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As teses de Althusser (*)
Jofre Amaral Nogueira
A obra de Marx, elaborada no decurso duma vida inteira de estudo, de apaixonada reflexão e de constante interferência na vida política do seu tempo, ainda hoje se mantém sob a focagem de múltiplas discussões e interpretações. A sua problemática e a sua doutrina, frequentemente consideradas por diversos críticos e adversários como postas de parte pela análise científica ou filosófica, retornam sempre ao primeiro plano das preocupações doutrinárias neste nosso século. Versões, ampliações ou remodelações do seu sistema vão surgindo desde Kautsky a Labriola, de Lenine a Mao-Tse-Tung, de Rosa Luxemburgo a Gramsci, de Plekhanov a Lukacs, de Marcuse a Sartre. Filósofos, cientistas e políticos reclamam-se dele, haurindo nos seus escritos ideias e métodos para pensar o mundo, para pensar a sociedade em que vivemos, para pensar as transformações que nela nos cumpre promover. Todavia, o que poderá chamar-se o sistema marxista não é fácil de fixar quanto aos pormenores, ou mesmo, quanto a aspectos fundamentais. Marx apenas o esboçou nas suas obras, sendo muitas as lacunas que ficaram por preencher O próprio O Capital, em que trabalhou durante trinta anos, ficou incompleto. Ao longo da sua vida, por outro lado, verificou-se uma incessante tensão teórica criadora, em que as opiniões se vão formando ou transformando, o que necessariamente gerou certos desfasamentos entre as teses expressas (ou o modo como as expressou) nas diferentes fases da sua evolução mental. Finalmente, desde a data da sua morte (1883) até aos nossos dias, muitas mudanças se operaram, surgiram realidades novas que ele não teve, portanto, ensejo de considerar, houve notáveis desenvolvimentos das técnicas, da ciência e do conhecimento em geral.
Tudo isso justificaria de sobejo — mesmo que outros motivos não existissem, sobremodo os que se prendem com a luta política — a pluralidade de interpretações e de revisões a que a obra de Marx vem sendo submetida. Se atentarmos um pouco no que até agora se fez ou tentou fazer, veremos que aí se desenham três tendências fundamentais que, por vezes, se misturam. Consiste a primeira numa exegese dos textos marxistas em ordem a extrair deles o que se intitularia o «verdadeiro» marxismo. E o mais importante problema que se depara a quantos enveredam por tal caminho é o da conjugação (ou da diferenciação) entre os Manuscritos de 1844 e as últimas obras: Fundamentos da Crítica da Economia Política, Contribuição à Critica da Economia Política e O Capital.
Visa a segunda tendência o preenchimento dos vazios teóricos da obra de Marx, quer através duma análise marxista dos assuntos não abordados por ele, quer pela abordagem de novas realidades surgidas após a sua morte, quer por um trabalho de sistematização completa das suas doutrinas de maneira a transformá-las numa concepção do mundo e da vida integral. Corresponderia isto, por outras palavras, a completar a elaboração do materialismo dialéctico e do materialismo histórico e a formular também uma Lógica, uma Estética e uma Moral. Podemos inscrever ainda nesta tendência as obras de Lenine, de Trotsky, de Estaline e de Mao-Tse-Tung, voltadas, como se sabe, para a análise da realidade político-social.
A terceira tendência é a dos que entendem que as análises de Marx e algumas das suas conclusões enfermam de erros ou carências, embora haja que manter o sentido e o critério que as caracterizou. Pretendem esses que, à luz do que se conservará válido no marxismo, se reexaminem os problemas, incluídos os que surgiram da ulterior evolução do mundo ou da ciência, para se acertarem as conclusões, substituindo o marxismo histórico de Marx por um marxismo actualizado. Foi o caso de Fritz Sternberg (Der Imperialismus, Berlim, 1926) que, partindo duma reanálise da economia capitalista, previu, sob o imperialismo, um longo período de desenvolvimento económico com real melhoria da situação da classe operária nos países mais industrializados e o aparecimento dum «espaço sociológico do reformismo». É também o caso de Marcuse que, fundado no que lhe parece a evolução posterior da realidade social, rejeita principalmente as teses respeitantes à pauperização da classe operária, ao desaparecimento das classes médias e à função revolucionária do proletariado.
Trata-se, como é óbvio, de direcções típicas ou de componentes ideais das revisões do marxismo. Na prática todos os casos concretos representam a conjugação dessas três tendências em doses variáveis de cada uma. E diferem outrossim quer os sectores teóricos que cada um julga dever completar, quer a colecção de factos novos que se pensa dever incluir no campo de análise, quer os princípios ou conclusões de Marx que se acham ainda válidas. Henri Lefèbvre, por exemplo, indica a necessidade de encarar as questões seguintes: «Qual é a importância da demografia como ciência? O surto demográfico não constitui um determinismo específico? Porquê? Como? Onde conduzirá a sociedade actual? Quais são as consequências longínquas da automatação? Que pensar duma cibernetização da sociedade? Que pensar da terrível contradição que vota o campesinato ao desaparecimento com a industrialização da agricultura, quando existe ainda uma maioria de camponeses no mundo? Que dizer do fim da cidade — da urbe — quando a aglomeração urbana cresce até romper as formas conhecidas de vida citadina?» (1). Para Garaudy, por sua vez, o problema central é que «existe, em todos os países economicamente avançados, uma justaposição das consequências antigas da revolução industrial, que determinam ainda no essencial o perfil da vida, e consequências da nova revolução científica e técnica que começa a revolucionar todos os aspectos da vida» (2).
As teses de Althusser foram expressas na colectânea de artigos reunidos em Pour Marx (Paris, 1966) e na obra colectiva intitulada Lire le Capital (3). A sua «leitura» (como ele a intitula) liga-se à primeira das tendências a que nos referimos atrás, isto é, constitui uma revisão ou exegese dos textos marxistas no sentido de estabelecer qual a verdadeira natureza da doutrina formulada em definitivo pelo seu autor. Os resultados a que chega podem ordenar-se em torno de duas questões, embora interdependentes: uma determinada concepção do devir do pensamento de Marx; uma determinada lição tirada da análise do «discurso científico» que forma O Capital. Convirá resumi-las objectivamente para que possamos analisá-las em termos de mais fácil entendimento dos problemas que levantam e das objecções que provocaram. E teremos já em conta as observações que o próprio Althusser faz, no prefácio da segunda edição do último daqueles livros, quer sobre o não-estruturalismo da sua posição, quer sobre a rejeição de dois aspectos da doutrina anteriormente defendida.
Althusser considera a evolução de Marx caracterizada por quatro fases ou momentos distintos: a primeira vai de 1840 a 1844, correspondendo aos textos desde a sua dissertação de doutoramento (Epicuro) até aos Manuscritos de 1844 e à Santa Família; refere-se a segunda a 1845, respeitando às Teses sobre Feuerbach e à Ideologia Alemã, sendo nesta altura que se teria dado a mutação da problemática marxista, com o que designa, à maneira do estruturalismo, como um «corte» ou «ruptura» epistemológica; a terceira vai de 1845 a 1857, com a publicação do Manifesto Comunista, da Miséria da Filosofia e Salários, Preços e Lucros, tendo sido a fase da maturação da nova problemática e novas concepções de Marx; a quarta — época da maturidade — inicia-se com os primeiros trabalhos de preparação de O Capital. A primeira fase, ou fase da juventude, ainda se dividiria em dois períodos: primeiro, aquele em que Marx teria adoptado uma posição kantiana-fichteana (em lugar da posição hegeliana que se lhe atribui vulgarmente); segundo, o que decorreu sob a influência de Feuerbach (4).
