A natureza, o homem e a sociedade(*)

 

Álvaro Cunhal 3

 

Álvaro Cunhal

 

 

 

 

No conjunto nacional, existe um considerável atraso da agricultura em relação à indústria. Basta notar-se que, correspondendo à população agrícola activa mais de 50% da população activa total, a parte do rendimento nacional que cabe à agricultura não vai além de 26%; ao passo que, correspondendo à população activa na indústria apenas 21% do total da população activa, cabem à indústria 28% do rendimento nacional (1). É bem visível ser o desenvolvimento económico na agricultura mais lento que na indústria.

 

Quais as razões deste facto? Será essa diferença consequência das condições naturais específicas em que se exerce a actividade agrícola? ou provirá de instituições transitórias?

 

Da resposta que se dê a estas perguntas resultam conclusões de extrema importância. Se existem causas naturais determinando o atraso da agricultura, então a rotina, a produção agrícola insuficiente, a falta de alimentos, a diferença e oposição entre a cidade e o campo, são males contra os quais nada pode o homem e dos quais a ninguém cabe responsabilidade. Se o atraso agrícola provém de instituições transitórias, então há responsabilidade directa de tais instituições e está nas mãos dos homens superar o atraso, conquistar a abundância e eliminar a diferença entre a cidade e o campo.

 

As pretensas razões naturais

 

Segundo alguns técnicos, existem características específicas da agricultura impedindo que acompanhe o ritmo de desenvolvimento da indústria. Tais características seriam eternas e imodificáveis. As «forças naturais» constituiriam obstáculo invencível ao progresso técnico. Leis biológicas se oporiam aos esforços humanos e os tomariam inúteis.

 

«O nível das actividades agrárias» seria condicionado fundamentalmente pelo «binário clima-solo» (2). Na agricultura, as suas «características fundamentalmente biológicas», a sua «estreita dependência perante as condições ambientes», a «incerteza dos seus resultados», a «dispersão inorgânica em que é exercida e a que está decerto obrigada para utilizar a energia solar» tornariam os avanços técnicos «menos eficazes, mais contingentes, mais lentos, menos facilmente generalizáveis» (3). Essa seria a razão do seu atraso.

 

Sem dúvida que, na generalidade dos países capitalistas, a produção agrícola está em alto grau dependente das forças naturais do solo e do clima, tal como se oferecem ao homem, e os avanços técnicos na agricultura são «menos eficazes, mais contingentes, mais lentos, menos facilmente generalizáveis». Isso não sucede porém pela acção irresistível de leis naturais, mas, como se mostrará, pela intervenção de obstáculos de ordem social. Afastados estes, podem ser eliminadas as «razões naturais» do atraso agrícola. Contra a natureza irremediável do mal que se teria de concluir destes pareceres dos técnicos, pode confiar-se na possibilidade de o remover.

 

Com frequência, os defensores das razões naturais irremediáveis do atraso agrícola referem os «limites máximos possíveis» da produtividade das espécies cultivadas. Há pouco mais de meio século, o visconde de Coruche garantia: «A agricultura tem limites naturais, restritos e particularíssimos a cada país, a cada região e a cada produto, limites além dos quais é impossível produzir.» «Por muito dinheiro, muito trabalho, ciência, inteligência, que se empregue em bem amanhar e adubar, a produção não pode nunca exceder os limites de um certo termo natural invencível.» (4). Mais de meio século passado, economistas e técnicos afirmam precisamente o mesmo, embora nem sempre com tanta clareza. Apenas não reparam que o próprio desenvolvimento da agricultura capitalista, apesar da sua lentidão em relação à indústria, se vai cada dia encarregando de vencer os obstáculos naturais e biológicos, tidos ontem como invencíveis. Não reparam que a própria técnica se encarregou de demonstrar na prática serem errados os cálculos dos nossos avós acerca dos «máximos possíveis». É mais que certo virem a dar os nossos filhos desmentido igual a alguns técnicos de hoje.

 

Embora fosse determinável (que não é) um máximo possível de produtividade, citar em Portugal a existência desse máximo como razão das dificuldades do avanço técnico na agricultura, como causa do atraso agrícola, é caso para fazer sorrir. Técnicos categorizados admitem, por exemplo, como produção teórica máxima de trigo por hectare cerca de uma dúzia de toneladas. Se atendermos que a produção de trigo em Portugal só em raros anos ultrapassa a média de 1 tonelada por hectare e que, de 1940 a 1949, na maioria dos anos, pouco passou dos 500 quilos; se atentarmos nas diferenças gritantes entre as produções unitárias na lavoura corrente e as alcançadas em campos experimentais ou mesmo em explorações mais evoluídas; se compararmos as produções unitárias em Portugal com as dos outros países do Ocidente europeu; se nos lembrarmos dos imensos recursos naturais ainda por aproveitar; se notarmos a desoladora distância entre os processos e os resultados da agricultura portuguesa e aquilo que os próprios técnicos portugueses aconselham e consideram viável temos de reconhecer que citar as máximas produções possíveis, entre as razões naturais do atraso agrícola, é jogo de palavras que não pode convencer ninguém.

