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Significado histórico-cultural da crítica de Amorim Viana a Proudhon
Victor de Sá (*)
Agora que terminámos o resumo da crítica às Contradições Económicas (Filosofia da Miséria) de Proudhon (Guillaumin, Paris, 1846) (1), produzida no Porto por Pedro de Amorim Viana, está o leitor habilitado a acompanhar-nos nas considerações que intencionalmente deixámos para o final do nosso trabalho, a fim de tentarmos alcançar uma perspectiva crítica sobre a importância e o significado daquele estudo do nosso pensador oitocentista.
Para isso necessário se torna, prèviamente, referir o que significa na história do pensamento económico e social aquela obra de Proudhon e qual a repercussão que teve.
1. Importância da «Filosofia da Miséria» de Proudhon
Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) foi um pensador francês, oriundo de uma humilde família provinciana, ele próprio humilde, que teve a vida cheia de dificuldades; expressou com rara vivacidade o pensamento económico-social da pequena burguesia do século passado. Inquieto com a situação produzida pela 1.ª Revolução Industrial que já patenteava na plenitude as suas consequências - a concentração crescente do capital e da indústria, por um lado, e a extrema miséria, por outro, das classes operárias, incluindo a exploração das mulheres e das crianças; auto-didacta incansável que consumia as raras horas de descanso em estudos porfiados; dominado por uma preocupação essencialmente moral que buscava ansiosamente uma solução de justiça para o desequilíbrio social que por todos os lados o rodeava, Proudhon, depois dos seus iniciais estudos de filologia, debruçou-se sobre a economia, a história e a filosofia, fazendo de todas as matérias um estudo por certo mais apressado que reflectido. Senhor dum estilo literário vivo, fogoso até e ardentemente combativo, ergueu a bandeira da Revolução Social, opondo-a às instituições tradicionais da sociedade - a Igreja e o Estado - nas quais via a razão de ser da opressão e da desigualdade sociais.
O livro que publicara já em 1845 - O que é a propriedade? - dera-lhe uma aura de notoriedade por ter radicado na opinião contemporânea a célebre resposta de que «a propriedade é um roubo». Mas já então o seu trabalho era muito mais o dum moralista que dum crítico económico, pois o que ele considera como propriedade (explica-o numa carta dirigida a Blanqui) é verdadeiramente a «soma dos abusos da propriedade».
Quando, em 1844, o então jovem pensador alemão Karl Marx (26 anos) permaneceu por algum tempo em Paris, os dois socialistas conheceram-se. O jovem alemão, que apenas há três anos concluira na Universidade de Berlim o seu curso de Filosofia, tendo defendido tese sobre a Diferença da natureza na filosofia de Demócrito e Epicuro, colaborara já em Colónia na Gazeta Renana, que a censura em 1843 proibira de circular, depois do que se instalara em Paris, onde também conheceu pessoalmente o seu compatriota Frederico Engels, que viria a ser ou começou a ser desde logo o seu dedicado amigo e grande companheiro ideológico. Paris era então, como tantas outras vezes tem sido, a capital onde se refugiavam os proscritos de outros países. Além de Marx, Proudhon conheceu por essa altura e conviveu com outros dirigentes estrangeiros do movimento operário, como Karl Grün, Bakounine, Herzen, etc.. Marx e Engels estimavam principalmente em Proudhon ser ele o único socialista francês que não estava contaminado pelo misticismo cristão.
Data desse ano a iniciação que, por influência de Marx, Proudhon fez da filosofia de Hegel e do seu método dialéctico. Marx referir-se-á mais tarde (1865) a esse magistério, penitenciando-se perante as erradas aplicações do método feitas pelo seu discípulo: «Eu sou de certo modo responsável pela sua sofisticação, palavra que os ingleses empregam para designar a falsificação de uma mercadoria. Nas nossas longas discussões, frequentes vezes prolongadas por toda a noite, injectei-o de hegelianismo» - doutrina que Proudhon, anteriormente a esse encontro menosprezava - «isso, para mim é infantilidade, não é ciência» (carta de 23 de Maio de 1842).
Quando publicou a Filosofia da Miséria, assente num sistema de contradições económicas inspirado no princípio das antinomias hegelianas, os seus conhecimentos mal assimilados tiveram uma desordenada e desajustada aplicação ao método filosófico de Hegel, ao mesmo tempo que tirava deduções igualitárias da obra de Ricardo. E perante as dificuldades que o seu método tão confuso encontrava para explicar as contradições gritantes da sociedade capitalista, recorria frequentemente a elementos metafísicos como a Providência ou a Razão Universal.
A obra não alcançou o sucesso que o seu autor esperava. E foi exactamente de Karl Marx que ele recebeu uma crítica extraordinàriamente sarcástica. O que se passara então, que razões determinaram, essa atitude?
Marx encontrava-se agora refugiado em Bruxelas, depois de expulso de Paris, por Guizot, a instâncias do governo prussiano. A agudização da situação económica e social conduzia à necessidade de uma sólida preparação da luta operária, a que Marx e Engels se votaram com toda a decisão. Esforçavam-se por organizar, à volta de um corpo doutrinário, todos os grupos que, até 1845, tinham levado uma existência mais ou menos aventurosa e clandestina. Os dois socialistas alemães sentiam a necessidade de uma depuração, da eliminação de todo o sentimentalismo e liquidação de todas as pseudo-doutrinas que desarmavam a vanguarda operária na acção que ela tinha necessidade de empreender. Foi essa preocupação que conduziu à realização do congresso operário em Londres no Verão de 1847, que se ocupou da reorganização política à volta de uma doutrina de acção prática, e no qual Marx e Engels foram encarregados de redigir um manifesto que correspondesse a esse objectivo, o celebrado Manifesto Comunista.
Proudhon, solicitado para cooperar nessa reorganização do movimento operário, recusara a sua adesão: considerava-se revolucionário quanto à ideia, mas não quanto aos meios; não queria a violência nem as greves; importava-lhe tão sòmente a acção pedagógica, a educação que elevaria o povo à capacidade política, económica e moral; era apenas um conciliador, apenas um reformador: «a reconciliação universal pela conciliação universal» - era o seu lema. Por isso, alegava: não devemos, de modo algum, colocar a acção revoluciona como meio de reforma social, porque este meio seria um apelo à força, à arbitrariedade, em breve uma contradição». E anunciava em carta datada de Lyon, Maio de 1846, dirigida a Marx: «A minha próxima obra, cuja impressão neste momento vai em meio, melhor vos elucidará sobre o meu ponto de vista».
Desse modo, Marx recebeu da própria mão de Proudhon a confissão de que o objectivo implícito da sua Filosofia da Miséria era negar a aceitação da acção revolucionária como meio de reforma social, era um paliativo teórico oposto a um movimento em marcha. Antes mesmo de publicada, a sua obra já servia de pretexto para se opor à acção revolucionária empreendida. O abismo era intransponível, a ruptura inevitável.
Quando, em Outubro de 1846, a obra apareceu publicada, Marx concebeu imediatamente a sua refutação ideológica através de uma brochura. Mas à medida que desenvolvia a sua redacção, inteiramente em francês, nesse inverno frio de 46-47, a sua resposta tomou corpo e alcançou mesmo as proporções de um volume, que nessa época encontrou graves dificuldades para ser editado. Apareceu finalmente em Paris editada por A. Franck, e em Bruxelas por Vogler (2).