Toda esta periodização tem como fulcro aquele conceito de «corte epistemológico» — nós chamar-lhe-íamos antes uma mutação epistemológica — que se teria operado em 1845 com as Teses e a Ideologia Alemã, até certo ponto corroborada pela afirmação do próprio Marx de que a última destas obras representara a «liquidação da nossa consciência de outrora». Esta «nossa consciência de outrora» (de Marx e Engels) seria a sua consciência filosófica da fase juvenil, em que «conhecer a essência das coisas, a essência do mundo histórico humano, as suas produções económicas, estéticas e religiosas, é perfeitamente ler (lesen, herauslesen) com todas as letras a presença da essência abstracta na transparência da sua existência concreta» (5). É a fase antropológica e ideológica, em que teriam predominado ainda a dialéctica hegeliana, a doutrina da alienação, uma concepção humanista do socialismo, talvez um historicismo.
Com a mutação epistemológica de 1845 toda a problemática do marxismo se transforma. O plano ideológico em que Marx se colocara é abandonado e abre-se diante dele toda uma perspectiva verdadeiramente científica, que passará a estruturar, daí em diante, a sua investigação e a sua doutrinação. Assim se explicaria a X das Teses sobre Feuerbach, que proclama o fim da Filosofia, ao afirmar que os filósofos se têm limitado a interpretar o mundo e que se trata agora de transformá-lo. «O vazio filosófico que sucede ao anunciado na tese XI é, portanto, — escreve Althusser — o nascer de um trabalho intenso, longo e penoso, que constrói uma ciência sem precedentes, na qual Marx vai consumir toda a sua vida até aos últimos rascunhos de O Capital, que nunca poderá acabar. É este desenvolver de uma ciência que representa a primeira razão profunda pela qual a tese XI, ainda que anunciasse profeticamente um acontecimento capaz de marcar a filosofia, não podia dar lugar a uma filosofia, antes devia proclamar a supressão radical de toda a filosofia existente, para pôr em primeiro plano o trabalho de gestação teórica da descoberta científica de Marx» (6).
Nem Marx, todavia, teorizou os princípios e os métodos a que passou a obedecer ou começou a utilizar, nem teve plena consciência da transformação que se operara, nem encontrou os novos conceitos que exprimissem cabalmente toda a nova situação conceptual em que agiu a partir daí. Por isso, continua a utilizar os conceitos da sua fase ideológica, embora carregados de significações diferentes, como foi o caso da inversão da dialéctica hegeliana, que nunca esclareceu em que teria consistido ao certo. Em consequência, na falta dessa teorização, teríamos de deduzir os novos princípios e métodos de Marx, não do que ele disse, mas do que ele não disse — das falhas que se verificam nos seus textos —, melhor, do modo como procedeu nas análises subsequentes e do que se encontra implícito nesse procedimento. Essa a razão de uma leitura «sintomática» («symptomale») do texto que corresponde plenamente à maturidade de Marx, ou seja, O Capital. É a essa leitura que Althusser procede, com alguns colaboradores, no seu segundo livro, leitura que viria confirmar a sua tese sobre a evolução do marxismo, embora ele próprio insista em que se trata apenas dum começo de investigação.
A «leitura» althusseriana divide-a o autor em dois momentos. «Num primeiro momento — afirma — interrogámos os textos em que Marx nos indica a sua própria descoberta, e isolámos os conceitos de valor e de mais-valia como portadores desta descoberta. Tivemos, contudo, de notar que estes conceitos eram precisamente o lugar do mal-entendido, não somente dos economistas, mas também de numerosos marxistas acerca do objecto próprio da teoria marxista da economia política». E acrescenta: «Nós interrogámos então, num segundo momento, Marx através do juízo que ele próprio formulou sobre os seus predecessores, os fundadores da Economia Política clássica, esperando apreendê-lo a ele mesmo no juízo que faz da sua pré-história científica. Também aí topámos com definições desconcertantes ou insuficientes. Vimos que Marx não consegue pensar verdadeiramente o conteúdo da diferença que o distingue da Economia clássica, e que, por pensá-la em termos de continuidade de conteúdo, ele nos lança ou numa simples distinção de forma, a dialéctica, ou no fundamento dessa dialéctica hegeliana, ou numa certa concepção ideológica de História» (7).
Levando, contudo, mais longe essa análise, Althusser conclui que o fundamento da crítica radical a que Marx submete a Economia clássica «é que o seu objecto não existe por si mesmo, não é o objecto do seu conceito ou o seu conceito é o conceito dum objecto inadequado», é «que a Economia clássica não pode pensar os factos económicos como pertencendo ao espaço homogéneo da sua positividade e da sua mensurabilidade, a não ser com a condição duma «antropologia ingénua» que fundamenta, nos sujeitos económicos e suas necessidades, todos os actos pelos quais são produzidos, repartidos, recebidos e consumidos os objectos económicos» (8). Por detrás das categorias económicas tradicionais (valor, moeda, preços, etc.) estão as relações de produção entre os homens, portanto, os próprios homens. «É a necessidade (do ser humano) que define o económico da Economia. O dado do campo homogéneo dos fenómenos económicos é-nos dado por isso como económico por esta antropologia silenciosa» e não analisada, que cumpre pôr em evidência, cujos títulos de crédito deveremos examinar, e que, de qualquer modo, transfere para outro campo do conhecimento o verdadeiro objecto da Economia, pois esta não poderá existir por si própria e terá de conceber-se como «uma região subordinada da teoria da História» (9).
Estaria isto de acordo com o que Marx escreveu na Miséria da Filosofia: «Os economistas exprimem as relações da produção burguesa, a divisão do trabalho, o crédito, a moeda, como categorias fixas, eternas, imutáveis… Os economistas explicam-nos como se produz dentro destas relações dadas, mas o que eles não nos explicam é como essas relações se produzem, ou seja, o movimento histórico que as faz nascer» (10). Mas o conceito de História de Marx não corresponderá também ao da História empírica, antes se baseará na articulação sincrónica das estruturas dum todo social em cujo seio os diversos movimentos resultam das relações que entre eles mantêm os vários componentes da realidade total. Por isso, a análise da produção histórica das diferentes categorias económicas não se fará exteriormente a estas, mas de dentro delas, a partir das condições de evolução ou transformação inscritas nas próprias características que resultam do lugar que ocupam na «mecânica» do conjunto social a que pertencem. E será ainda dentro desta concepção de desenvolvimento histórico-económico-social que se situará a dialéctica de Marx, por completo transformada ao incluir-se numa problemática muito distante já da problemática hegeliana.
Se quisermos resumir ainda mais a evolução de Marx, de acordo com as teses de Althusser, poderemos dizer que, numa primeira fase, ele se encontrava ainda dominado, embora a contestasse nas suas conclusões, por uma filosofia que «repousava, em todos os seus domínios e desenvolvimentos (“teoria do conhecimento”, concepção da história, economia política, moral, estética, etc.) sobre urna problemática da natureza humana (ou da essência do homem)» (11). A segunda fase corresponde à formação «duma teoria da história e da política fundada sobre conceitos radicalmente novos: conceitos de formação social, forças produtivas, relações de produção, superstrutura, ideologias, determinação em última instância pela economia, determinação específica dos outros níveis, etc.» (12).
