar e desenvolver prontamente as suas conquistas, o Comité Central do Partido agiu em tempo útil para apresentar as orientações correspondentes para a “promoção abrangente do Estado de Direito”, que equivalem a uma nova extensão da Revolução da Reforma. Como "uma ampla e profunda revolução no domínio da Governação Nacional", estas orientações para "governar o país de forma abrangente, de acordo com a lei" promovem ainda mais a legalização, a institucionalização, a normalização e os procedimentos operacionais da Revolução da Reforma (31).

 

Uma certa corrente da opinião pública defende que a modernização do sistema de Governação Nacional da China e da capacidade de governação visa acompanhar os países capitalistas ocidentais representados pelos Estados Unidos da América, e afirma que a governação dos países ocidentais está completamente madura. Este é o primeiro de muitos erros graves, com graves falácias contidas nesta posição. Os Estados Unidos da América atribuem papéis fundamentais ao seu sistema de governação nacional de "separação de poderes" e ao sistema bipartidário, no qual duas fações políticas burguesas monopolizam a ocupação de cargos. Sob o sistema bipartidário, os dois principais grupos burgueses coludem para impedir o aparecimento de um terceiro partido rival e, em particular, para bloquear o desenvolvimento do Partido Comunista. Mesmo os partidos social-democratas, que não desafiam a ordem burguesa, estão impedidos de se afirmar. O resultado é que o governo federal, há muitos anos, enfrenta problemas financeiros e, recentemente, falhou desastrosamente no combate à pandemia da COVID-19. A eficiência administrativa do governo é baixa e os problemas sociais permanecem por resolver, devido às constantes disputas e discussões. O engano e a fraude são a norma na política e nos meios de comunicação social, enquanto o governo lança frequentes provocações militares, ameaças e atos de agressão contra países estrangeiros. Só se reconhecermos verdadeiramente as doenças crónicas inerentes à governação dos países capitalistas, seja sob o modelo norte-americano, norte-europeu ou indiano, poderemos promover cientificamente a modernização dos sistemas de governação nacionais. Só com a premissa de melhorar e desenvolver o sistema socialista com características chinesas poderemos criar capacidades de governação mais civilizadas e avançadas do que as do Ocidente.

 

C. O desafio que se coloca à Revolução da Reforma é a reforma económica. Ao contrário da Conquista Revolucionária do Poder, a Revolução da Reforma centra-se consistentemente na reforma do sistema económico, utilizando-a como mecanismo para impulsionar a promoção coordenada de reformas noutras áreas. Desta forma, elimina os obstáculos e remove os empecilhos à libertação e ao desenvolvimento das forças produtivas, tornando-se, assim, a chave para o sucesso da economia chinesa desde a Reforma e Abertura. Ao longo de mais de quarenta anos da Revolução da Reforma, o sistema económico básico da China, durante a fase primária do socialismo, foi melhorado de forma constante, a combinação orgânica entre o socialismo e a economia de mercado tornou-se mais apertada, a ideia de desenvolvimento centrado nas pessoas enraizou-se profundamente no coração da população e os cinco novos conceitos de desenvolvimento: inovação, coordenação, sustentabilidade, abertura e partilha alcançaram resultados rápidos. O objetivo de construir uma sociedade próspera em todos os aspetos está perto de ser alcançado. O novo normal económico, que enfatiza o desenvolvimento de alta qualidade em vez do desenvolvimento de alta velocidade, alcançou resultados notáveis. Na nova situação, porém, os Estados Unidos da América consideram a China como o seu "principal concorrente" e, utilizando uma grande variedade de métodos, tentam excluí-la das trocas em áreas económicas e outras, procurando "divorciar" a China da economia mundial dominada pelos E.U.A..

 

Na Nova Era, é necessária mais Reforma e Abertura, o mais rapidamente possível, para implementar um novo padrão de desenvolvimento em que o ciclo doméstico constitua o corpo principal e os ciclos doméstico e internacional se promovam mutuamente. Ao mesmo tempo, “a propriedade pública como corpo principal, o sistema económico fundamental dominado pela economia estatal e o desenvolvimento comum de várias formas de propriedade” devem ser salvaguardados (32). Muitas dificuldades permanecem, e ainda há um longo caminho a percorrer antes de consolidarmos verdadeiramente «o sistema básico de distribuição caracterizado pela distribuição de acordo com o trabalho como elemento principal e pela coexistência de múltiplos modos de distribuição», e até reduzirmos a disparidade de rendimentos, alcançarmos a prosperidade e a felicidade comuns, resolvermos as novas contradições sociais principais e construirmos uma potência socialista.