2. Aspectos gerais da refutação de Marx
Por antinomásia com a obra de Proudhon, Marx deu à sua obra o título de Miséria da Filosofia. É a obra que, no conjunto da sua bibliografia, marca mais acentuadamente a transição para a maturidade do pensamento marxiano. Enquanto que até então, Marx tendera a tratar a filosofia metódica dum modo estanque do da economia política, agora busca-lhes uma síntese objectiva e concreta de que resulta o método marxista aplicado ao real, quer na luta real como na explicação da vida real. A experiência adquirida após a sua saída da Alemanha, em Paris e Bruxelas, a sua participação na organização do movimento operário na capital francesa, depois as suas primeiras ligações internacionais e a própria reflexão sobre as contradições ideológicas de Proudhon, permitiram-lhe, pela primeira vez, escrever uma obra em que a explicação marxista apreende a mais ampla realidade, revelando-se total e decisiva sem carecer de a retomar mais tarde para a alterar à luz de diferentes pontos de vista.
Era já a concretização sistemática dos princípios enunciados na carta que escrevera em 1845 ao fundador da revista Anais Franco-Alemães: não se trata de dizer aos homens - abandonai as vossas lutas, que isso é tempo perdido, nós vos daremos a bandeira da verdade -; o que os Anais já deviam fazer, na sua opinião, era mostrar aquilo que por verdadeiramente se luta e obrigar os homens a adquirir essa consciência. E, em dois artigos que lá publicara, já tratava da luta das classes trabalhadoras, fazendo também uma análise filosófica da sociedade socialista idealizada pelos utopistas. Eram as primeiras manifestações da consciência crítica de Marx, que agora, na sua refutação anti-proudhoniana, alcançava uma sólida estruturação.
O livro de Marx abre com uma nota preliminar que consiste numa autêntica declaração de guerra: O sr. Proudhon «na França tem o direito de ser mau economista, porque passa por ser um bom filósofo alemão. Na Alemanha, tem o direito de ser mau filósofo, porque passa por ser um dos melhores economistas franceses. Nós, na qualidade de alemão e economista, protestamos contra este duplo erro». E a análise delonga-se em múltiplas críticas, demonstrando não só a falta de originalidade em muitos dos conceitos que Proudhon proclama, como sendo descobertas suas, apontando as suas contradições e utopias, e denunciando ainda os deslises metafísicos da sua precária economia política. «O método histórico e descritivo do sr. Proudhon serve para tudo, responde a tudo, explica tudo. Quando se trata sobretudo de exlicar històricamente a geração de uma ideia económica, ele supõe um homem que propõe a outros homens, seus colaboradores em diversas funções, levar a efeito este acto de geração, e tudo está dito».
A teoria do «valor constituído», que Proudhon pretendia fazer passar como «concepção revolucionária do futuro», Marx demonstrou que não era mais do que aquilo que Ricardo havia apresentado como a teoria da sociedade burguesa. Na medida em que o socialismo moderno, seja qual for a sua tendência, procede da economia política burguesa, liga-se quase exclusivamente à teoria do valor de Ricardo. As suas proposições formuladas em 1817 - a) o valor de cada mercadoria é unicamente determinado pela quantidade de trabalho exigida para a sua produção, b) o produto da totalidade do trabalho social é repartido entre as três classes dos proprietários de terras (renda), dos capitalistas (lucro) e dos trabalhadores (salário) - já haviam dado origem na Inglaterra, a partir de 1821, a conclusões socialistas, com apreciações sobre a origem e a natureza da mais-valia, que Marx veio a definir como não sendo senão muito simplesmente o trabalho não pago. «O trabalho, sendo ele próprio mercadoria, é medido como tal pelo tempo do trabalho que é preciso para produzir o trabalho-mercadoria. E o que é preciso para produzir o trabalho-mercadoria? Justamente aquilo que é preciso de tempo de trabalho para produzir os objectos indispensáveis à manutenção incessante do trabalho, ou seja, para fazer viver o trabalhador e pô-lo em condições de propagar a sua raça. O preço natural do trabalho não é outra coisa senão o mínimo de salário. Se o preço corrente de salário se eleva acima do preço natural, é precisamente porque a lei do valor, apresentada como princípio pelo sr. Proudhon, se acha contrabalançada pelas consequências das variações da relação entre a oferta e a procura. Mas o mínimo de salário não deixa de ser o centro à volta do qual gravitam os preços correntes do salário. Assim, o valor relativo, medido pelo tempo de trabalho, é fatalmente a fórmula da escravidão moderna do operário, em vez de ser, como quer o Sr. Proudhon, a teoria revolucionária de emancipação do proletariado».
Quanto às categoria económicas, Marx mostra que elas não são senão as expressões teóricas das relações sociais de produção, nas quais Proudhon via a encarnação dos princípios e pensamentos que, na sua expressão, «dormitavam na razão impessoal da humanidade». «As relações sociais - explica Marx - estão intimamente ligadas às forças produtivas; adquirindo novas forças produtivas, os homens mudam o seu modo de produção, e mudando o seu modo de produção, a maneira de ganhar a vida, mudam todas as suas relações sociais. O moinho à mão dá-nos a sociedade com o suserano; o moinho a vapor, a sociedade com o capitalista industrial». Assim, «estas ideias, estas categorias são tão pouco eternas quanto as relações que exprimem. Elas são produtos históricos e transitórios».
Depois da análise económica, vem a crítica filosófica: «Se o inglês transforma os homens em chapéus, o alemão transforma os chapéus em ideias; o inglês é Ricardo, rico banqueiro e distinto economista, o alemão é Hegel, simples professor de Filosofia na Universidade de Berlim». O que Hegel fez em relação à religião, ao direito, etc., o Sr. Proudhon procura fazer em relação à economia política. Numa errada aplicação da dialéctica hegeliana, Proudhon via em todas as categorias económicas dois aspectos em contradição; um bom e outro mau. Para ele, o problema consistia em conservar o lado bom e eliminar o mau. «O Sr. Proudhon, apesar dos grandes esforços que fez para escalar a altura do sistema das contradições, jamais conseguiu elevar-se acima dos dois primeiros degraus da tese e da antítese simples, e ainda não os alcançou senão duas vezes, e, numa dessas duas vezes, caiu de costas». «Hegel não tem problemas a colocar, não tem senão a dialéctica. O Sr. Proudhon da dialéctica de Hegel tem apenas a linguagem; o movimento dialéctico, para ele, é a distinção dogmática do bom e do mau». E comenta deste modo o seu método idealista: «Para o Sr. Proudhon, a circulação do sangue deve ser uma consequência da teoria de Harvey».