E não parece haver desacordo, entre os exegetas de Marx, quanto a tal facto. Marcuse, por exemplo, escreveu: «A passagem de Hegel a Marx é, a todos os respeitos, a passagem a uma ordem de verdade essencialmente diferente, que não deve ser interpretada nas categorias da filosofia. Ver-se-á que todos os conceitos filosóficos da teoria marxista são, de facto, categorias sociais e económicas, enquanto que as categorias sociais e económicas de Hegel eram todas conceitos filosóficos [...]. Todos os conceitos de Marx sem excepção têm um fundamento materialmente diferente, da mesma maneira que a nova teoria tem uma estrutura e um quadro conceptual novos que não derivam de maneira nenhuma de teorias anteriores. […] no hegelianismo, todas as categorias desembocam na ordem existente, enquanto que em Marx elas respeitam à negação dessa ordem; elas visam uma nova forma de sociedade quando descrevem as formas actuais desta» (13).
Onde reside a novidade da interpretação althusseriana não é, pois, nem na admissão dum desenvolvimento evolutivo do pensamento de Marx, nem na concepção das diferenças que a opõem à filosofia clássica alemã. Aquele desenvolvimento evolutivo concebem-no um Marcuse ou um Lefèbvre como um processo continuado de formação da doutrina marxista, cujas sucessivas fases se não opõem umas a outras, antes se prolongam as mais antigas nas mais recentes. Para Marcuse, «Mesmo os primeiros escritos de Marx não são filosóficos» (14), integrando-se já, por tanto, no que caracteriza o pensamento de Marx por oposição ao hegelianismo e à filosofia alemã de época. Para Henri Lefèbvre, «não há períodos no movimento que o pensamento marxista constitui por alargamentos sucessivos, por integração de elementos adquiridos, para um conjunto cada vez mais vasto, cada vez mais próximo da praxis e mais crítico». O marxismo representa, nesse aspecto, um «combate revolucionário para arrancar à enorme massa do hegelianismo, edifício simbólico da sociedade existente, da sua realidade e da sua idealidade, das suas relações sociais e do seu Estado, os materiais e meios «espirituais» indispensáveis à renovação total. Esta luta […] começa com a vida intelectual e política de Marx» (15).
Althusser, por sua vez, admite um «corte» epistemológico, uma verdadeira mutação de problemática, em tais condições que os sistemas que definem as duas fases separadas por tal corte são por completo diversos. E em virtude desta diversidade radical, os conceitos fundamentais da fase juvenil de Marx tornam-se inteiramente descabidos na sua fase adulta. A esta tese opõem os seus contraditores dois factos: o primeiro consiste em se encontrarem já nos escritos anteriores a 1845 algumas das intuições básicas que serão desenvolvidas n’O Capital ou nos Fundamentos; o segundo é o de continuarem a aparecer nestas duas obras muitas das ideias que caracterizam a primeira fase, segundo o próprio Althusser.
Nenhum desses factos, na verdade, passou despercebido ao principal autor do Lire le Capital. Ele observa, por exemplo, que nos Manuscritos de 1844 «nos encontramos, à primeira vista, em terreno conhecido, ou seja, numa paisagem conceptual em que podemos identificar a propriedade privada, o capital, o dinheiro, a divisão do trabalho, a alienação do trabalhador, a sua emancipação, e o humanismo que é o seu futuro prometido» e que são todas «as categorias, ou quase, que reencontraremos n’O Capital, e que nós poderíamos a tal título aceitar como antecipações de O Capital» (16). Mas acrescenta que tudo isso tem ainda um carácter filosófico, que se baseia numa concepção de «essência humana». Admite, por outro lado, que figuram n’O Capital muitos dos conceitos dessa fase antropológica, mas entende que Marx exprimia por intermédio deles ideias novas, que não poderia traduzir de outro modo, em virtude de não haver ainda elaborado os novos conceitos que lhe corresponderiam Seria «as vicissitudes dum drama real, onde antigos conceitos preenchem desesperadamente o papel dum ausente, que não tem nome, para chamá-lo em pessoa à cena, — embora não lhe «produzam» a presença senão nas suas falhas, no desfasamento entre as personagens e os papéis» (17). De resto, mesmo que dos mesmos conceitos se tratasse, seriam eles ainda os mesmos, ao inserirem-se num sistema conceptual diverso, ou tornar-se-iam diferentes ao receber uma realidade diferente do novo sistema a que ficaram pertencendo?
O problema, ao que nos quer parecer, está sobretudo no concreto exame dos casos concretos de conceitos que, na chamada primeira fase, prenunciam as teses d’O Capital ou continuam a ser utilizados nas obras da segunda fase. Althusser, além disso, pratica aqui uma verdadeira petição de princípio, pois serve-se da sua concepção de fractura epistemológica para resolver as dificuldades de objecções feitas acerca dela, dando assim como provado aquilo mesmo que pretende provar. Mais uma razão essa para procedermos àquele exame. Podemos servir-nos, para já, de alguns dos exemplos referidos por Cesare Luporini.
Numa carta de Marx a Feuerbach, de 11-8-1844, na qual o primeiro comenta com aplauso um dos livros do segundo, escreve ele: «A unidade do homem com o homem, fundada na diferença real, o conceito do género humano descido do céu da abstracção para a terra da realidade, que é senão o conceito de sociedade?». Ser-nos-á permitido, perante isto, considerar a primeira fase do autor da carta ainda como uma fase antropológica, dominada pelo conceito duma essência humana, dum homem abstracto, como convém à teoria do «corte» epistemológico? Veja-se esta passagem dos Manuscritos de 1844: «Por trabalho alienado o homem não engendra portanto apenas a sua relação com o objecto e o acto de produção como potências estrangeiras e que lhe são hostis; ele engendra também a relação na qual outros homens se encontram perante a sua produção e o seu produto e a relação na qual se encontram perante os outros homens» (18). Não será esta já uma das teorias essenciais d’O Capital, precisamente o que serve de esteio a Althusser para teorizar a posição de Marx em face da Economia clássica?
Outra série de textos dos Fundamentos ou de O Capital, em que se mostra a continuidade, na fase madura do marxismo, de conceitos que Althusser considera da fase juvenil e deslocados nas concepções finais de Marx, é recordada por Ernest Mandel no seu magnífico trabalho sobre «A Formação do Pensamento Económico de Marx». Vejamos, por exemplo, o caso da alienação, a que O Capital se refere nos seguintes termos, insusceptíveis (na nossa opinião) de poderem interpretar-se como utilização de conceitos inadequados, à falta de outros melhores: «Vimos na quarta parte, por ocasião da análise da produção da mais-valia relativa: no seio do sistema capitalista, todos os métodos de aumento da produtividade social do trabalho se realizam à custa do operário individual: todos os meios para desenvolver a produção se transformam em meios para dominar e explorar o produtor, mutilam o operário num homem parcial, degradam-no ao estado de anexo da máquina, destroem o conteúdo do seu trabalho em consequência do tormento deste, alienam (entfremden) as potências espirituais do processo do trabalho, na mesma medida em que a ciência é integrada como potência autónoma nesse processo» (19). É precisamente uma das noções que Althusser considera como ideológica e que se afirma em condições que não poderemos classificar de espúrias relativamente à lógica interna da obra em que se insere.