 

Estamos longe, terrivelmente longe, não só dos «máximos teóricos» como de médias práticas razoáveis. Já há mais de meio século se obtinham em experiências 30 a 40 quintais de trigo por hectare (5). Já há mais de trinta anos, lavradores do Alentejo e Ribatejo alcançavam 18 a 20 hectolitros por hectare (6). Já há mais de vinte anos se obtinham nos campos experimentais do Instituto Superior de Agronomia mais de trinta quintais por hectare (7). Casos são citados em que uma simples adubação conveniente permitiu em herdades de Estremoz e Campo Maior rendimentos de mais de 20 quintais (8). No mesmo ano em que, numa freguesia do concelho de Elvas, a produção média de trigo andou por 8 quintais por hectare, alcançaram-se em campos na mesma freguesia produções de 20 a 28 quintais (9). Estes exemplos ilustram não serem causas biológicas nem climáticas, não serem quaisquer «máximos não ultrapassáveis», a determinar os baixíssimos rendimentos unitários em Portugal.

 

A ideia basilar de razões naturais, explicando o atraso da agricultura, é cercada, às vezes, de argumentos técnicos cuidadosamente elaborados, entre os quais avulta a tentativa de demonstração de que a composição orgânica do capital depende apenas, em última análise, do tipo de cultura. Os técnicos estudam vários tipos de cultura e determinam as «despesas de trabalho» em cada tipo. Verificam, por exemplo, que nos casos mais usuais, tais despesas absorvem 40% do total das despesas nas explorações policulturais, menos de 20% nas predominantes pecuárias e 60% em casos de grande intensidade cultural ou em solos pobres e com fracas colheitas. Daqui concluem serem causas técnicas, e não económico-sociais, a determinarem a composição orgânica do capital, e não lhes é difícil concluir pela magra cota do capital constante como lei invariável na agricultura. «A intensificação das explorações agrícolas - diz-se - continua a depender, em larga escala e mais ou menos por toda a parte, das possibilidades de aumentar o número de trabalhadores.» (10) Não se repara, assim, que o simples facto de aumentar com os tempos a composição orgânica do capital na agricultura é um desmentido à existência de quaisquer «causas naturais basilares», de quaisquer razões específicas inelutáveis. Não se repara, também, que, em muitas empresas agrícolas contemporâneas, a composição orgânica é mais elevada do que há um século ainda não era em algumas indústrias manufactureiras.

 

Os mesmos autores, que afirmam ser a baixa composição orgânica do capital uma lei da produção agrícola, não deixam, entretanto, de afirmar que o atraso da agricultura existe também porque o progresso cultural exige a introdução de máquinas, isso provoca o desemprego rural e os capitalistas e o Estado querem evitá-lo... «Além das conhecidas causas técnicas», haveria uma outra causa que «tem obstado à difusão de muitas utilíssimas máquinas agrícolas em Portugal».

 

Essa causa nada teria a ver com o sistema económico, mas apenas com o bom coração dos grandes lavradores. Essa causa seria «o conhecimento da desfavorável repercussão que teria no desemprego rural» (11). Também neste ponto os técnicos modernos não se afastam muito do visconde de Coruche. «O movimento normal da agricultura - dizia o visconde - não me parece que possa ser muito ultrapassado, sem comprometer a felicidade real dos povos» (12). O atraso da agricultura seria assim também, além de questão natural e técnica, uma questão de piedade e de coração.

 

Dizendo, por um lado, que a intensificação cultural depende do número de trabalhadores, dizendo, por outro lado, que implica a sua diminuição (pois a introdução de máquinas e de uma técnica mais rendosa provoca o desemprego rural), os justificadores do atraso agrícola não reparam sequer na contradição em que incorrem. Não reparam que estão a afirmar a um tempo que o progresso agrícola depende do aumento do capital variável (e consequente diminuição da composição orgânica do capital) e da diminuição do capital variável (e consequente aumento da composição orgânica do capital)...