Marx exemplifica a sua asserção referindo a produção feudal, que também tinha dois elementos antagónicos, o lado bom e o lado mau do feudalismo. «É o lado mau - rectifica Marx - que produz o movimento que faz a história, constituindo a luta. Se, na época do predomínio do feudalismo, os economistas, entusiasmados com as virtudes cavalheirescas, com a boa harmonia entre os direitos e os deveres, com a vida patriarcal das cidades e a situação de prosperidade da indústria doméstica do campo, com o desenvolvimento da indústria organizada por corporações, enfim, com tudo aquilo que constitui o lado bonito do feudalismo, se tivessem proposto o problema de eliminar tudo o que ensombrece esse quadro - servidão, privilégios, anarquia - que teria acontecido? Ter-se-ia destruído todos os elementos que constituíam a luta, e sufocado em seu germe o desenvolvimento da burguesia. Ter-se-ia colocado o absurdo problema de eliminar a história». Ao contrário, é precisamente desse antagonismo que resulta a produção e a riqueza: ao mesmo tempo que as forças produtivas se desenvolviam, desenvolvia-se também o antagonismo das classes, e uma das classes, o «lado mau», o «inconveniente da sociedade», continuava a crescer até que as condições da sua emancipação chegassem ao ponto da maturidade. «Os mesmos homens que estabelecem as relações sociais de acordo com a sua produtividade material, produzem também os princípios, as ideias, as categorias, de acordo com as suas relações sociais. Assim, estas ideias, estas categorias, são tão pouco eternas quanto as relações que exprimem. São produtos históricos e transitórios».
O refutador de Proudhon refere-se ao nascimento da burguesia e ao antagonismo que também era a condição de desenvolvimento da sociedade capitalista «No próprio momento em que a civilização tem início, a produção começa a basear-se no antagonismo das ordens, dos estados, das classes, no antagonismo do trabalho acumulado e do trabalho imediato. Sem antagonismo não há progresso. É a lei que a civilização seguiu até nossos dias».
O volume termina com um pequeno capítulo sobre as greves e as associações dos operários, no qual Marx refuta a teoria de Proudhon de que todo o movimento de elevação de salários não pode ter outro efeito senão uma alta de preços dos produtos. «É impossível - escrevera Proudhon - que as greves seguidas de aumento de salários não levem a um encarecimento geral: isto é tão certo como dois e dois serem quatro». Marx responde: «Negamos todas estas asserções, excepto dois e dois serem quatro». - «A alta e a baixa do lucro e dos salários não exprimem senão a proporção na qual os capitalistas e os trabalhadores participam do produto de um dia de trabalho, sem influirem, na maior parte dos casos, sobre o preço do produto».
Quanto às associações, Marx constata que é a forma sob que sempre se verificam as primeiras tentativas dos trabalhadores no sentido de se defenderem: «A grande indústria aglomera num só lugar uma multidão de pessoas desconhecidas umas das outras; a concorrência divide os seus interesses. Mas a manutenção do salário, este interesse comum que têm contra o patrão, reúne-as num mesmo pensamento de resistência - associação. Assim, a associação tem sempre um duplo objectivo, o de fazer cessar a concorrência entre os operários, para poderem fazer uma concorrência geral ao capitalisra. Se o primeiro objectivo de resistência não foi senão a manutenção dos salários, à medida que os capitalistas por sua vez se reúnem num mesmo pensamento de repressão, as associações, a princípio isoladas, formam-se em grupos, ligas, e diante do capital sempre unido, a manutenção da associação torna-se mais necessária para os operários do que a do salário. Nesta luta - verdadeira guerra civil - reúnem-se e desenvolvem-se todos os elementos necessários para uma batalha futura. Uma vez chegada a esse ponto, a associação adquire um carácter político. As condições económicas tinham a princípio transformado a massa da população do país em trabalhadores. A dominação do capital criou para esta massa uma situação comum, interesses comuns. Assim, esta massa já é uma classe diante do capital, mas não o é ainda em si mesma. Na luta, esta massa reúne-se, constitui-se classe em si mesma. Os interesses que ela defende tornam-se interesses de classe. Mas a luta de classe como classe é uma luta política». - «A condição de libertação da classe trabalhadora é a abolição de todas as classes, do mesmo modo como a condição de libertação do terceiro estado, da ordem burguesa, foi a abolição de todos os estados e de todas as ordens».
Como se vê, a oposição dos pontos de vista entre os dois socialistas era radical: opostos na economia, opostos na filosofia e opostos na táctica da luta operária. Era a ruptura ideológica e táctica, da mesma maneira que a ruptura política e pessoal.
Perante esta acendrada análise e crítica contumaz, Proudhon fez silêncio sobre a obra de Marx, nessa altura ainda pouco conhecido, enquanto o teórico francês gozava de prestígio não apenas entre muitos sectores do proletariado francês, como até na Bélgica e na Suíça. Não lhe respondeu, nem se lhe referiu; o seu prestígio sairia abalado se proporcionasse eco à cerrada argumentação do jovem socialista alemão. O silêncio cobriu-lhe a retirada.
Depois desta contenda, como Proudhon, num constante saltitar entre posições materialistas e idealistas no campo filosófico, a que correspondia no campo económico-social um vago socialismo e um utopismo desastrado, mantivesse uma incontestável influência sobre certos círculos de trabalhadores, particularmente entre os anarquistas, Marx sempre doutrinou contra as suas falsas concepções, opondo-lhe as do socialismo científico, cujas bases assentou de parceria com o seu amigo e camarada Engels.
3. Portugal em meados de Oitocentos - (Degeneração da Revolução Liberal)
Que tem que ver com aquela contenda ideológica decorrida no coração industrial da Europa de oitocentos, a crítica do nosso Amorim Viana publicada na burguesíssima cidade do Porto de 1852?
Portugal acabara pouco antes de fazer a sua tímida Revolução Liberal. Ela começara em 1820, com um conteúdo político mal definido e aspirações bem modestas. Não foi tanto uma revolução popular, como sobretudo uma revolução comercial e idealista, sentimental, «transferindo-se da ordem pessoal, o rei, para a ordem impessoal, a pátria, o centro dos sentimentos de dependência e solidariedade dos portugueses» (3). As Constituintes de 1821, que resultaram dessa revolução, mostram-nos, pelas profissões dos representantes eleitos, o âmbito delimitadamente burguês do movimento: havia lá fidalgos, sobretudo da província, ou sejam os grandes proprietários rurais, bispos, eclesiásticos, académicos, professores da Universidade, militares, magistrados, advogados, funcionários públicos, proprietários, escritores, médicos e comerciantes, isto é, representantes de todas as classes liberais; «só o povo do campo e dos mesteres - já muito argutamente notara Joaquim de Carvalho (4) - não tinha representação».
E quanto ao conteúdo ideológico dos liberais de 1820, Latino Coelho (5) é explícito: «Eram por assim dizer uns demagogos académicos, que faziam da revolução um tema de disputações e um certame de dialéctica... Faziam da liberdade um hino, e da revolução um circo aparatoso. A par dos mais inspirados improvisos sobre a soberania popular, ouriçavam-se-lhes de terror santo as cabeleiras apolvilhadas ao menor tentame de verdadeira emancipação popular».