Conclui Mandel, após examinar os argumentos de quantos pretendem encontrar uma cisão completa entre as obras juvenis e adultas de Marx: «o que todos estes escritores deixam de compreender é que o Marx dos Manuscritos de 1844, mesmo não tendo ainda desenvolvido plenamente a teoria do materialismo histórico, superou Hegel, não raciocina mais com ideias absolutas ou conceitos filosóficos, mas procura criar uma ideologia determinada (a Economia Política) com a ajuda de contradições sociais reais empiricamente constatadas. Eles confundem o objecto das suas pesquisas e preocupações com os instrumentos e a linguagem que ele emprega para atingir o seu objecto» (20). Poderemos acrescentar que a evolução do seu pensamento, não obstante todas as transformações que sofre com a abertura de novas perspectivas e novos campos de aplicação, se efectua no sentido de concretizarem-se e definirem-se algumas das orientações essenciais que, nos seus primeiros tempos, já o colocavam criticamente em face dum Hegel ou dum Feuerbach. A interpretação de Althusser, apesar do valor de muitas das passagens da sua «leitura» e do interesse de numerosas das suas observações, afigura-se-nos forçada, por demasiado presa ao conceito de corte epistemológico, no sentido que lhe deu Michel Foucault.
Outro senão da análise de Althusser é o plano em que ele coloca os problemas, com exclusão dos restantes. Efectivamente, ao considerar a obra de Marx dum ponto de vista apenas epistemológico, procurando determinar as condições teóricas a que obedeceu o discurso científico expresso n’O Capital, ele põe de lado dois aspectos fundamentais da actividade teórica do autor do Manifesto: a importância das conclusões a que ele chegou como realização dos objectivos das suas reflexões desde a sua primeira fase; a importância dessas mesmas conclusões na fundamentação da actividade política a que ele se entregava. Com efeito, poderemos admitir que as conclusões de O Capital não respondam aos mesmos objectivos políticos da crítica da ideologia alemã, a que Marx se entregara desde os seus primeiros momentos de pensador? Poderemos esquecer que a vitória de Marx, na análise da realidade económica do capitalismo, foi antes de tudo a de encontrar uma base científica para a revolução socialista? Não teria sido essa exactamente a grande revolução teórica de Marx?
Na análise de O Capital chega-se a uma conclusão sobre a natureza da sociedade capitalista. Encontram-se nela toda uma série de contradições de que resulta o evoluir e transformar dessa mesma sociedade. Não será essa uma verificação da dialéctica como motor do desenvolvimento histórico? Encontra-se aí a alienação dos trabalhadores. Não será esse um dos conceitos juvenis de Marx? Define--se a possibilidade de transformação social que permita desalienar os homens e construir um mundo de maior justiça. Não será essa a base do novo humanismo? Dificilmente se poderá manter a tese — consideradas as conclusões a que se chega durante o exame da sociedade capitalista — de que esse exame não corresponda, nos seus resultados a uma corporização das tendências e princípios gerados na reacção inicial de Marx contra a ideologia alemã do seu tempo. Parece inegável que, não obstante todas as mudanças sofridas pelo seu pensamento ao alargar as bases em que assentava e assumir formas mais concretas, a permanência das interrogações desde o início formuladas marca uma continuidade de problemática, bem oposta ao conceito de rotura que Althusser quis considerar fundamental. E essa continuidade de problemática resultou, antes de mais, da própria continuidade da posição política que Marx manteve desde que contactou com o socialismo e, encontrou nele uma resposta adequada às suas dúvidas e insatisfações de jovem hegeliano radical.
Certamente que Althusser não ignora o impacto da realidade exterior sobre o pensamento de Marx, pois escreve: «Esta dupla descoberta (a classe operária organizada — França — e o capitalismo desenvolvido — Inglaterra) é que desempenha o papel decisivo na evolução intelectual do jovem Marx: a descoberta, para lá da ideologia que a tinha deformado, da realidade de que ela falava, — e a descoberta, para lá da ideologia contemporânea que a ignorava, duma realidade nova» (21). Certamente que Engels compara, no prefácio ao segundo livro de O Capital, a descoberta do oxigénio pela Química flogística com a descoberta da mais-valia pela Economia clássica, dizendo que tais descobertas não trouxeram apenas «com que modificar num dos seus pontos a antiga teoria, mas com que revolucionar a química ou a economia inteiras» (22). Mas não é menos certo que nem Althusser deixou de se colocar num plano puramente epistemológico na análise da evolução de Marx, nem Engels, ao considerar a revolução teórica marxista na crítica da Economia Política, a concebeu como uma revolução na filosofia global de Marx.
Esta concepção de «corte» epistemológico, como fulcro de toda a «leitura» althusseriana, não conduz apenas a uma radicalização peremptória e deformadora das diferenças entre as fases juvenil e madura do marxismo (concebidas em oposição absolutizada), mas também à oposição radical de alguns conceitos, tidos como representativos, uns, da primeira fase, e os outros da segunda fase. Uma dessas oposições seria a que se estabelece entre a ideologia e a ciência, consideradas como atitudes características do Marx dos Manuscritos e do Marx de O Capital, respectivamente. E essa oposição, pelo seu carácter eminentemente operatório, tem tido grande fortuna entre quantos fogem da complexidade dos problemas para se servirem dum critério fácil, embora vicioso, de julgamento das doutrinas. Com o que não fazem, de resto, senão imitar o procedimento de Althusser, que o atribui, por sua vez, ao próprio Marx.
Na verdade, a cisão entre as duas etapas do pensamento do autor de O Capital estaria por inteiro dentro desse contraste entre a posição ideológica que teria sido a sua até desembaraçar-se da ideologia alemã, e a atitude científica a que chegou durante a crítica da Economia clássica. Para Althusser, uma ideologia é «um sistema (possuindo a sua lógica e rigor próprios) de representações (imagens, mitos, ideias ou conceitos, segundo os casos) dotado duma existência e dum papel histórico no seio duma sociedade». Além disso, «a ideologia como sistema de representações distingue-se da ciência pelo facto de a acção prático-social prevalecer sobre a função teórica (ou função do conhecimento).» Por outro lado, a ideologia «é bem um sistema de representações; mas estas representações não têm na maior parte dos casos nada a ver com a “consciência”: são quase sempre imagens, algumas vezes conceitos, mas é antes de mais como estruturas que se impõem à grande maioria dos homens sem passar pela sua “consciência”» (o sublinhado é nosso) (23).
A ideologia opõe-se a ciência. Por isso, tudo quanto se não puder considerar como ciência terá de considerar-se como ideologia. Desse modo: «A filosofia, tal como a religião e a moral, é apenas ideologia, não tem história, tudo o que parece passar-se nela passa-se na realidade fora, na única história real, a da vida material dos homens. A ciência é então o próprio real, conhecido pelo acto que o revela destruindo as ideologias que o ocultam, e à frente dessas ideologias, a filosofia». Estipulado que a filosofia não possui portanto um verdadeiro objecto, conclui-se que é por isso mesmo que «nada se passa na filosofia», «enquanto que, com efeito, se alguma coisa se passa nas ciências é porque estas têm um objecto do qual podem aprofundar o conhecimento, o que lhe dá uma história». «A filosofia — acrescenta — apenas repete e rumina argumentos que, sob a forma de categorias, representam o seu conflito fundamental. É este seu conflito, inominável na filosofia, que sustenta a eternamente nula inversão de que a filosofia é o teatro retórico, a inversão do binómio categorial fundamental matéria-espírito» (24).
Só, portanto, a atitude científica poderá convir a quem pretenda estar em condições teóricas de agir adequadamente sobre a realidade, formulando acerca desta uma imagem correcta por que possa orientar-se uma prática eficaz. Por isso, «o marxismo devia ser não somente uma doutrina política, um “método” de análise e de acção, mas também, como ciência, o domínio teórico duma investigação fundamental, indispensável ao desenvolvimento não apenas da ciência das sociedades e das diversas «ciências humanas», mas também das ciências da natureza e da filosofia» (25). Será essa atitude científica que estará na base da rejeição do humanismo, um dos pontos mais discutidos da interpretação de Althusser. Contudo, toda uma série de problemas se levanta quando nos interrogamos se, com rigor, poderemos estabelecer uma diferença tão radical entre a ideologia e a ciência, se não temos de aceitar gradações duma e de outra até à existência duma zona de confusão entre ambas, se não haverá que considerá-las como conceitos-limites, representativos de dois modelos conceptuais que só podemos conceber em estado de pureza graças à abstracção. E tais perguntas, como veremos, não se confinam, na importância que revestem, ao simples aspecto teórico da questão.