 

Na opinião pública, existe uma tendência que considera o objetivo e o impulso fundamental da reforma do sistema económico de mercado socialista como sendo o de acompanhar o sistema económico de mercado capitalista ocidental representado pelos Estados Unidos da América. Os adeptos desta tendência caracterizam também o sistema económico dos países ocidentais como plenamente maduro. Este é o segundo erro grave. Na realidade, a economia de mercado capitalista dos Estados Unidos da América é de natureza oligopolística e centrada em estruturas monopolistas. Isto leva a crises económicas, financeiras e fiscais frequentes que colocam em risco as economias de outros países e toda a economia mundial. Isto provocou uma polarização da riqueza e do rendimento, resultando num antagonismo agudo entre o 1% super-rico da população e os trabalhadores que constituem a maior parte dos restantes 99%. Além disso, a economia de mercado capitalista dos Estados Unidos da América fortaleceu a hegemonia monopolista do dólar norte-americano e impôs a observância dos direitos de propriedade intelectual, saqueando outros países. Lançou frequentemente guerras comerciais hegemónicas, guerras científicas e tecnológicas e guerras por recursos, que forneceram a base económica para o novo imperialismo e militarismo dos E.U.A.. Só reconhecendo verdadeiramente as doenças crónicas que o sistema económico de mercado de países capitalistas como os Estados Unidos da América, a Índia e os países do norte da Europa não consegue ultrapassar é que seremos capazes de melhorar e desenvolver o sistema económico de mercado socialista da China. Só desta forma podemos promover cientificamente o sistema económico de mercado centrado nas pessoas e um sistema aberto de igualdade e benefício mútuo.

 

D. A Revolução da Reforma é caracterizada pela Autorrevolução. Xi Jinping salientou que, para triunfar na nova ronda de reformas, será necessário "roer ossos duros, travar mais batalhas e ganhar mais queijo", afirmando ainda: "Para aprofundar a reforma de forma abrangente, devemos primeiro olhar para dentro e ousar fazer a autorrevolução" (33). Após mais de quarenta anos de Revolução da Reforma, emergiu também um acréscimo de interesses, formados e acumulados ao longo de um período prolongado. Os reformadores socialistas, como verdadeiros "revolucionários", devem, por isso, ter a coragem e a ousadia de praticar a "autorrevolução". Para evitar que se transformem, consciente ou inconscientemente, em beneficiários de interesses estabelecidos ou agentes dos interesses ocidentais, precisam de ousar subordinar os seus próprios interesses aos interesses gerais da classe operária e das amplas massas populares. Enquanto isso, a reforma, como uma revolução profunda que desafia interesses obscuros, precisa de ousar assumir responsabilidades e avançar bravamente perante possíveis riscos, perigos e custos. Na prática de governar o país, as manifestações concentradas da "autorrevolução" dos reformadores incluem "promover vigorosamente o espírito de levar a revolução por diante até à sua conclusão"; governar de forma estrita e abrangente o partido, o país e o exército; e procurar a reforma das instituições e dos estilos de trabalho do Partido e do Estado. Como afirmou Xi, “a coragem de procurar a autorrevolução e de gerir rigorosamente o Partido é a marca mais distintiva do carácter do nosso Partido” (34). Devemos “usar a própria revolução governamental para impulsionar a reforma em áreas importantes” (35).

 

Existem também correntes na opinião pública que consideram o sistema de administração da educação de estilo ideológico nos países ocidentais totalmente maduro e que o objetivo da educação, ideologia, organização e estilo dos quadros do partido e do governo na China é emular o sistema capitalista ocidental de educação de funcionários públicos praticado nos Estados Unidos da América. Este é o terceiro erro grave. O sistema burguês a que os funcionários norte-americanos estão sujeitos ignora sistematicamente a educação ideológica para fins sociais e a autorrevolução. Os resultados, entre os colaboradores de todos os níveis, incluem a popularidade dos conceitos de “Individualismo em Primeiro Lugar” e “Eleição [Vitória] em Primeiro Lugar”. Os interesses mesquinhos do partido, da região e da unidade passaram a ser aceites como os critérios que regem as palavras e as ações, independentemente dos interesses fundamentais dos trabalhadores. Isto levou à prevalência de um estilo burocrático, à generalização da busca por bons rendimentos e à corrupção descarada. Só reconhecendo verdadeiramente as doenças crónicas que não podem ser ultrapassadas pelo sistema capitalista de educação ideológica e de administração oficial, seja nas suas variedades norte-americana, norte-europeia ou indiana, poderemos melhorar o sistema de formação de quadros na China; incutir a estes uma ideologia, uma organização e um estilo corretos; e zelar pela sua reputação pública. Só desta forma, na China, poderemos capacitar os quadros do partido e do governo para promover a reforma abrangente de diversos empreendimentos através de uma autorrevolução contínua.

 

E. O precursor da Revolução da Reforma é a construção teórica. A revolução epistemológica das ideias é sempre o precursor de grandes ações revolucionárias. Devemos ser teóricos.