A revolução, portanto, era dos burgueses, assistidos pelos juristas; a liberdade que proclamavam e a constituição que defendiam, eram a sua liberdade e a sua constituição: não admira que a gente do povo, analfabeta e ignorante, os não entendesse nem os acompanhasse. As suas ideias inovadoras cingiram-se ao estabelecimento de urna constituição escrita que fixasse os direitos naturais do homem e do cidadão, a liberdade pessoal, a igualdade perante a lei, a soberania nacional e o poder representativo, enfim, reivindicações meramente políticas.
Para além destes ideais mais ou menos metafísicos do racionalismo político, apenas, no plano concreto, a defesa intransigente das prerrogativas perdidas dos proprietários e comerciantes: o Brasil voltou a integrar-se no regime colonial, sendo obrigado a servir-se dos transportes do reino, garantindo-se a colocação ali das exportações do continente - simulacro de reciprocidade, pois que, enquanto a metrópole encontrava assim meio de colocar aproximadamente 50 % das suas exportações de vinho, Portugal só consumia 8 % do açúcar brasileiro (6).
Foi a isto que se limitou a primeira fase da Revolução Liberal portuguesa.
Muito? Pouco? - Para as condições económicas e mentais em que a nação se encontrava em 1820, talvez fosse muito. Para ser uma revolução, era necessàriamente pouco, não passava duma alteração superficial da fisionomia política. E porque a modificação não tocou então o cerne nacional, o terreno ficou propício à conspiração contra-revolucionária. Uma revolução ou vai por diante ou sai comprometida. Ora a inanidade das cortes de 1821-22, por um lado, e a inépcia política dos liberais, por outro, fizeram decair o espírito liberal da euforia que impulsionara a revolução, e, sem as remodelações estruturais que se impunham, o campo ficou aberto à penetração vitoriosa dos absolutistas adeptos de D. Miguel.
Não é impunemente que se atenta contra as forças do reaccionarismo secular: ou se o elimina, ou ele então se reerguerá mais arrogante e implacável. Assim aconteceu: em 1828, D. Miguel não teve dificuldade em fazer-se aclamar rei absoluto, desenvolvendo-se um perseguição feroz, com denúncias alarmantes que estendiam as suspeições ao próprio uso do chapéu. A guerra civil surgiu como consequência deste desbragamento reaccionário, e as forças liberais saíram por fim vitoriosas (1834), mas recebendo por herança uma nação mais pobre ainda, com a população menos culta e os ódios acendrados.
Sem indústrias, só havendo a riqueza da terra concentrada na posse das instituições religiosas («a fradaria absorve-nos, a fradaria suga tudo, a fradaria arruina-nos» - já se queixava Alexandre Gusmão há cem anos antes), a Revolução Liberal, mesmo na segunda fase, não pôde ir, no domínio económico, além das reformas de Mouzinho da Silveira e de Joaquim António de Aguiar, que extinguiram 401 conventos e 49 hospícios que dispunham de uma renda anual de 763.544$361 réis (7). Mas esses latifúndios confiscados aos privilegiados tradicionais serviram apenas para engordar os novos privilegiados, agora os barões do liberalismo, que não tinham outras aspirações além de alcançar em proveito próprio os benefícios e regalias que condenavam quando o proveito era alheio.
O proletariado não existia entre nós, nem então surgiu, como classe social. Mas floresceu a burocracia, que atingiu com o liberalismo todo o esplendor improdutivo: resultado um pouco da preocupação civilista na administração pública, e muito dos vícios eleitorias de arrebanhar clientelas. De modo que, «não havendo outra indústria que a burocracia, foi ali que apareceu o canibalismo do proletariado em desequilíbrio económico. Era preciso acabar com o comunismo fradesco, para dar lugar ao comunismo dos amanuenses e chefes de secretaria - a nova ordem de frades trapistas do constitucionalismo» (8).
A corrida desenfreada aos novos privilégios e monopólios laicos, ao mesmo tempo que a necessidade de alargar a clientela eleitoral pelo aumento dos quadros do funcionalismo, sujeitaria o regime liberal à inanição do rotativismo político precedido duma Regeneração sem ideias alevantadas, nem propósitos objectivamente construtivos. A luta política degenerou numa polémica sobre princípios constitucionais - Carta doada, Constituição votada - por detrás do que se ensaiaram as primeiras ditaduras do liberalismo, a de Rodrigo da Fonseca, a de Costa Cabral, etc., finalmente uma oligarquia de capitalistas que passaram a financiar os empreendimentos do Estado, dominando assim os governos.
O individualismo que o liberalismo despertou não encontrou entre nós estruturas que o condicionassem para se sobrepor e preencher o vazio deixado pelo desaparecimento da autoridade real, por um lado, e, por outro, pela extinção das ordens religiosas e seus núcleos culturais disseminados pelo país. A burguesia «ambiciosa de honras, ridícula na vaidade, inculta e grosseira» (9), ficou só no terreiro com toda a sua insuficiência e com todo o seu individualismo. A decrépita e corrupta aristocracia do sangue fora substituída pelo reinado político da burguesia. Deste modo, o individualismo liberal produziu muito mais uma manifestação de anarquia, que teve a sua expressão política na regeneração e no rotativismo, paradoxalmente ordeiristas, do que uma afirmação de capacidade cívica e cultural.
Portugal não era, porém, nem se tornou então, uma potência industrial.
O território era um vasto aglomerado de aldeias, donde apenas dois burgos emergiam com certa vida, no entanto dedicados mais à actividade comercial que à industrial. Sendo o Porto a cidade que ao tempo mais progressiva se afirmava, em 1830 contava apenas 2.000 indivíduos trabalhando em actividades industriais, à média de 11 por fábrica, o que revela o carácter ainda predominantemente oficinal dessa indústria. Só em 1835 é que apareceu entre nós a primeira máquina a vapor, cuja generalização se verificou depois de 1845; mesmo assim, até 1852, apenas 70 tinham sido instaladas, totalizando 983 cavalos-força (10).
O meado do século era, portanto, entre nós, um período incaracterístico do ponto de vista económico ou, melhor dizendo, de lenta transformação económica: acabara de se operar a Revolução Liberal, de feição rural, comercial e civilista, a burguesia portuguesa achava-se triunfante, mas o capitalismo não atingira ainda o seu desenvolvimento, estava entre nós ainda na puberdade.
De resto, o nosso capitalismo entrou pela «porta de cavalo», não irrompeu vitorioso duma luta contra o regime senhorial, instalou-se no poder sub-reptìciamente, através dos movimentos mornos da política constitucional. O burguês capitalista alcançou o seu predomínio na sociedade portuguesa não tanto pela iniciativa particular que caracterizara a ascensão burguesa dos países industriais e progressivos, mas sobretudo pela direcção do Estado, de que foi instrumento o Eng.º Fontes Pereira de Melo com a sua política de fomento aliada ao cerceamento das liberdades cívicas. «Não é apenas uma política de obras públicas realizada por engenheiros, mas também um sistema de corrupção e adulteração das instituições parlamentares concebida e efectuada por políticos profissionais» - como escreve António José Saraiva apoiando-se nos escritos que atribui a Herculano em O Português - 1853 (11).