Ao definir praticamente a ideologia como toda e qualquer formação teorética que não seja ciência, Althusser não conseguiu esclarecer dum modo positivo o que devemos entender por tal e suscitou alguns problemas graves. Também Marx não tinha analisado o fenómeno ideológico como historiador ou sociólogo, procurando caracterizá-lo nas suas variantes ou espécies, na sua formação ou produção social e no seu funcionamento como superstrutura. Limita-se a indicar algumas características que poderemos reduzir aos pontos seguintes: constituir um reflexo deformado ou invertido da realidade; fundar-se apenas numa parcela do real, embora generalizada ao todo; mascarar ou esconder os conflitos e contradições da vida social; servir a uma classe dominante para nos dar uma imagem da vida e da sociedade de acordo com o sistema engendrado segundo os seus interesses. O que caracterizará a ideologia e tornará tal qualquer sistema de representações seria, numa palavra, o facto de ser uma deformação interessada da realidade. De qualquer modo, porém, nem Marx, nem Engels, fizeram uma teorização sistemática das ideologias, limitando-se a referências de ocasião no decurso dos seus trabalhos. Poderemos mesmo supor que só consideraram a filosofia, a religião, a estética, a moral, como posições ideológicas, na medida em que nelas tivesse cabimento essa atitude deformadora interessada a que nos referimos.
Adam Schaff define a ideologia como «um sistema de opiniões que, fundindo-se sobre um sistema de valores admitidos, determina as atitudes e os comportamentos dos homens relativamente a objectivos desejados de desenvolvimento da sociedade, do grupo social ou do indivíduo» (26). Observa que, quando se opõe a ideologia à ciência, se parte geralmente, ou duma definição que se liga às tradições do jovem Marx, segundo a qual a ideologia é uma consciência falsificada, ou da diferença das estruturas características das proposições da ciência e das proposições consideradas próprias da ideologia. No primeiro caso, partir-se-ia exactamente daquilo que se pretende demonstrar, ou seja, o carácter falsificado da ideologia. No segundo caso, atribui-se às proposições científicas um carácter afirmativo, enquanto que as proposições ideológicas terão uma natureza valorativa e normativa. A isto objecta com razão, que também as técnicas industriais ou a medicina têm carácter normativo, embora não sejam ideológicas, e que, por outro lado, a ciência não se restringe à atitude afirmativa.
Parece-nos que um dos aspectos mais importantes da questão, todavia, deverá ser, em primeiro lugar, o do inventário das diferentes formas que pode tomar o pensamento ideológico. Não se nos afigura haver dúvidas de que ele assuma expressões de diverso jaez, desde a poesia, ao romance, à pintura, à religião, ao pensamento quotidiano, à propaganda de todas as espécies, à filosofia, etc.. Poderemos nós, por isso, classificar todas essas coisas, não obstante a sua variedade, como formas de ideologia, dividindo todo o pensamento realmente pensado entre essas duas exclusivas categorias que serão a ideologia e a ciência? Por exemplo, a proposição «amanhã vou a Lisboa» será ideológica por não ser científica? Será a proposição «peso setenta quilos» uma proposição científica por não ser ideológica? Com efeito, a extrema variedade e diferenciação do que não é ciência dificilmente permitirá que tudo englobemos num mesmo saco. E somos obrigados a reconhecer, tidas em conta as variedades de todos esses campos teóricos, que diferem bastante entre eles pela relação em que se encontram com a ciência, ou com aquilo que é hábito considerarmos como tal.
Poderemos legitimamente levantar também o problema inverso. O próprio Althusser reconhece que «não existe prática teórica pura, ciência completamente desnudada, que esteja para sempre, na sua história de ciência, preservada por não sei que providência das ameaças e contaminações do idealismo, ou seja, das ideologias que a cercam: nós sabemos que não existe ciência «pura» a não ser com a condição de a purificarmos sem cessar, ciência livre na necessidade da sua história, a não ser com a condição de a libertarmos sem cessar da ideologia que a ocupa, a domina e a espreita» (27). Mas não será isso precisamente ser obrigado a admitir a estreiteza da concepção que se forma do que seja a ciência? Poderemos imaginar esta sem o conjunto de hipóteses e teorias que determinam a sua problemática e nas quais se escondem não raro elementos ideológicos? Não se tem dado repetidamente o caso de não considerarmos científico o que anteriormente foi tido como tal? Classificaremos como ideológica a própria teoria da ciência?
A distinção feita por Althusser levanta ainda um outro problema, embora ele haja posto a questão exclusivamente no que chamou o campo da «prática teórica». Suponhamos que o marxismo seja, como o quer, o resultado duma investigação puramente científica. Suponhamos ainda que, em consequência do saber assim constituído acerca da sociedade, se concebe ou determina uma certa acção política. A concepção desta acção política — ainda como prática teórica — caberá dentro do campo da ciência ou da ideologia? O seu carácter valorativo, normativo, de classe (assim como todo o halo afectivo de que se rodeará um projecto desses), colocam-no dentro do que se chama ideologia. Considerando, porém, que seja uma atitude ideológica, não a deveremos pôr de parte por não ser científica e não condizer, por isso, com a realidade? Mas como classificá-la de ideológica se, por definição, ela condiz com a realidade? Se ela, por outras palavras, se situa na mesma posição perante a ciência que têm a técnica e a medicina, como lembrou Adam Schaff? Não podemos esquecer que toda a ciência pode constituir também uma consciência, relativamente à qual a prática teórica e a prática social se identificam e onde será muito difícil separar a ciência da ideologia, tais como as define Althusser.
As concepções defendidas em Pour Marx e Lire le Capital ligam-se em vários pontos com as do estruturalismo. É certo que, como esclarece o autor desses trabalhos, não podemos incluir a sua posição sob tal nome. Mas também é verdade que há pontos de contacto, mesmo para lá da terminologia, entre uma e outra doutrinas. Vamos encontrá-las, além de mais, no que se refere às questões do humanismo e da história. A distinção entre ideologia e ciência, como já dissemos, permite a Althusser considerar o humanismo como posição ideológica e, por isso, expurgar dele o marxismo na sua fase adulta. Entende-o, pelo contrário, como característico da fase juvenil de Marx e perfeitamente consentâneo com a atitude antropológica que então o teria caracterizado. Daqui resultam, por consequência, três problemas. O primeiro será o de decidir se o deveremos ter ou não como uma concepção ideológica. O segundo é o de saber se continua ou não a existir uma atitude humanista na fase de redacção de O Capital. O terceiro consiste em determinar se o possível humanismo da segunda fase de Marx tem algo a ver com o humanismo da primeira fase.