 

Precisamos de traçar uma linha clara entre o certo e o errado e reunir o maior consenso possível, se quisermos continuar a compreender corretamente e a promover de forma abrangente a Revolução da Reforma. Por exemplo, na nossa interpretação da natureza fundamental da Revolução da Reforma, devemos opor-nos à visão de que a Reforma e a Abertura são compatíveis com o sistema ocidental e aderir à unidade entre o "Caminho Socialista" e o da Reforma e Abertura. Qual é a natureza e o impulso geral da Revolução da Reforma? Esta é uma questão fundamental relacionada com o futuro destino da reforma e do desenvolvimento da China na nova era. Como Xi salientou, “a China é uma grande potência e não deve haver erros subversivos em questões fundamentais. Uma vez que algo surge, não pode ser retirado ou revisto” (36). Imaginemos que a Revolução da Reforma não distinguia entre o caminho e o sistema socialistas e o caminho e o sistema capitalistas, que alterava arbitrariamente coisas que não podem nem devem ser alteradas e que chegava ao ponto de desenvolver a propriedade privada capitalista indefinidamente para o chamado desenvolvimento das forças produtivas. Gradualmente, ao longo do tempo, isto levaria inevitavelmente a uma transformação fundamental de toda a superestrutura socialista, dificultando assim a melhoria sólida e rápida da produtividade e do sustento da população. As reformas de Gorbachev-Yeltsin na União Soviética, em grande parte sincronizadas com a Revolução da Reforma na China, equivaleram, no fundo, a uma “mudança de direção” que negava o socialismo, e o seu fracasso era bastante evidente. Neste sentido, Xi advertiu de forma dialética: “Não façam da Reforma e da Abertura um beco sem saída; negar a direção socialista da Reforma e da Abertura é também um beco sem saída” (37).

 

Uma certa corrente na opinião pública sustenta que, embora os efeitos da reforma na China, nesta fase, tenham sido melhores do que os da Rússia, os efeitos finais na Rússia superarão os da China, porque a Rússia estabeleceu um sistema económico e político capitalista de estilo ocidental. Este é o quarto erro grave. De facto, após o golpe contra a União Soviética socialista por parte das forças anticomunistas e antissocialistas, as contradições nacionais vieram ao de cima, e o poder socialista soviético, que estava em pé de igualdade com os Estados Unidos da América imperialistas, foi dividido em mais de uma dezena de países fracos. A Rússia tornou-se um país de terceira categoria economicamente, dependente principalmente da venda de recursos e armamento para manter a sua economia nacional e o sustento do seu povo. Os antigos países socialistas da Europa de Leste transformaram-se dramaticamente em Estados capitalistas, e alguns deles auxiliaram a NATO liderada pelos E.U.A. nos seus esforços para cercar a Rússia, através da expansão militar para leste e de sanções económicas. Só se reconhecermos os factos objetivos e a lição teórica – de que os países socialistas da ex-União Soviética e da Europa de Leste não fortaleceram os seus países nem enriqueceram os seus povos através da "mudança" representada pela privatização económica e pela ocidentalização política – poderemos eliminar a forte influência de um liberalismo e de uma social-democracia renovados. Só se consolidarmos firmemente a confiança das pessoas no caminho, na teoria, no sistema e na cultura do socialismo com características chinesas, poderemos compreender cientificamente o impulso correto da Revolução da Reforma, as suas políticas e medidas.

 

IV. A revolução é uma revolução de transição no sentido de uma transformação da etapa primária da sociedade socialista para a etapa subsequente e para a sociedade comunista

 

A. A Revolução da Reforma que estamos a implementar é um empreendimento a longo prazo, como Xi Jinping salientou: “A Reforma e a Abertura não estão concluídas neste momento” (38). Neste sentido, pode haver mal-entendidos e interpretações erradas de que o estádio primário do socialismo, tal como se verificou na Revolução da Reforma, é um estado eterno e equivalente a toda a sociedade socialista. De acordo com esta visão, a Revolução da Reforma defende a imortalização do sistema económico de mercado, da economia não pública e da distribuição em função do capital, ou seja, a equação errónea: “socialismo = justiça social + economia de mercado” (39). De facto, o uso do tempo presente aqui sugere que a Revolução da Reforma atravessa todo o estádio primário do socialismo. Mas, embora este processo histórico seja prolongado, não é de forma alguma o nosso objetivo final, dado que a sociedade socialista não é uma forma solidificada, uma espécie de cristal estático, mas um organismo dinâmico em constante mudança e movimento.

 

No futuro, faremos a transição para uma forma social nova e um mais elevado estádio de desenvolvimento. Trata-se da Revolução de Transição, no sentido em que envolve uma transformação da sociedade socialista do seu estádio primário para o posterior, e daí para a sociedade comunista. Este é o significado último da revolução, e também o significado da "promoção completa do espírito de levar a revolução até à sua conclusão" por Xi. Xi enfatizou muitas vezes: "O ideal revolucionário é mais alto que o céu. A realização do comunismo é o ideal mais elevado dos nossos comunistas" (40). Este ideal supremo é "um processo histórico de alcançamento gradual de objetivos por fases" (41).