Os valores morais e mentais desse tempo, que também os teve o liberalismo, mas arredados, levantaram-se ainda, mas impotentes, em oposição a esta política corrupta. Insurge-se Herculano no Português, como, três anos mais tarde, Amorim Viana no Clamor Público. São duas sensibilidades morais caldeadas de afervorado civismo a aferir, em momentos diversos, a gravidade do mesmo mal nacional. É um período que se prolonga, «um momento decisivo da evolução do Liberalismo em Portugal: o momento em que uma política financeira-latifundiária se instala pacificamente na vida nacional, acobertada nela ficção da legalidade constitucional, que finalmente aprendeu a manejar com êxito; o momento também em que alguns dos pontos mais radicais do programa da revolução liberal portuguesa - o anti-clericalismo, o fomento da pequena propriedade, o barateamento do crédito, o ensino popular - são definitivamente atirados à rua pelo grupo governante (11).
Isso explica que os ideais de morigeração social e política que tinham vitalizado a facção progressiva do liberalismo português, ràpidamente se tenham transferido para as aspirações socialistas e republicanas que se afirmaram a partir de 1848 (12).
4. Formação da personalidade de Amorim Viana – (Génese e caracterização do seu socialismo)
Quando Viana inicia a publicação do seu estudo sobre Proudhon, estava na pujança da sua mocidade, com 29 anos de idade. Formado em Matemática e Filosofia na Universidade de Coimbra no ano de 1848, fora admitido como professor de Matemática na Academia Politécnica do Porto, depois de, em concurso, ter prestado brilhantes provas.
Amorim Viana, porém, não era natural do Porto. Nascera em Lisboa, e após a sua formatura estivera por algum tempo ainda na capital a reger a cadeira de Lógica no Liceu Normal. A sua nomeação para a Politécnica é que determinou a sua fixação no Porto, onde logo estabeleceu boas relações com alguns dos mais promissores valores do seu tempo.
A fama da sua lúcida inteligência e vasta cultura acompanhava-o já desde o tempo dos seus estudos universitários, e a ela se referem, entre outros, Alberto Pimentel, João Grave, Sampaio Bruno, Silva Pinto, Levy Maria Jordão, Antão de Vasconcelos, Fran Paxeco, seus contemporâneos, uns, e, outros, mais novos que com ele privaram ainda.
Sobre a sua infância e juventude, como de resto sobre os demais períodos da sua vida, sabe-se muito pouco: o ostracismo a que desde certa altura foi votado pela sociedade burguesa e reaccionária do seu tempo, fez com que, à curta distância de um século, Amorim Viana nos surja como uma sombra enigmática de perfil mal delineado na bruma do esquecimento. Mas sabe-se que nasceu em Lisboa em Dezembro de 1822 e que, na juventude, estudou em Paris no colégio luso-brasileiro D. Pedro de Alcântara, que funcionou em Fontenay-aux-Roses entre 1838 e 1843.
Deverá aos estudos neste colégio a sua formação em assuntos sociais, económicos e filosóficos? Não é de crer, pois o colégio fora fundado e era dirigido por um antigo frade miguelista que fugiu de Portugal quando o liberalismo triunfou, o acendrado frei José de Sacra Família que, na conjuntura, alcançou um breve de secularização, passando à vida civil com o nome e a dignidade do seu grau académico, Dr. José da Silva Tavares. O colégio, financiado por um abastado comendador, manteve durante a sua curta existência as melhores relações com as autoridades literárias e civis da França, isto é, com o mundo conservador francês. A avaliar pelas disciplinas lá ministradas, o âmbito da educação era predominantemente humanístico-literário aliado a algumas generalizações científicas: línguas portuguesa, francesa, latina, grega, inglesa, espanhola, italiana e alemã, geografia, matemáticas, ciências, desenho, filosofia, música, pintura, esgrima, equitação e dança (13). Não é de crer, pois, que tenham sido os seus mestres, quer os de Fontenay-aux-Roses, quer os que posteriormente encontrou nas margens poéticas do Mondego, que tenham despertado nele o agudo interesse que veio a revelar pelos problemas económicos e sociais decorrentes do industrialismo do seu tempo.
Terá ele convivido em Paris com algumas personagens do mundo socialista, ou terá observado conflitos sociais que o despertaram para estes problemas? Não se sabe.
Se não foram os estudos ministrados na fase da sua educação, também não foram certamente as condições económicas da sociedade portuguesa, nessa altura ainda pràticamente sem indústria, conforme vimos acima.
Por exclusão de partes, teremos de procurar a causa determinante do seu estudo em razões doutra natureza: afigura-se como a afloração duma elite de jovens intelectuais do seu tempo, tais como Henriques Nogueira, Custódio José Vieira, Alexandre Braga, Lopes de Mendonça, Sousa Brandão, Ribeiro da Costa, António Girão, Coelho Lousada, Arnaldo Gama e Delfim Maia, estes últimos seus camaradas na empresa do lançamento da revista A Península, onde o seu estudo começou a publicar-se desde o primeiro número. Jovens intelectuais esses que desde 1848 adoptaram dum modo mais ou menos vincado uma atitude de oposição aos rumos oficiais do liberalismo constitucional, alguns dos quais formaram mesmo o primeiro núcleo de socialistas portugueses.
O estudo de Amorim Viana surgiu assim como uma antecipação meramente intelectual, no seio de uma sociedade que não estava ainda amadurecida para a compreensão dos agudos problemas económico-sociais aí debatidos. Nem doutro modo podia suceder num país de economia predominantemente agrária e comercial: o socialismo português não surgiu das contradições internas do capitalismo industrial, mas da frustração dos ideais progressivos do liberalismo. Perante a falência interna das ideias de justiça e equidade, foram importados da França, por vias meramente intelectuais, as ideias do socialismo então vigente, que animaram os nossos espíritos mais generosos da época.
Distingue-se dos seus camaradas idealistas e sentimentais o nosso Amorim Viana pela aplicação crítica do seu método racionalista e consequente.
Se o estudo de Viana não podia ter por essa altura grande projecção na sociedade portuguesa, pode perguntar-se se teria alguma nos meios socialistas estrangeiros. Na realidade, porém, e lamentàvelmente, nada se sabe também sobre as relações que o nosso crítico possa ter tido com esses meios, nomeadamente com a própria pessoa de Proudhon.
Terá mesmo tido o socialista francês conhecimento desta crítica publicada na revista portuense? Alguns memorialistas expandem-se em considerações sobre o grande sucesso que obteve esta série de artigos nos «centros científicos da Europa» (Fran Paxeco) e que teriam mesmo sido traduzidos em alemão e publicados em volume nesse idioma (Joaquim de Araujo e Rodolfo Guimarães). Mas essas asserções optimistas não conseguimos ainda vê-las confirmadas, a despeito de algumas tentativas por nós próprios, pelo menos, promovidas. O que nem por isso, aliás, diminui a importância real, intrínseca, do trabalho de Amorim Viana.
5. Semelhanças e contrastes relativamente a Proudhon e a Marx
Analisados assim os aspectos, digamos, extrínsecos da obra de Amorim Viana, resta-nos apreciar as semelhanças e os contrastes que possa haver entre o autor português e o pensador socialista francês Proudhon, bem como com o seu crítico alemão e fundador do socialismo científico, Marx.