Mas examinemos antes disso, nas suas linhas gerais, a tese de Althusser. Teria começado Marx por adoptar um humanismo racionalista-liberal, mais próximo de Kant e de Fichte que de Hegel, em que a liberdade e a razão seriam a essência do homem, sendo a primeira a obediência à lei interior da segunda. Nessa etapa evolutiva, «A filosofia considera o Estado como o grande organismo em que a liberdade jurídica, moral e política deve ter a sua realização e em que cada cidadão, obedecendo às leis do Estado, não obedece senão às leis naturais da sua própria razão, da razão humana» (28). Numa segunda etapa, determinada pelas desilusões dos liberais com a actuação do Estado prussiano, Marx adoptará um ponto de vista baseado em Feuerbach: os abusos do Estado são concebidos como uma contradição real entre a sua essência (razão) e a sua existência (desrazão); a História será a transformação do homem verdadeiro em homem alienado; o humanismo será a desalienação do homem, a reintegração dele na sua verdadeira natureza ou essência (29).
Com o corte epistemológico de 1845 e a formação duma nova problemática, tudo se altera. «Esta revolução teórica total não possui o direito de recusar os antigos conceitos senão porque os substitui por conceitos novos». Além disso, para «compreender o que Marx traz de radicalmente novo, é preciso tomar consciência da novidade dos conceitos de materialismo histórico, e ainda da profundidade da revolução teórica que eles implicam e anunciam», Só assim será «possível definir o estatuto do humanismo: rejeitando as suas pretensões teóricas, e reconhecendo-lhe a sua função prática de ideologia». Transformado o marxismo numa ciência, ou seja, numa forma de conhecimento rigorosa, o humanismo não terá aí qualquer cabimento, segundo Althusser, porque um «anti--humanismo teórico» se torna «a condição de possibilidade absoluta (negativa) do conhecimento (positivo) do próprio mundo humano, e da sua transformação prática». Com efeito, não se «pode conhecer alguma coisa dos homens senão com a condição absoluta de reduzir a cinzas o mito filosófico (teórico) do homem» (30).
É essa, na verdade, uma tese já defendida por Michel Foucault em As Palavras e as Coisas, a de que no moderno discurso científico se verifica o «desaparecimento» do homem, pois aquela marcha epistemológica em que se partia do homem para o conhecimento dele mesmo, teria sido substituída por uma marcha em que as categorias económicas, sociais, biológicas, psicológicas, etc., servem de ponto de partida e estabelecem o âmbito da teorização científica. Seria já este o caso do marxismo, ao passar da atitude antropológica inicial ao estudo das categorias de valor, mais-valia, preços, moeda, renda, infra-estruturas, alienação do trabalhador, contradições entre as forças e as formas de produção e outras. Mas o desaparecimento do humanismo do campo científico não seria um aniquilamento total, visto que «o anti-humanismo teórico de Marx reconhece, pondo-o em relação com as suas condições de existência, unia necessidade ao humanismo como ideologia, uma necessidade condicionada». É que a «ideologia não é, portanto, uma aberração ou uma excrescência contingente da História, é uma estrutura essencial à vida histórica das sociedades» e apenas «a existência e o reconhecimento da sua necessidade podem permitir que se aja sobre a ideologia e que se transforme a ideologia em instrumento de acção reflectida sobre a História» (31).
Este reconhecimento do humanismo como uma atitude ideológica levanta, porém, grandes dificuldades Em primeiro lugar, há que ter em conta diversas espécies de humanismo, admitindo, ao contrário de Althusser, que nem todas constituam uma posição teórica antropológica, ou se baseiem, por outras palavras, na aceitação duma abstracta essência humana, nem mesmo numa concepção do homem constituída a partir duma análise directa (sem ser por intermédio da Economia, da Sociologia, da História) do próprio homem. Em nossa opinião podemos perfeitamente formular um humanismo baseado nessas disciplinas científicas que não tenha, por isso, aquele teor de essencialismo humano. Em segundo lugar, a classificação do humanismo como uma forma de ideologia, coloca de novo em questão todo o problema de como definir a ideologia e diferençá-la da ciência. De facto, aceitando que o humanismo, pelo seu carácter normativo seja ideológico, poderemos todavia acoimá-lo de deturpação ou deformação das realidades? Não será o humanismo, ao invés, quer no campo teórico, quer no campo da prática política, um discurso ou uma acção desmistificadores, desalienadores, contrários à manutenção dos factos e dos mitos que traduzem a exploração do homem pelo homem e, por isso, revolucionários? Poderemos neste caso (reconhecendo-Ihe tal acção transformadora adequada à verdadeira natureza dos fenómenos sociais) opô-lo a um conhecimento rigoroso dessa mesma natureza da realidade social?
Admite Althusser, como vimos, que «se transforme a ideologia em instrumento de acção reflectida sobre a História», ao reconhecer o humanismo como forma de ideologia. Mas o produto dessa transformação que será ele? Teremos de classificá-lo ainda como ideologia, considerá-lo-emos como ciência, ou incluí-lo-emos numa terceira categoria teórica? O problema é, de novo, o da distinção entre as duas, portanto, o do carácter forçado dessa dicotomia, dado que o humanismo já não-antropológico, a que nós nos referimos, será precisamente «um instrumento de acção reflectida sobre a História». Ora é este mesmo humanismo que Marx continua a adoptar na fase madura da sua evolução, depois de ter procedido àquela «revolução teórica total» que o teria eliminado do campo do conhecimento científico. Essa é também a opinião defendida por Raymond Aron: «A este humanismo Marx não renunciou nunca, apesar das afirmações contrárias dos althusserianos. Pelo contrário, verifica-se que Marx quis, em O Capital, dar uma forma científica a uma crítica que já não incide sobre o culto do dinheiro ou da produção, mas sobre a economia capitalista nos dois sentidos do termo: o próprio capitalismo e a interpretação que dele dão os economistas. Ora a junção da crítica humanista e da crítica científica opera-se no conceito de mais-valia» (32). E acrescenta o mesmo autor a seguinte e fundamental observação: «Crítico humanista, Marx escandaliza-se porque o trabalho se degrade em mercadoria; durante a fase científica, ele maravilha-se porque o capitalismo seja condenado à morte precisamente por tratar o trabalho como uma mercadoria».
Ë inegável que a fase juvenil de Marx revestiu uma forma antropológica e filosófica de que ele se desembaraçará na crítica da Economia clássica, após enveredar pelos caminhos do socialismo. Mas será difícil não reconhecer também que, muito embora enquadrado ainda no âmbito do pensamento filosófico da época, na atitude crítica que assume para com a ideologia vigente, se encontram já algumas das traves mestras da sua ulterior doutrina. Vimos atrás como, numa carta endereçada a Feuerbach, ele observava que o conceito de género humano mais não é do que o conceito de sociedade, o que está longe duma concepção de essência humana. Como escreve Mandel, acerca dos Manuscritos de 1844, trata-se «de uma transição, do jovem Marx, da filosofia hegeliana e feuerbachiana para a elaboração do materialismo histórico. Nessa transição, elementos do passado combinam-se, necessariamente, com elementos do futuro» (33). Pelo que respeita ao humanismo, a «viragem» epistemológica atribuída a Marx não pode mascarar o facto de toda a sua obra, do princípio até ao fim, estar por completo dominada pelo anseio de emancipação humana, fundamento indispensável e suficiente duma atitude humanista.
Escreveu Marx, na introdução de 1857 a O Capital: «Seria portanto impossível e falso dispor as categorias económicas pela ordem segundo a qual elas foram economicamente determinantes. A sua ordem é, pelo contrário, determinada pelo tipo de relação mútua que mantêm na sociedade burguesa moderna, e esta ordem é justamente o inverso do que parece ser a sua ordem natural ou do que corresponde à ordem do desenvolvimento histórico». Da análise deste texto tira Althusser as seguintes conclusões: «O objecto de estudo de Marx é, portanto, a sociedade burguesa actual, que é pensada como um resultado histórico: mas a inteligência desta sociedade, longe de passar pela teoria da génese desse resultado, passa, ao contrário, exclusivamente pela teoria do «corpo» ou seja, da estrutura actual da sociedade, sem que a sua génese aí intervenha seja para o que for». E esclarece: «o que Marx estuda n’O Capital é o mecanismo que dá a este produto da História, que é justamente o produto-sociedade que ele estuda, a propriedade de produzir o «efeito de sociedade», que faz existir este resultado como sociedade» (34).