 

Uma das bases fundamentais de todas as teorias e explicações recentes e antigas do atraso da agricultura por razões naturais é a velha «lei dos rendimentos decrescentes», segundo a qual as inversões de capital (constante ou variável) na exploração agrícola provocam, a partir de certo ponto, uma produção proporcionalmente cada vez menor. De há muito se procurou atribuir a esta «lei» uma «significação universal», um carácter imutável e eterno, contrapondo-se à «significação temporária», ao carácter transitório, do progresso agrícola. A realidade é, porém, a inversa: o progresso da agricultura é a lei geral, «os rendimentos decrescentes» uma paragem temporária. Afirmar o contrário, como o fez Bulgákov, seguidor de Bernstein (notou Lénine), «é o mesmo que dizer que a paragem dos comboios nas estações representa a lei universal do transporte a vapor, enquanto o movimento dos mesmos entre as estações é uma tendência temporária que paralisa a operação da lei universal da paragem». Mesmo quando a técnica permanece sem alteração, tal «lei» possui «uma aplicação muito relativa e condicional»; «quando a técnica progride, não se aplica em nenhum caso (13).

 

Nos nossos dias, servindo-se da validade «extremamente relativa» de tal «lei» numa agricultura de técnica atrasada, economistas e técnicos explicam aos capitalistas por que razão, comprando atabalhoadamente meios de produção e força de trabalho, deixam de ter o esperado lucro de tantos por cento. Assim, por exemplo, na grande empresa agrícola (dizem os técnicos), por acção desta «lei», «a partir de certo momento, a mão-de-obra exigida pela maior intensificação não é compensada pelo aumento do lucro da exploração» (14). Partindo desta «lei», ensina-se aos capitalistas como hão-de empregar o seu capital de forma a obterem maiores lucros. Isto, porém, num dado momento, não numa perspectiva histórica. A evolução geral do capitalismo na agricultura, com o aumento da produção e a diminuição do número de trabalhadores, acusa que a tendência «temporária» é a produtividade decrescente e a «universal» o progresso da técnica.

 

Porquê esse recurso à velhíssima e já tão batida «lei dos rendimentos decrescentes», que já Marx reduzia às suas proporções? A razão é sempre a mesma: um esforço apologético visando mostrar que o atraso da agricultura não é resultante de condições económico-sociais. É esse na verdade o carácter essencial do esforço ideológico feito para provar a existência de razões naturais inelutáveis do atraso agrícola. Não se encontrando tais razões naturais, ter-se-ia de reconhecer a existência de causas sociais e por-se-ia, desse modo, em discussão o próprio capitalismo. Mas constituem as «causas naturais inelutáveis» uma trincheira ideológica ao abrigo da qual o capitalismo se possa colocar com segurança? Não, não constituem. Afirmando-se a existência de causas naturais inelutáveis do atraso agrícola, afirma-se a incapacidade do capitalismo para vencer esse atraso e erigem-se as suas dificuldades próprias em leis eternas. Confessando-se impotente para vencer as próprias dificuldades e contradições, o capitalismo, julgando ficar absolvido, lavra a sua própria condenação.

 

A determinação de um hipotético máximo teórico de produção por hectare e a «lei» dos rendimentos decrescentes são preceitos técnicos para a obtenção de maiores lucros e são dois dos pilares de todas as antigas e modernas «teorias» justificativas do atraso da agricultura por causas naturais inelutáveis. É preciso possuir a imaginação de António Sérgio pala conseguir ver aí os melhores instrumentos da luta contra a «superstição do lucro» e para conseguir transformar esta ideologia da escassez em ideologia da abundância.

 

A «lei» dos rendimentos decrescentes e «o limite para o aumento da colheita de um dado agrotipo (...) por unidade de superfície» (15), são de facto dois dos «princípios fundamentais» da «agrobiologia» de António Sérgio. Sobretudo a «lei» dos rendimentos decrescentes é elevada por Sérgio (que nisto vai mais longe que o citado e infeliz Bulgákov) à categoria de lei universal e eterna - tão universal e eterna como as leis da gravidade, os princípios da hidrostática e a fórmula do binómio de Newton (16). Reduzida a uma fórmula, torna-se a «equação geral da agrobiologia» e «um verdadeiro instrumento de emancipação dos homens» (17).

 

Com a divulgação desta «agrobiologia», António Sérgio, partindo da correcta ideia de que «em relação às necessidades produz-se muito menos do que se poderia e do que se deveria produzir» (18), julgava «revelar aos leitores as bases científicas de uma reforma possível nos nossos processos de cultivar a terrat» e por esse meio «divulgar que existe a demonstração científica de ser coisa possível o alimentar o povo com muito mais fartura que actualmente, uma vez que aos requisitos técnicos se venham adicionar os sociais» (19). Como mais tarde precisou, visava, através da demonstração da «ideia da possibilidade técnica de abundância», mostrar que «só por motivos que não são técnicos - e sim sociais - é que a mesma abundância não se alcança e concluir, por aí, a necessidade urgente de uma remodelação social» (20).

 

Este objectivo era justo e de aplaudir. O grande mal dos artigos sobre a «agrobiologia» era conduzirem precisamente a um resultado contrário ao pretendido.