Viana tem com Proudhon uma grande afinidade: é aquela que decorre das preocupações éticas que a ambos avassalam. E porque assim é, o crítico português tem desde o início do seu estudo uma atitude de simpatia e compreensão para as preocupações que inquietam o seu espírito.
Na introdução à sua análise, a atitude de simpatia para com Proudhon é tão evidente, que começa por o defender contra os que procuram denegri-lo. Esta defesa, porém, não alude a Marx, mas aos reaccionários e conservadores franceses, que viam nos escritos de Proudhon afirmções heréticas que procuravam abafar. Isto é, na polémica entre o socialista francês e a sociedade conservadora, Amorim Viana alinha em defesa do socialista, sobrelevando-lhe o seus conhecimentos filosóficos, a vivacidade do seu estilo literário e as suas preocupaçõçs humanitárias de justiça.
Só depois de o colocar no pedestal da consideração pública é que entra a dilucidar a sua crítica, e para isso vale-se duma desenvolvida exposição filosófica para minar desde logo todos os fundamentos do edifício construído por Proundhon. O resto da análise é uma pormenorização da sua critica, e pelo desenvolvimento que fizemos dela na 1.ª parte do nosso trabalho (1), bem se pode avaliar como em tantos pontos coincide com a crítica de Marx: nos erros de interpretação económica, nos voos inseguros pelos domínios da metafísica, nos arroubos da sua imaginação, na incongruência de algumas das suas deduções, enfim, na deconexão entre problemas de natureza diferente que Proudhon precipitadamente reduz ao mesmo plano.
E não admita que assim seja, pois que Amorim Viana e Karl Marx ambos possuem uma solidez de formação intelectual que não pode sofrer pararelo com Proudhon: ambos têm de comum um profundo conhecimento filosófico e uma séria informação no domínio económico.
É certo que, enquanto Marx tem uma formação materialista, Viana considera a filosofia como uma metafísica, resistindo assim, ou opondo-se, aos prejuízos do positivismo então dominante. Esse metafisismo amoriniano conduz à introdução dum elemento racionalista no seu pensamento teodiceico: Deus como postulado da razão. Mas este deus racionalista de Amorim Viana, que o adoptou de Leibnitz, é a expressão do próprio ideal da ciência e o objecto da sua crença optimista no progresso; não é um deus reaccionário, transcendente, que sirva de argumento teológico à exploração do trabalho alheio e da ignorância pública pela classe dominante, mas é a mónade suprema para que tendem todas as mónades do universo, incluindo as que constituem os seres humanos, aspiração divina essa que tem por instrumento o desenvolvimento da ciência e a análise racional que torna inteligíveis os fenómenos; um deus, portanto, que não se opõe, por exemplo, à quase perfeita identificação com Marx no que respeita à crítica económica e social do sistema proudhoniano.
No que mais se distingue a crítica do pensador português da crítica do socialista alemão é na intenção que as ditou e no método que empregaram: enquanto que Marx polemiza desde logo com Proudhon com a nítida intenção de o combater, por razões não só de ordem teórica mas também de ordem táctica, rebatendo-lhe portanto as suas doutrinas desde os fundamentos até às consequências, discussão tanto mais apaixonada quanto é certo que através dela se assinala a transição para a maturidade do pensamento marxista, Viana, pelo contrário, adopta uma atitude benevolente e procura ser compreensivo aceitando as boas intenções do socialista francês, embora não lhe perdoando nunca sua frequente falta de coerência e os perigos do seu utopismo.
Por outro lado, enquanto Marx era um militante do movimento operário, já expulso de dois países pela sua actividade, Viana fora aluno de frei José de Sacra Família, e, quer na sua juventude, quer no decurso de toda a sua vida, não dera nunca provas de possuir, e não possuía, as características do militante activo e senhor de uma táctica de conduta destinada a atingir um determinado objectivo prático. Viana foi mesmo a negação do génio prático: quando combatia era impulsionado por razões de ordem moral e adoptava para as exprimir meios meramente intelectuais. Viana afirmou-se apenas um pensador, que analisou com arguta lucidez os problemas económicos, sociais e políticos do seu tempo, que muitas vezes se serviu da Imprensa para escalpelizar com nobre altivez cívica os desmandos dos poderosos do seu tempo, mas, na realidade, não militou senão como intelectual, no partido Setembrista, aliás o mais progressivo de então. E não poderia certamente ir mais além num país, como já vimos, sem desenvolvimento económico e industrial, onde, portanto, subsistia uma mentalidade estruturalmente reaccionária e conservadora.
O estudo de Amorim Viana nunca se refere a Karl Marx, nem nos seus escritos posteriores alguma vez lhe encontramos qualquer citação ou alusão tão-pouco. Nada faz supor que tenha conhecido a sua refutação a Proudhon publicada cinco anos antes.
Ora, não foi por Marx ser um autor herético que Viana deixaria de o citar: já porque, nem mesmo em assuntos muito mais melindroos ao tempo, como os religiosos, Viana nunca se privou de citar até os excomungados quando isso se impunha; como ainda porque Marx, em 1852, era um nome sem a projecção que só no decorrer da segunda metade do século veio a alcançar; certo é que, além da Miséria da Filosofia e outras publicações, tinha sido um dos redactores do Manifesto Comunista; mas todo este barulho se passava para além dos Pirenéus, e era um nome apenas entre muitos que não se tinha imposto às iras fixas dos posteriores adversários do seu sistema. Não era considerado ainda o grande heresiarca do século. Viana podia, portanto, sem reserva de qualquer espécie, aludir aos seus escritos. Cremos que não o citou porque não o conheceu.
E contudo, assemelha-se em muitos pontos a sua crítica à do pensador alemão, especialmente quando demonstra, como faz com a teoria de valor e outras, que as críticas que Proudhon apresenta como originais não passam da reprodução das teorias de Ricardo e Smith, bem como quando lhe desvanece as utopias, chamando-o ao terreno positivo das realidades económicas.
Também no plano da refutação amoriniana, além das diferenças já apontadas quanto à intenção, ao estilo e ao método, há uma grande diferença relativamente à refutação marxiana, pois que Viana se demora na análise de muitos aspectos da obra de Proudhon que Marx nem tão-pouco refere, como seja, a crítica ao projecto proudhoniano do banco do povo.
Mas há em algumas passagens de Viana pensamentos que nós hoje, com uma perspectiva já completa do pensamento marxista, seríamos tentados a considerar inspiradas na obra de Marx. Esta, por exemplo, à parte o estilo e certas comparações: «Um direito internacional será sempre um escárneo diplomático enquanto as nacionalidade tiverem por princípio a ambição e a cobiça. Essa ambição, essa cobiça dominarão inevitàvelmente enquanto as constituições internas dos povos forem fundadas na distinção das duas castas - a dos produtores pobres e miseráveis e a dos ociosos poderosos e abastados. O patriotismo é como a justiça: abandona antes os palácios opulentos do que as humildes choupanas. Demais, entre os que trilham no mundo, há muitos Cristóvãos de Moura, que encobrem a tibieza dos seus princípios com o manto de ideias avançadas e liberais». - «É preciso que as associações dos indivíduos precedam a associação dos povos, sob pena de não ser esta associação mais do que liga das nações fortes contra as fracas, ou antes a coalisão dos ricos, contra os pobres de todas as nações».