Estamos, como atrás já se indicou, perante uma concepção não-empirista de História, de resto essencial para a compreensão do materialismo histórico. O problema liga-se de perto com aquele que o estruturalismo coloca a propósito da diacronia e sincronia. Foi Saussure quem mostrou, no plano de Linguística, a vantagem de tratar os fenómenos na sua interdependência, dentro do sistema que formam em certo momento, e só depois de conhecidas as estruturas desse sistema os encararmos na sua sucessão. Também as sociedades existem como sociedades por virtude duma conjugação de dependências entre os componentes do todo, em virtude duma orgânica ou arranjo funcional que as estabelece como um sistema dinâmico. A evolução dessa sociedade será fruto, antes de mais, desse sistema de interdependências que define o dinamismo peculiar do agregado. Althusser considera esta noção como característica e caracterizadora da teoria histórica de Marx e oposta à concepção historicista, por exemplo, dum Gramsci.
Não nos parece que tenha razão em definir desse modo a integral concepção de Marx, ou seja, o materialismo histórico. É preciso não esquecer o facto de o autor d’O Capital ser também o autor das notáveis monografias de história que são As Lutas de Classes em França (1850) e O Dezoito de Brumário de Luís Bonaparte (1852), que são exemplos vivos da sua maneira de conceber a História e se situam já depois do corte epistemológico (35). Poderíamos, de resto, considerar inteiramente válido como exemplo modelar da concepção marxista de História O Capital? Como caberia, no âmbito deste, o estudo das superstruturas e de todas as formas de vida colectiva que interferem no devir da sociedade, mas não são categorias económicas? Se Marx quisesse reduzir o processo de desenvolvimento dos povos ao jogo das interdependências daquelas categorias teria dito que elas são as determinantes dele «em última instância»? Não cairemos nós, com a sobrevalorização desse critério, até torná-lo todo o materialismo histórico, num mecanicismo?
Aceitamos como boa a opinião de Althusser quando diz que, «da mesma maneira que não há produção em geral, não há História em geral, mas estruturas específicas de historicidade, fundadas em última análise sobre as estruturas específicas dos diferentes modos de produção, estruturas específicas de historicidade que, não respeitando senão à existência de formações sociais determinadas (resultantes de modos de produção específicos), articuladas como todos, não têm sentido senão em função da essência dessas totalidades, ou seja, da essência da sua complexidade própria» (36). Mas pensamos que, ao longo da História, se produzem factos novos, que não podemos considerar inscritos antecipadamente nas estruturas ou produzidos por elas. As invenções, por exemplo, da máquina a vapor, dos motores de explosão, da propulsão por hélices, a descoberta da energia atómica, etc., não resultam necessariamente, nem de acontecimentos anteriores, nem do modo como se articulavam as forças sociais, muito embora se não pudessem produzir, quase sempre, sem determinadas descobertas prévias. Sem dúvida que, ao incorporarem-se entre as realidades colectivas entram no jogo já existente e se põem de acordo com ele. Mas esse acordo não é uma passiva aceitação por parte delas, pois podem também contribuir para o modificar, se a estrutura global é de molde a consenti-lo. É essa historicidade (o mesmo poderíamos dizer dos elementos ideológicos ou de outros) que não nos permite pensar toda a História exclusivamente a partir da análise económica ou apenas com métodos convenientes para esta. É isso que não nos permite pensar toda a História a partir duma análise sincrónica e apenas no âmbito dela, embora esta seja fundamental e corramos graves riscos de erro se não a tivermos em conta desde o início da investigação. É no fundo o problema que se põe nos nossos dias quando se recomenda que a análise das possibilidades de transformação ou de evolução da sociedade capitalista tenha em conta todos os factos novos resultantes de um progresso científico e tecnológico imensos, e da sua interferência na própria dinâmica do capitalismo.
O problema da História liga-se (ou devia ligar-se) ainda com outro problema tratado demoradamente por Althusser, que é o da dialéctica marxista. É conhecida a célebre frase em que Marx declara ter procedido à inversão da dialéctica hegeliana. Em que teria, porém, consistido ao certo essa inversão? Apenas em se transportar a dialéctica duma concepção idealista para uma concepção materialista? Não chegou Marx a dar-nos uma explicação clara do que teria sido essa inversão. Vê-se Althusser obrigado a procurá-la no modo como ele considerou concretamente o desenvolvimento da sociedade capitalista ou na prática política dos movimentos que se inspiram em Marx, aplicando a sua doutrina à transformação do mundo actual. Porém, de facto, — além da análise do conceito de História (que deveria ser, mas não é, porque inspirado pelo sincronismo dos estruturalistas, um estudo sobre a dialéctica concreta ou materialista) — o autor do Lire le Capital limita o seu exame à consideração da análise feita por Lenine às condições que permitiram a revolução russa, e ao estudo de Mao-Tse-Tung sobre a contradição, também relacionado com a prática política.
Mas o texto de Lenine pode, na verdade, ser considerado decisivo. Analisa ele a diversidade de contradições que tornaram possível a revolução de 1917 num país que, na opinião dos teóricos sociais-democratas, não estaria dentro das condições que Marx previra, ou seja, em situação de superdesenvolvimento do capitalismo. Teria havido uma acumulação delas: contradição entre os outros países imperialistas e a Rússia, seu aliado ou adversário na guerra, que era, pelo seu atraso social, o mais fraco elo da cadeia; contradição entre o carácter de alto capitalismo dum sector do capitalismo russo e o estado ainda feudal de grande parte da nação; contradições entre a alta, a média e a pequena burguesia; contradições entre as cidades e os campos; contradição entre não ter havido ainda uma revolução burguesa e já existirem condições para uma revolução proletária; contradições entre a autocracia e o liberalismo e entre estes e o socialismo. Seria desta acumulação de contradições que teria resultado uma situação revolucionária, na medida em que todas elas se teriam fundido e exprimido através duma contradição dominante, capaz de arrastar para a acção as grandes massas populacionais. O texto de Mao-Tse-Tung, por sua vez, insiste sobre a existência de várias contradições (uma contradição principal e outras secundárias), admite aspectos principais e aspectos secundários na contradição principal, formula a doutrina da possibilidade de transferência do carácter dominante das contradições de umas para outras ao longo do processo evolutivo, embora a dominância privilegiada acabe sempre por recair numa delas.
Baseando-se nestas análises, Althusser conclui por uma interpretação da dialéctica marxista cujas principais características se encontram expressas nos seguintes textos:
a) — «É dizer que as “diferenças” que constituem cada uma das instâncias em jogo (e que se manifestam nesta “acumulação” de que fala Lenine), se elas se “fundem” numa unidade real, não se “dissipam” como um puro fenómeno na unidade interior duma contradição simples. A unidade que elas constituem nesta “fusão” da ruptura revolucionária, constituem-na com a essência e eficácia próprias, a partir do que elas são, segundo as modalidades específicas da sua acção»;
b) — «a contradição é inseparável da estrutura do corpo social no seu conjunto, no qual se exerce, inseparável das suas condições formais de existência, e das próprias instâncias que governa, que ela é pois, em si mesma, afectada por elas, determinante mas também determinada num só e único movimento, e determinada pelos diversos níveis e pelas diversas instâncias da formação social que anima»;
c) — «Este reflexo das condições de existência da contradição no interior de si mesmo, este reflexo da estrutura articulada na dominante que constitui a unidade de todo o complexo no interior de cada contradição, eis o traço mais profundo da dialéctica marxista, aquele que eu tentei apreender há pouco com o conceito de sobre-determinação» (37).