 

A uma certa altura, dividimos toda a sociedade socialista em "estádio primário, estádio intermédio e estádio avançado", "tomando a mudança das forças produtivas como o símbolo indireto ou final e a mudança das relações de produção como o símbolo direto" (42). Cada estádio apresenta a lógica inevitável do desenvolvimento do mais baixo para o mais elevado, a todos os níveis, como, por exemplo, no sistema de direitos de propriedade, no sistema de distribuição e no sistema de regulação. Os teóricos marxistas da geração anterior escreveram muitos artigos para apoiar e defender a "Teoria dos Três Estágios do Socialismo". Por exemplo, Liu Guoguang, antigo vice-presidente da Academia Chinesa de Ciências Sociais, salientou: “Devemos compreender que a fase primária é de longo prazo, mas não infinita. Progredir da fase inicial para a fase intermédia levará mais de 100 anos. Agora que a fase intermédia se aproxima, devemos fazer planos com antecedência. No futuro, entraremos no comunismo a partir da fase avançada” (43). Wei Xinghua, da Universidade Renmin da China, e Wu Xuangong, ambos antigos secretários do partido na Universidade de Xiamen, também expressaram opiniões semelhantes sobre a fase primária, a fase intermédia e a fase avançada do socialismo (44).

 

Em termos gerais, a Revolução de Transição tem muitos aspetos singulares nas áreas da produtividade e das relações de produção, do fundamento e da superestrutura económica, e da existência e consciência social. O seu papel geral é o de realizar a libertação genuína e completa das pessoas e, ao longo do tempo, alcançar “o desenvolvimento pleno e livre de cada indivíduo” (45). Como dizia Marx, nestas condições “o desenvolvimento real das capacidades do indivíduo está sob o controlo dos próprios indivíduos, como desejam os comunistas” (46). Embora a Revolução de Transição seja um processo longo e tortuoso, as principais características da sua transição final para a sociedade comunista são claras.

 

B. As características de produtividade da Revolução de Transição implicam a negação das três restrições à divisão do trabalho e o desenvolvimento das "três grandes riquezas". Um elevado nível de desenvolvimento das forças produtivas é a premissa prática absolutamente necessária para a concretização da Revolução de Transição. Para Marx, a produtividade está relacionada com a divisão do trabalho. Portanto, ao libertar e desenvolver constantemente as forças produtivas e ao promover o desenvolvimento acelerado das "forças naturais, da força de trabalho e da força científica e tecnológica" dentro das forças produtivas reais, a "antiga divisão do trabalho", limitada pelas três restrições das "diferenças urbano-rurais, das diferenças indústria-agricultura e das diferenças cérebro-corpo", desaparecerá completamente, e o "desenvolvimento da produção das três grandes riquezas" será realizado (47).

 

Em primeiro lugar, haverá o desenvolvimento das riquezas naturais, a par da melhoria das condições de trabalho. Na Revolução de Transição, com a socialização sem precedentes da produção, “os produtores unidos ajustarão a relação entre o desenvolvimento económico e a natureza de acordo com a razão”, colocarão a natureza sob o seu controlo comum e farão um uso pleno e racional da riqueza natural na maior extensão possível, exercendo o mínimo de força (48). Em segundo lugar, estará o desenvolvimento da riqueza em trabalho ou da riqueza social sob a forma de trabalho vivo. Na Revolução de Transição, com a intelectualização da produção e a redução do horário de trabalho, o trabalho alienado, fixo e forçado, será eventualmente substituído pelo desenvolvimento voluntário e integral do trabalho livre associado. Desta forma, o trabalho deixará de ser um meio de subsistência e passará a ser a “primeira necessidade da vida”, e a capacidade das pessoas para realizar trabalho será desenvolvida criativamente ao máximo. Em terceiro lugar, estará o desenvolvimento da riqueza do trabalho em resultado do trabalho público. Na Revolução de Transição, com o pleno aproveitamento do potencial de trabalho de todos, a cooperação e a unidade das forças produtivas individuais promovem a força produtiva da sociedade e o aumento da riqueza social (49).

 

C. As características das relações de produção da Revolução de Transição: A "Eliminação dos Três Privilégios Económicos" e o "Estabelecimento das Três Justiças Económicas". Para realizar a Revolução de Transição, necessitamos não só de forças produtivas altamente desenvolvidas como base material direta, mas também da adaptação das relações produtivas como base económica indireta. Na teoria marxista, uma vez transferidos todos os meios de trabalho para os trabalhadores, a base material da opressão de classe terá sido eliminada. Portanto, as características das relações económicas na Revolução de Transição são que estas relações procedem da Eliminação dos Três Privilégios Económicos Principais e do estabelecimento das Três Justiças Económicas Principais. Em primeiro lugar, no sistema de direitos de propriedade, o privilégio da propriedade privada dos meios de produção será eliminado e a justiça económica da propriedade pública por toda a sociedade será estabelecida. A propriedade privada capitalista é a fonte geral de todas as crises e turbulências na sociedade moderna e, por isso, é necessário eliminá-la (50). O objetivo da expropriação dos expropriadores é estabelecer a propriedade pública coletiva por toda a sociedade e “transferir os meios de produção para os produtores como sua posse comum(51).