Ou, então; como quando comenta: «O comunismo nega o indivíduo, a família; é portanto uma quimera; mas uma quimera sublime e generosa. O comunismo é o sacrifício e a abnegação. Os detractores do comunismo são semelhantes aos judeus que cuspiram na face de Jesus». - «O comunismo e a propriedade, isto é, o estado e a família são igualmente necessários; e os espíritos eminentes do tempo presente reconhecem a necessidade de os conciliar um com o outro na organização social».
Aqui está uma passagem curiosa, mas intrigante. Curiosa até pelo que ela encerra de crítica ao anarquismo de que Proudhon haveria de ser o grande mentor intelectual. Mas intrigante por não ser suficientemente explícita. A que «espíritos eminentes do tempo presente» se refere ele? E porque razão não explicitou aqui melhor o seu pensamento?
Devemos ainda notar que o trabalho de Amorim Viana não nos parece que tenha obedecido a um plano fixo prèviamente estabelecido; se o teve, o desenvolvirnento da matéria foi-o alterando. O longo intervalo que por vezes se nota no prosseguimento da publicação dos seus artigos, se pode justificar-se pela dispersão provocada pela colaboração múltipla com que Viana preenchia as colunas da revista, não se explica apenas por essa razão, pois que, apesar de toda a preocupação que várias vezes denota em terminar a publicação da sua crítica antes de terminar o ano de 1852, o seu intento é frustrado, e só em Janeiro de 53 dá por terminado o seu trabalho, aliás sem nenhum tom conclusivo. Há uma sensação de reticência quando se acaba de ler a sua obra, o pensamento do autor não se desenvolve até às últimas consequências; se isso não foi devido a possíveis limitações exteriores, então foi porque a própria imprecisão da terminologia socialista do seu tempo o impediu de exprimir-se dum modo mais explícito.
6. Considerações finais
A mais de cem anos de distância, afigura-se-nos maravilhoso e surpreendente que tenha havido em Portugal, com ou sem conhecimento da refutação de Marx, quem tão lùcidamente se tenha abalançado a uma crítica penetrante do pensamento de Proudhon, este mesmo anatematizado e ainda mais por ser um autor mais velho e de maior audiência sobretudo nos países burgueses da Europa ocidental. Amorim Viana tomou com essa crítica uma posição do mais progressivo e avançado que havia para o seu tempo, não no sentido revolucionário, mas no plano do pensamento moderno.
Sucedeu isto, não o esqueçamos, no ano da graça de 1852.
É que, dezoito anos mais tarde, vamos enconttar a mais brilhante geração que em Portugal brotou no século XIX, aquela mesma que travou o combate espectacular e decisivo com a nossa mentalidade tradicional e retrógrada, vamos encontrá-la a introduzir entre nós o pensamento moderno pelo figurino de Proudhon: «Sob a influência de Antero – escreveu Eça de Queiroz - começámos a estudar Proudhon, quietos à banca, com os pés em capachos, como bons estudantes». Oliveira Martins é igualmente um proudhoniano. E quase todos os nossos doutrinadores socialistas depois de 1870 adoptam de Proudhon, a par da sua crítica ao pensamento tradicional, os malefícios do seu idealismo filosófico e do seu utopismo reformador.
É lástima que tal tenha sucedido depois de, precisamente neste país, ter sido produzida uma crítica tão objectiva e penetrante como foi a de Amorim Viana. Essa crítica ficou perdida nas páginas depressa esquecidas da revista portuense: a não ser o basbaque das nossas mentalidades provincianas perante a desenvoltura com que o autor tratou de problemas de tão candente modernidade, o seu estudo não produziu outros efeitos. Não chegou a ser assimilado pela inteligência portuguesa contemporânea. Viana foi um génio prematuro para a sociedade em que viveu, a influência do seu trabalho perdeu-se antes que tenham surgido homens preparados e amadurecidos para o compreender. De modo que, quando em 1870 o pensamento moderno foi introduzido em Portugal pela geração de Antero, um grande prejuízo resultou do desconhecimento da crítica amoriniana: é que foi adoptada então, com todas as inconsequências e utopias que continha, a doutrina económica e social de Proudhon, cujas contradições já tinham sido apontadas em Portugal dezoito anos mais cedo.
Explica-se talvez por esta razão, o motivo porque o pensamento moderno em Portugal de certo modo se frustrou. É sabido como o pensamento dessa pleiade ilustre de homens que nos deu a Geração de 1870 se finou em contradições que de certo modo justificam o nome por que muitos deles se designaram - Vencidos da Vida...
O proudhonismo, perniciosa e extemporâneamente introduzido na nossa mentalidade, acentuou aquela tendência para o idealismo, o utopismo e as demais formas abstractas de propensão lírica que já o sebastianismo imprimira à nossa constituição psíquica. A influência do proudhonismo exercida pelos nossos melhores espíritos sobre a mentalidade já propensa às utopias e às soluções transcendentes ao próprio esforço, talvez explique mesmo o caótico mental que tem caracterizado muito da nossa vida pública: é sabido como os entusiasmos fáceis ou as decepções profundas se sucedem, animados mais por certos ideólogos individualistas do que pelas massas geralmente realistas e orientadas por uma sensatez consequente.
Um retorno à posição amoriniana, realista e emanentista, ajudar-nos-á por certo, mais que todas as teorias dos nossos teóricos idealistas da decadência, a repor no caminho justo a orientação do pensamento moderno em Portugal, que agora pode iluminar-se à luz de teorias já sòlidamente estabelecidas e universalmente válidas.