Embora esse conceito, tirado da psicanálise, não nos pareça ainda suficientemente claro, e já tenha sido sugerida a sua substituição pelo de «contradição dominante», parece-nos um bom ponto de partida para a teorização da dialéctica da História, desde que não esqueçamos que ele foi tirado de ocasiões críticas e excepcionais (ainda que reveladoras ou significativas) da evolução das sociedades. Em que poderá, contudo, tal conceito elucidar-nos sobre aquilo em que consistiu a inversão da dialéctica hegeliana por Marx? Utilizando um texto de Engels a que já nos referimos, a respeito da revolução da problemática marxista com o aproveitamento de todas as consequências implícitas na descoberta da mais-valia, Althusser entende que aquela inversão consistirá no resultado da adaptação da dialéctica à nova problemática, a qual seria, por isso, uma consequência do corte epistemológico que constitui todo o fulcro das suas teses. Não nos parece contestável que, na verdade, a dialéctica marxista — na medida em que a podemos entender por já elaborada — resulte duma adaptação da dialéctica hegeliana à problemática com que Marx reformula o seu pensamento após a descoberta das implicações teóricas e políticas da mais-valia. Mas não vemos que isso tenha de significar necessariamente, nem que uma primeira aceitação da dialéctica hegeliana pelo jovem Marx não haja sido já um seu começo de transformação, nem que a transformação mais tarde operada com a definitiva mudança da problemática possa assumir o carácter de uma ruptura epistemológica abissal entre duas épocas radicalmente diversas na evolução teórica do fundador do marxismo.
Iniciámos este trabalho com uma perspectiva dos problemas postos ao pensamento marxista, em que indicámos os sentidos em que, nos nossos dias, teremos de desenvolvê-lo: o preenchimento das lacunas existentes; a ampliação da análise marxista aos novos factos ou fenómenos entretanto surgidos; o restabelecimento da teoria formulada por Marx em face de interpretações divergentes sobrevindas. Esta situação foi tornada mais instante pelo desfazer da interpretação dogmática estalinista, que bloqueou, durante um larguíssimo período, o desenvolvimento do marxismo. Como escreve Althusser, «o que o fim do dogmatismo nos deu foi o direito de fazer o balanço exacto do que possuímos, de chamar pelo seu nome quer a nossa riqueza, quer a nossa penúria, de pensar e formular em alta voz os nossos problemas, de realizar dentro do rigor uma verdadeira investigação» (38). É nesse aspecto que as análises de Althusser tiveram e podem continuar a ter o condão de nos despertarem para repensarmos o marxismo.
Henri Lefèbvre referiu-se-lhes nos seguintes termos: «Se nada de novo aparece na compreensão do marxismo, isso pode ter dois significados. Ou nada de verdadeiramente novo apareceu na prática social, na sociedade e na história; ou a compreensão teórica se destaca da prática. Não será preciso distinguir as compreensões das interpretações? Surge uma nova compreensão da teoria marxista, diremos nós, em função duma problemática nova na prática social. Ela supõe que se continue a elaborar os conceitos formalmente, servindo-nos deles para apreensão dum novo conteúdo, e para determinação dum praxis, dum projecto de acção sobre o conteúdo. Pelo contrário, se introduzirmos no pensamento marxista conceitos ou ideologias exteriores e nos contentarmos com uma formalização dos conceitos, não se dá senão uma versão». Mas esta crítica só parcialmente é justa. Em boa verdade, a ampliação e desenvolvimento do marxismo, de modo a torná-lo um pensamento cada vez mais útil ou eficaz — porque correcto e actualizado —, não pode dispensar-se duma constante revisão do próprio sentido e valor teórico do que o próprio Marx pensou e escreveu, embora não seja esta, na actual situação teórica e prática, a tarefa fundamental. É nos outros dois sentidos por nós indicados que aquela ampliação e desenvolvimento terão de realizar-se para que a doutrina se mantenha viva e capaz, continuando a prestar aos homens os serviços que sejam complemento e alargamento dos que já prestou.
(*) O presente ensaio foi publicado, como inédito, no volume ‘Um humanismo à nossa medida’, Ed. Inova, Porto, 1971, que recolhe um grande conjunto de escritos dispersos do autor. Este livro brilhante tem quatro ensaios inéditos, de grande fôlego, três dos quais não teriam certamente passado pela censura, alguns anos antes. Um deles este.
----------------------- NOTAS:
(1) Une Interprétation du Marxisme, em «L’Homme et la Société», nº 4, 1967.
(2) Le Grand Tournant du Socialisme, Paris, 1969, pp. 29.
(3) Referimo-nos sempre à 2ª edição, refundida, desta obra (Paris, 1968), quer nas citações que fazemos, quer quando consideramos as Ideias de Althusser.
(4) Cfr. Pour Marx, Paris, 1966, pp. 26-27.
(5) Lire le Capital, vol. 1, pp. 13.
(6) Lenine e a Filosofia, ed. port., Lisboa, 1970, pp. 29.
(7) Lire le Capital, vol. II, pp. 5.
(8) Lire le Capital, vol. II, pp. 24, 28 e 29.
(9) Lire le Capital, vol. II, pp. 53.
(10) Miséria da Filosofia, Ed. Soc., pp. 115-116, cit. por Althusser.
(11) Pour Marx, pp. 234.
(12) Pour Marx, pp. 233.
(13) Marcuse, Raison et Révolution, Paris, 1968, pp. 304.
(14) Raison et Révolution, pp. 304.
(15) Une Interprétation du Marxisme, em «L’Homme et la Société», n.° 4, 1967.
(16) Pour Marx, pp. 158.
(17) Lire le Capital, pp. 51.
(18) Introduction à l’Idéologie Allemande, em «L’Homme et la Société», nº 7, 1968.
(19) Das Kapital, vol. III, 1, pp. 247, ed. de Engels.
(20) A Formação do Pensamento Económico de Marx, ed. bras., 1968, pp. 177-178.
(21) Pour Marx, pp. 78.
(22) Lire le Capital, vol. 1, pp. 23-24.
(23) Pour Marx, pp. 238, 239, 240.
(24) Lenine e a Filosofia, pp. 30, 54, 54-55.
(25) Pour Marx, pp. 16.
(26) Adam Schaíf, La définition fonctionnelle de I’idéologie et le problème de «la fin du siècle de l’idéologie», em L’Homme et la Société», nº 4, 1967.
(27) Pour Marx, pp. 171.
(28) Marx, em Gazeta Renana, cit. por Althusser, Pour Marx, pp. 230.
(29) Pour Marx, pp. 230 e seg.
(30) Pour Marx, pp. 235, 236.
(31) Pour Marx, pp. 239.
(32) D’Une Sainte Famille à l’Autre, Paris, 1969, pp. 170.
(33) Obr. Cit., pp. 162.
(34) Lire le Capital, vol. 1, pp. 79, 80.
(35) Lire le Capital, vol., II, pp. 136.
(36) Pour Marx, pp. 92.
(37) Pour Marx, pp. 9, 100, 211-212.
(38) Pour Marx, pp. 21.
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