 

Em segundo lugar, no sistema de distribuição, é necessário eliminar o privilégio da distribuição de acordo com o capital e estabelecer a equidade económica da distribuição de acordo com a procura de toda a sociedade; a eliminação da propriedade privada equivale à eliminação do modo de distribuição de acordo com o capital. No estádio inferior da sociedade comunista, a distribuição será de acordo com o trabalho, enquanto no estádio superior, a distribuição será de acordo com as capacidades e necessidades dos indivíduos (52).

 

Em terceiro lugar, e no âmbito do sistema de regulação, a economia de mercado será eliminada e a justiça económica será estabelecida com base num sistema planeado que abrangerá toda a sociedade (53). A economia de mercado não pode resolver fundamentalmente a anarquia da produção resultante das contradições básicas do capitalismo. Só eliminando definitivamente a regulação do mercado e estabelecendo um mecanismo de regulação planificada que inclua toda a sociedade poderemos evitar as crises económicas e a grande variedade de desproporções e desequilíbrios causados pelo modo de produção capitalista. Por conseguinte, a "anarquia social da produção" geral que agora prevalece será substituída por "uma regulação social da produção... de acordo com as necessidades da comunidade e de cada indivíduo" (54).

 

D. As características políticas da Revolução de Transição: O "Declínio dos Três Sujeitos Políticos" e a "Realização das Três Formas Políticas". No decurso da Revolução de Transição, as forças produtivas altamente desenvolvidas eliminam gradualmente o sistema de propriedade e exploração privadas, e a base para as diferenças de classe desaparece. Desta forma, o Estado e os partidos políticos, que servem de instrumentos de dominação de classe, também desaparecem. Em consequência, o desaparecimento dos Três Sujeitos Políticos da classe, Estado e partido político, não significa que a sociedade deixe de necessitar de uma superestrutura política de gestão pública, mas que a Realização das Três Formas Políticas é necessária para gerir a sociedade. Primeiro, para que a forma pública de desenvolvimento político se concretize, as funções públicas do Estado “perderão o seu carácter político e transformar-se-ão em simples funções administrativas de zelar pelos verdadeiros interesses da sociedade” (55). A sociedade necessitará ainda de várias organizações autoritárias para gerir os assuntos públicos do povo, mas estas organizações perderão gradualmente a sua natureza de classe e demonstrarão plenamente o seu carácter público. A partir desse ponto, o poder do Estado será transferido para a sociedade e assumirá a forma principalmente de “administração das coisas” (56). Em segundo lugar, a forma independente de desenvolvimento político – a transformação da democracia na forma do Estado em democracia na vida social – será concretizada. O futuro governo do proletariado será um novo tipo de governo democrático. Quando todos os membros da sociedade puderem participar e aprender a gerir a vida social de forma independente, “as pessoas estarão habituadas a cumprir as regras mínimas da vida pública sem violência ou obediência” (57). Consequentemente, “o homem, finalmente senhor da sua própria forma de organização social, torna-se ao mesmo tempo senhor da Natureza e seu próprio senhor — livre” (58). Em terceiro lugar, está a forma conjunta de realização do desenvolvimento político, a União dos Cidadãos Livres (59). É impossível à sociedade futura abolir imediatamente o Estado. Deve passar pela etapa da República Social, uma “forma de transição do Estado para o não-Estado”, tendo como exemplo típico a Comuna de Paris (60). Então, nesta base, alcançar-se-á a forma política mais elevada de sociedade.

  

E. As características ideológicas da Revolução de Transição: “Eliminação de Três Estreitos Preconceitos” e “Estabelecimento de Três Formas de Consciência Nobre”. A consciência social é um espelho da existência social. No decurso da Revolução de Transição, a consciência social avança constantemente da Eliminação dos Três Estreitos Preconceitos para o Estabelecimento das Três Formas de Consciência Nobre, e "o reino espiritual das pessoas melhora significativamente" (61). Como novos comunistas, os membros da sociedade como um todo passam a possuir um elevado grau de consciência comunista. Em primeiro lugar, o conceito de egoísmo é eliminado do campo da consciência espiritual, e estabelece-se o conceito de altruísmo. Na visão de Marx e Engels, a Revolução de Transição, no seu processo de desenvolvimento, envolve uma rutura radical com o pensamento tradicional. O "conceito tradicional" fundamental aqui é o conceito capitalista de "egoísmo", com a "propriedade privada" no seu cerne e incluindo várias formas de fetichismo, adoração do dinheiro e hedonismo. A Revolução de Transição rompe completamente com isto, permitindo que os seres humanos "se tornem altruístas, com educação superior e o nível técnico de trabalhadores comunistas inteligentes" (62).