(*) Victor de Sá (1921-2003) foi um homem especial, imbuído de uma missão humanística de democratização da cultura, sempre reprimida com sanha demencial pelo regime fascista e pelo meio social provinciano dominado pela reação clerical, na sua cidade de Braga. Frequentou o Liceu Nacional Sá de Miranda em Braga, onde foi presidente da associação de estudantes. É ainda enquanto estudante liceal que começa a escrever no ‘Correio do Minho’, no ‘Diário do Minho’ e a dedicar-se à bibliofilia. Concluídos os estudos secundários, empregou-se numa livraria da cidade, foi dirigente sindical dos caixeiros e animou diversas iniciativas culturais. Entre 1942 e 1950 foi absorvido pela experiência da sua Biblioteca Móvel, de que deixou ampla reflexão. Finalmente montou de raiz a sua própria Livraria Victor, à Rua dos Capelistas. Tudo isso ainda nos anos 1940, de permeio com os prováveis primeiros contatos clandestinos com o Partido Comunista Português (a que só aderiria formalmente em 1979), a participação nas atividades do MUNAF e do MUD Juvenil, a extensa colaboração na imprensa regional e o aparecimento do seu primeiro livro ('A mocidade de Antero', 1942), apadrinhado por Agostinho da Silva. Começou então o longo rol de perseguições de que foi alvo, que se saldaria finalmente por oito prisões (algumas por diversos meses), a proibição total de lecionar no ensino público, apreensões incontáveis, entre muitas outras provocações. Nunca se detendo nem intimidando, participou sempre no núcleo central da oposição minhota, naquilo que mais tarde viria a ser conhecido como o grupo dos "democratas de Braga" (com Salgado Zenha, numa primeira fase, Armando Bacelar, Flávio Martins, Lino Lima, Emídio Guerreiro, Eduardo Ribeiro, Humberto Soeiro, Santos Simões, entre muitos outros). A Livraria Victor, também conhecida como Centro Cultural do Minho, era um centro irradiador de cultura e inconformismo cívico, tendo o seu dono publicado então, com a sua chancela (na coleção ‘Cultura e Acção’), muitas das suas intervenções, estudos, inquéritos e reflexões: ‘O que foi a biblioteca móvel’ (1954), ‘O que é a UNESCO’ (1955), ‘As bibliotecas, o público e a cultura’ (1956), ‘Problemas da mentalidade’ (1957), ‘Sociedade e cultura’ (1958), ‘História e actualidade’ (1961), ‘Cultura e democracia’ (1961), entre outros. Em 1959 concluiu a sua licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, com uma tese sobre o filósofo Pedro de Amorim Viana. Concorreu e obteve um lugar na Escota Técnica de Braga, com nomeação publicada no diário oficial, mas a sua tomada de posse nunca foi autorizada. Em 1963, com uma bolsa da Fundação Gulbenkian, parte para Paris, onde se manteve até 1969, trabalhando com os professores Léon Bourdon, Albert Silbert e Pierre Vilar. Conclui aí o seu doutoramento na Sorbonne com uma tese intitulada 'A crise do liberalismo e as primeiras manifestações das ideias socialistas em Portugal (1820-1852)', cuja tradução portuguesa seria publicada pela Seara Nova (1969). A sua bibliografia, por então, já tinha sido enriquecida com diversas obras sobre o liberalismo e os anos novecentos, que viriam a ser a sua área privilegiada de investigação: 'Amorim Viana e Proudhon' (Seara Nova, 1960), 'Antero de Quental', (ed. do autor, 1963), 'Perspectivas do século XIX’ (Portugália, 1964), 'A Revolução de Setembro de 1836' (Dom Quixote, 1969). É preso logo à sua chegada a Portugal e o seu título académico nunca seria reconhecido no tempo da "primavera" marcelista. Nesse ano de 1969 é mesmo proibido de se candidatar a deputado nas listas da CDE. O seu opúsculo ‘Regressar para quê?’ (1970) é apreendido pela PIDE na própria semana em que é publicado. Foi só depois de Abril de 1974 que pôde iniciar uma carreira docente na Faculdade de Letras do Porto (História Contemporânea de Portugal), onde se jubilaria em 1991. Nos anos seguintes lecionou na Universidade Lusófona de Lisboa, onde criou o que é hoje a Biblioteca Universitária Victor de Sá. Deu também um contributo decisivo para a criação do Centro de História da Universidade do Porto, com a reunião de uma biblioteca especializada. Foi ainda professor requisitado na Universidade do Minho (Sociedade e Cultura Portuguesa) e diretor do semanário ‘Correio do Minho’. Eleito por duas vezes, pela Aliança Povo Unido (APU), por um breve período, no início dos anos 1980, exerceu o mandato de deputado à Assembleia da República, tendo sido presidente da Comissão Cultura e Ambiente. Uma prolongada doença debilitou sensivelmente as suas capacidades de trabalho a partir dessa altura. Entre outros títulos, publicou, já em democracia: ‘A história em discussão’ (Lisboa, 1975), ‘Repensar Portugal. Reflexões sobre o colonialismo e a descolonização’ (Lisboa, 1977), ‘Formação do movimento operário português’ (Centelha, 1978), ‘No mar do futuro’ (Livros Horizonte, 1980), ‘Época contemporânea portuguesa’ (Livros Horizonte, 1981), ‘Liberais e republicanos’ (Livros Horizonte, 1986), ‘Instauração do liberalismo em Portugal’ (Livros Horizonte, 1987), ‘Roteiro da imprensa operária e sindical (1836-1986)’ (Caminho, 1991), ‘Lisboa no liberalismo’ (Livros Horizonte, 1992).
O ensaio ‘Amorim Viana e Proudhon’, de que aqui publicamos a segunda parte, constituiu o miolo da tese de licenciatura apresentada em 1959 na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Obteria o Prémio Rodrigues Sampaio em 1959 e o Prémio Francisco A. Correia em 1960, sendo nesse mesmo ano publicado em volume pela Seara Nova. O autor publicou ainda, nesse ano, ‘Amorim Viana - ensaio biobibliográfico', com prefácio do Prof. Vieira de Almeida. Anos mais tarde, incluído no seu volume ‘Perspectivas do século XIX’, sairia a público o ensaio ‘Aspectos sociológicos em Amorim Viana’, que aproximava o pensamento social do filósofo português do de Saint-Simon. A tese de que a Geração de 70, com o seu proudhonismo serôdio, operou um retrocesso inteletual em relação à sua antecessora de 1852, deu lugar a um animado debate, em que intervieram Flausino Torres, Armando Bacelar, Hernâni Cidade e, um pouco mais tarde, Carlos da Fonseca..
_______________ NOTAS:
(1) [Nota de O Comuneiro] Publicamos aqui apenas a segunda e última parte do estudo ‘Amorim Viana e Proudhon’. A primeira parte faz uma longa exposição da crítica feita a este livro de Proudhon, em 1852, pelo filósofo português nas páginas da revista ‘A Península’.
(2) Nota bibliográfica - Só posteriormente foi traduzida para alemão por Bernstein e Kautsky e publicada em 1885 pela livraria do Partido Social Democrata da Alemanha, com um prefácio de Engels. Uma 2.ª edição francesa apareceu só muito mais tarde, em 1898 (Paris, Giard et Brière) e uma 3.ª em 1908. Em 1946, as Éditions Sociales da capital francesa promoveram nova edição que coincidiu com o centenário da sua primitiva redacção. No mesmo ano, a Editora Flama, de S. Paulo, publicou essa obra em língua portuguesa, com tradução e introdução de Miguel Macedo.
(3) Joaquim de Carvalho - História do Regime Republicano em Portugal.
(4) Joaquim de Carvalho - História de Portugal (Barcelos) - vol. VIl.
(5) O Visconde de Almeida Garrett.
(6) Lúcio de Azevedo - Épocas de Portugal Económico.
(7) Armando Castro - Significado histórico da obra de Mouzinho da Silveira.
(8) Carneiro de Moura - O Século XIX em Portugal.
(9) Joaquim de Carvalho - História do Regime Republicano em Portugal.
(10) Joel Serrão - Temas Oitocentistas.
(11) António José Saraiva - Herculano Desconhecido.
(12) «Da agitação de 1848 só resta de concreto, como conquista definitiva, a fundação do mutualismo e um esboço tímido de associacionismo proletário, o qual, iniciando-se em 1850 vem a consolidar-se em 1853 no Centro Promotor das Classes Laboriosas, de que é principal ordenador Sousa Brandão, que fundara, com Lopes de Mendonça e Vieira da Silva o Eco dos Operários». - Lopes d'Oliveira - História da República Portuguesa.
(13) Cónego Ferreira Pinto - Uma Escola em França.
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