 

Em segundo lugar, uma Revolução de Transição no campo da consciência teórica elimina uma mundividência superficial e irracional e permite o estabelecimento de uma mundividência científica. No contexto da Revolução de Transição, com as suas forças produtivas altamente desenvolvidas, juntamente com o fim das divisões de classe e a melhoria contínua do sistema social, as pessoas "abandonarão gradualmente a visão do mundo burguesa e adotarão uma visão do mundo proletária e comunista" (63). Em terceiro lugar, o individualismo será eliminado do campo da consciência moral e o coletivismo estabelecer-se-á. Os interesses das pessoas são a base da sua moralidade social, e um elemento-chave na Revolução de Transição é que o “interesse privado dos indivíduos deve coincidir com o interesse da humanidade” (64). A Revolução de Transição estabelecerá um conceito moral coletivista de serviço integral a toda a humanidade e, como resultado, “uma moralidade verdadeiramente humana que se eleve acima dos antagonismos de classe” tornar-se-á “possível” (65).

 

Conclusão

 

Em suma, a Teoria da Tripla Revolução é uma categoria geral que é sucessiva no tempo, ligada para cima e para baixo no espaço, progressiva na lógica e sobreposta nos seus níveis. Uma compreensão precisa, científica e abrangente das suas três dimensões ajudar-nos-á a esclarecer todos os tipos de leituras erradas e até mesmo interpretações erradas do significado de “revolução” e permitir-nos-á alcançar uma visão revolucionária completa do marxismo, particularmente no contexto chinês. Com base nisto, continuaremos a considerar a classe operária e os trabalhadores em geral como o corpo principal da revolução e levaremos o espírito da revolução à sua conclusão. Demonstrando ousadia e determinação, continuaremos a promover a grande prática do socialismo com características chinesas e avançaremos no caminho correto do marxismo, de modo a que se abra diante de nós uma poderosa visão revolucionária.

 

 

 

 

 

(*) Cheng Enfu (n. 1950) é um prestigiado economista e académico chinês, natural de Xangai. Atualmente é professor titular da Universidade da Academia Chinesa de Ciências Sociais, onde é diretor do Centro de Pesquisa para Desenvolvimento Económico e Social e do Instituto de Estudos Marxistas. É também professor do Centro de Inovação do Marxismo da Universidade Politécnica do Noroeste e professor catedrático da Universidade de Shandong. É membro do Congresso Nacional do Povo e presidente da Academia do Marxismo, sendo uma figura à qual o Partido Comunista Chinês, ao mais alto nível, pede opiniões sobre os mais variados assuntos, em especial sobre questões económicas. É reconhecido como um dos economistas mais criativos da China, tendo desempenhado vários mandatos como presidente da Academia Chinesa de Ciências Sociais. É um das mais destacadas personalidades marxistas da República Popular da China, sob Xi Jinping. O regime tem outros rostos de perfil intelectual não marxista, assim como há muitos pensadores marxistas chineses com variáveis graus de distanciamento em relação ao poder. Preside à Associação Mundial de Economia Política, sendo editor de duas revistas internacionais, International Critical Thought e World Review of Political Economy. É ainda editor-chefe da World Marxist Review. Tem desenvolvido trabalhos teóricos sobre a lei do valor conjuntamente com Alan Freeman. É igualmente editor deduas revistas chinesas, a China Journal of Political Economy e Journal of Economics of Shanghai School. Algumas obras suas têm sido publicadas no ocidente, com destaque para Delving into the Issues of the Chinese Economy and the World by Marxist Economists, Canut Int. Publishers (2020) e China's Economic Dialectic. The Original Aspiration of Reform, International Publishers, 2021 (com um prefácio de John Bellamy Foster).

Yang Jun é professor associado do Instituto de Marxismo da Escola do Partido Comunista Chinês do Comité Provincial de Zhejiang, em Hangzhou, Zhejiang, República Popular da China.

O presente artigo foi publicado no Volume 77, N.º 1 (maio de 2025) da revista Monthly Review. Todos os direitos reservados. A tradução é da responsabilidade de Ângelo Novo.

  

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NOTAS:

 

(1) “To Implement the New Development Concept and Promote the Development of High Quality, and to Strive to Create a New Situation in the Rise of the Central Region”, People’s Daily, May 23, 2019.

 

(2) Xi Jinping, “Speech at the New Year Tea Party of the CPPCC National Committee (December 30, 2016)”, People’s Daily, December 31, 2016.

 

(3) “Time Does Not Wait for Me; Seize the Day to Work and Create a New Situation in the Cause of Socialism with Chinese Characteristics in a New Era,” People’s Daily, January 6, 2018.

 

(4) “Do Not Forget the Original Aspiration, Remember Our Mission, Forge ahead with Confidence, and Continue to Consolidate and Develop New China”, People’s Daily, September 13, 2019. Xi tem repetidamente enfatizado em muitos simpósios que a melhor forma de homenagear os revolucionários chineses é levar adiante a causa revolucionária que eles iniciaram e pela qual lutaram. Esse tem sido o caso em eventos que celebram os nascimentos de revolucionários como Mao, Zhou Enlai, Liu Shaoqi, Zhu De, Deng, Chen Yun, Hu Yaobeng e outros. Ao mesmo tempo, Xi também enfatizou repetidamente numa série de visitas e atividades comemorativas em locais significativos da Revolução Vermelha que devemos nos esforçar para levar adiante a grande causa pela qual os mártires revolucionários lutaram e se sacrificaram, a fim de honrar os heróis revolucionários. Por exemplo, em maio de 2019, ele revisitou o local de partida da Longa Marcha do Exército Vermelho em Yudu, província de Jiangxi. Em Zhangye, província de Gansu, prestou homenagem ao Exército da Estrada Ocidental do Exército Vermelho dos trabalhadores e camponeses chineses em agosto desse ano e, um mês depois, no condado de Xinxian, província de Henan, comemorou os mártires da Área Soviética de Hubei Henan Anhui. Em julho de 2020, Xi visitou o Memorial da Campanha de Siping, na província de Jilin.

 

(5) Zhu Jiamu, “Marxism Is the Theory of Revolution First,” Research on World Socialism, no. 6 (2018).

 

(6) Karl Marx e Friedrich Engels, Collected Works, vol. 5 (London: Lawrence & Wishart, 2010), p. 38.

 

(7) Karl Marx e Friedrich Engels, The Marx and Engels Anthology, vol. 3 (Beijing: People’s Publishing House, 2009), p. 602.

 

(8) Xi Jinping, “Speech at the 200th Anniversary Meeting to Commemorate the Birth of Marx”, People’s Daily, May 5, 2018.

 

(9) Robert Charles Tucker, The Marxian Revolutionary Idea, trad. Gao An (Beijing: People’s Publishing House, 2012), p. 26.

 

(10) Marx e Engels, Collected Works, vol. 27, p. 521.

 

(11) Xi Jinping, The Governance of China, vol. 2 (Beijing: Foreign Language Press, 2017), p. 66; Jiang Hui, “We Are Still in the Historical Era Specified by Marxism - An Interview with Jiang Hui, Member of the Party Group of the Chinese Academy of Social Sciences and Director of the Institute of Contemporary China Studies”, Marxist Studies, n.º 1 (2019).

 

(12) Xi Jinping, Speech at the 120th Anniversary Symposium on Comrade Mao Zedong’s Birthday (December 26, 2013) (Beijing: People’s Publishing House, 2013), p. 24.

 

(13) “Tenacious Struggle to Achieve ‘the Goal of Two Centenaries”, People’s Daily, September 4, 2019.

 

(14) Marx e Engels, Collected Works, vol. 3, p. 206.

 

(15) Deng Xiaoping, Selected Works, vol. 3 (Beijing: People’s Publishing House, 1993), p. 383.

 

(16) Constitution of the People’s Republic of China, People’s Daily, March 22, 2018.

 

(17) Marx e Engels, Collected Works, vol. 6, p. 519.

 

(18) Marx e Engels, Collected Works, vol. 48, p. 423; Marx e Engels, The Marx and Engels Anthology, vol. 3, p. 611.

 

(19) Marx e Engels, Collected Works, vol. 35, pp. 35–36.

 

(20) Marx e Engels, Collected Works, vol. 50, p. 457.

 

(21) Mao Zedong, Anthology of Mao Zedong, vol. 2 (Beijing: People’s Publishing House, 1993), 341.

 

(22) Liu Xingang e Cheng Enfu, “The Historical Value of the Comintern and the Contemporary Value of Its Spirit, Written on the Occasion of the 100th Anniversary of the Founding of the Comintern”, Research on World Socialism, n.º 12 (2019).

 

(23) Xiao Feng, “‘International Union’ or ‘Successful Demonstration’ - On the Prospects of the World Socialist Movement”, Contemporary World Socialist Issues, n.º 3 (2013); Karl Marx e Friedrich Engels, Complete Works, vol. 39 (Beijing: People’s Publishing House, 1974), p. 84.

 

(24) Marx e Engels, The Marx and Engels Anthology, vol. 3, p. 14.

 

(25) Cheng Enfu, “The Future of World Socialism Depends on the Effective Joint Action of the International Proletariat”, Foreign Social Sciences, n.º 5, 2012. Neste artigo são apresentados pela primeira vez seis planos específicos para a ação conjunta efetiva do proletariado internacional.

 

(26) Xuan Chuanshu e Yu Ming, “Commemoration and Reflection of the Foreign Left Wing on the Comintern”, Marxist Research, n.º 3 (2020).

 

(27) Marx e Engels, Collected Works, vol. 10, p. 127.

 

(28) Xi Jinping, “We Must Focus on Six Aspects of Our Work in Implementing the Spirit of the Eighteenth Party Congress in a Comprehensive Way (November 15, 2012)”, Qiushi, n.º 1, 2013.

 

(29) Deng Xiaoping, Selected Works, vol. 3 (Beijing: People’s Publishing House, 1993 ed.), p. 113.

 

(30) Xi Jinping, The Governance of China, vol. 1, p. 101.

 

(31) Xi Jinping, The Governance of China, vol. 2, p. 124.

 

(32) Zhou Xincheng sustenta que “a propriedade pública como órgão principal, juntamente com o desenvolvimento comum de várias formas de propriedade, constitui o sistema económico fundamental durante a fase primária do socialismo” (Zhou Xincheng, “Unswervingly Adhere to the Basic Economic System of Socialism with Chinese Characteristics”, Research on Political Economy, n.º 1 [2020]).

 

(33) “Comprehensively Implement the Outline of the 13th Five-Year Plan, Strengthen Reform and Innovation and Create a New Situation for Development”, People’s Daily, April 28, 2016.

 

(34) Xi Jinping, “Winning the Battle to Build a Moderately Prosperous Society in All Respects, and Winning the Great Victory of Socialism with Chinese Characteristics in the New Era”, Report to the Nineteenth National Congress of the Communist Party of China (Beijing: People’s Publishing House, 2017), p. 26.

 

(35) “The Central Economic Work Conference Was Held in Beijing,” People’s Daily, December 12, 2014.

 

(36) Xi Jinping, The Governance of China, vol. 1, p. 348.

 

(37) Xi Jinping, Excerpts of the Expositions on Comprehensive Reform (Beijing: Central Literature Publishing House, 2014), p. 15.

 

(38) Xi, Excerpts of the Expositions on Comprehensive Reform, p. 4.

 

(39) “Wu Jinglian Answered a Reporter’s Question in this Fashion: ‘The Basic Feature of Socialism Is Social Justice and a Market Economy’”, China Economic Times, August 5, 1997.

 

(40) Xi Jinping, “The Secretary of the County Party Committee of the Jiao Yulu Type” (Beijing: Central Literature Publishing House, 2015), p. 5.

 

(41) Xi Jinping, “Speech at the General Assembly Commemorating the 200th Anniversary of Marx’s Birth”, People’s Daily, May 5, 2018.

 

(42) Cheng Enfu, “New Theory on the Three Stages of Socialist Development,” Jiangxi Social Science, n.º 3 (1992).

 

(43) Liu Guoguang, “Some Basic Theories of Chinese Political Economy Research”, Political Economy Research, n.º 1 (2020).

 

(44) Ver Wei Xinghua, “Thirteen Theoretical Right and Wrong Issues on the Theoretical Economic System of Socialism with Chinese Characteristics”, Economic Aspect, n.º 1 (2016); Wu Xuangong, “Upholding and Improving the Basic Economic System in the Primary Stage of Socialism”, Political Economy Review, n.º 4 (2014).

 

(45) Marx e Engels, Collected Works, vol. 35, p. 588.

 

(46) Marx e Engels, Collected Works, vol. 5, p. 292.

 

(47) Cheng Enfu e Duan Xuehui, “Ideological Interpretation of the Communist Economic Form in Capital (I)”, Economic Aspect, n.º 4 (2017).

 

(48) Cheng e Duan, “Ideological Interpretation of the Communist Economic Form in Capital (I)”.

 

(49) Marx, Collected Works, vol. 35, pp. 338-40.

 

(50) Marx e Engels, Collected Works, vol. 6, p. 498.

 

(51) Marx and Engels, Collected Works, vol. 27, p. 490.

 

(52) Marx and Engels, Collected Works, vol. 24, p. 87.

 

(53) Yu Hongjun acredita que “Combinado com os problemas fatais do sistema capitalista contemporâneo, podemos prever plenamente que o sistema económico planeado será novamente implementado na futura sociedade humana”. (Yu Hongjun, “The Logic of Economic System Selection”, Research on Political Economy, n.º 1 [2020]).

 

(54) Marx e Engels, Collected Works, vol. 24, p. 320.

 

(55) Marx e Engels, Collected Works, vol. 23, p. 425.

 

(56) Marx e Engels, Collected Works, vol. 24, p. 321.

 

(57) V.I. Lenin, Monographs on Marxism (Beijing: People’s Publishing House, 2009), p. 253.

 

(58) Marx e Engels, Collected Works, vol. 24, p. 325.

 

(59) V.I. Lenin, Collected Works, vol. 10, p. 26.

 

(60) V.I. Lenin, Complete Works, vol. 31 (Beijing: People’s Publishing House, 2017), p. 155.

 

(61) Hu Jintao, Selected Works, vol. 3 (Beijing: People’s Publishing House, 2016), p. 2.

 

(62) Communist Party of China, Selected Important Documents since the Founding of the Party (1921–1949), vol. 16 (Beijing: Central Literature Publishing House, 2011), p. 488.

 

(63) Mao, Anthology of Mao Zedong, vol. 7, p. 225.

 

(64) Marx e Engels, Collected Works, vol. 4, p. 131.

 

(65) Marx e Engels, Collected Works, vol. 25, p. 88.