 

Em primeiro lugar: António Sérgio afirmava contra a experiência de século e meio de capitalismo com as suas crises cíclicas, que a abundância só se tornara tecnicamente possível muito recentemente, com novos processos de cultivo que teriam uns 15 anos (21) e muitos dos quais em fase experimental - a «moderníssima ciência da agrobiologia», que «verificamos ser entre nós inteiramente incógnita» (22). Isto insinuava que, sem esses «moderníssimos» e incógnitos processos científicos de cultivo, a abundância não seria possível. Daqui poder concluir o leitor que o capitalismo ficava definitivamente absolvido pela escassez até à descoberta da «agrobiologia» quinze anos atrás e que a abundância poderia ser alcançada no quadro do capitalismo pela adopção de tais moderníssimos processos de cultivo, ou seja: que a questão da abundância é questão a ser resolvida no plano técnico, e não no plano social.

 

Em segundo lugar: a «técnica» proposta e divulgada sacrifica o rendimento agrícola ao rendimento capitalista, e este é o seu real fim prático. Ela não demonstra a possibilidade técnica da abundância, mas, pelo contrário, introduzida no campo da teoria económica, induz a crer nas limitações invencíveis da produtividade do trabalho na agricultura e é uma base essencial das modernas correntes malthusianistas. Não provando tal «agrobiologia» a possibilidade técnica da abundância, é bem de ver que com ela não se poderia demonstrar a existência de razões «não técnicas» da escassez.

 

Em terceiro lugar: António Sérgio pretendia que a «agrobiologia», provando a possibilidade técnica da abundância, poria o problema das condições não técnicas - A. S. chama-lhes primeiro «condições humanas - psicológicas, políticas, sociais, educativas» (23) mas resume-as, mais tarde, com o termo «sociais» (24), que permitiriam aos povos porem por obra o processo técnico da abundância (25). Uma vez, no entanto, que tal «agrobiologia», ao contrário do pretendido, foi criada nas «condições humanas», incluindo as sociais do capitalismo, o leitor era levado à ideia de que, para «pôr por obra» a técnica de «abundância» de A. S., não era necessário criar «condições humanas» novas, não capitalistas. Bastava importar para Portugal essa moderníssima ciência entre nós inteiramente incógnita.

 

Em quarto lugar: António Sérgio pretendia que o objectivo do lucro, a «superstição (!?) do lucro», impede a realização da técnica «agrobiológica» e que, portanto, divulgar esta é afirmar a necessidade de pôr termo ao objectivo do lucro. A verdade é que tal «agrobiologia», ao contrário do pretendido, é uma técnica criada para obtenção de maiores lucros. Além disso, não é correcto dizer-se que o objectivo do lucro, em regime capitalista, impeça a criação e aplicação de uma técnica da abundância. Pelo contrário. O objectivo do lucro num regime de concorrência obrigou e obriga a constantes progressos técnicos e a eles se deve a criação de uma técnica da abundância. É certo que, como diz A. S., «a busca do lucro (...) contraria a produção abundante, como o provam as restrições e as destruições a que hoje se recorre em tão larga escala precisamente para manter o lucro» (26). Mas não impede, antes implica, a adopção de uma técnica da abundância. Este um dos aspectos essenciais do papel histórico progressivo do capitalismo, embora, também, um dos aspectos das suas contradições fundamentais, pois o capital provoca a um tempo a tendência para a expansão ilimitada da produção e o seu limite. Sendo assim, ao afirmar-se existir uma técnica nova, ainda não utilizada, capaz de assegurar a abundância, não se sugeria, ao leitor a quem A. S. se dirigia - o supersticioso, o venerador de Mamom (27) - a necessidade da abolição da «superstição do lucro», mas, pelo contrário, sugeria-se que a moderníssima e incógnita ciência carecia de entrar nos domínios práticos, pois aí a miragem do lucro lhe daria acolhimento. Ou seja: que a questão da abundância é questão a ser resolvida no plano técnico, e não no plano social.

 

Em quinto lugar: António Sérgio fala em «modificação do regime social» (28). Que «modificação» é essa que pretendia sugerir? Os artigos sobre a «agrobiologia» não davam resposta a esta questão, mas dá-a, com inexcedível clareza, outra obra do autor (29). Essa modificação é o plano cooperativista «sem o poder político», «que torna desnecessário o poder» (30); um cooperativismo «objectivo para todos, um ideal para todos, que a todos se dirige» (31); um cooperativismo que é, também, um cooperativismo meio pacato, calmo, inofensivo; um cooperativismo cuja maior utilidade é defender o regime de lucro e entravar qualquer real movimento para uma «modificação do regime social».

 

A «agrobiologia» de António Sérgio, nem era uma «técnica da abundância», nem sugeria qualquer abolição do lucro ou qualquer modificação do regime social. Era apenas, por um lado, uma interpretação fantasiada de uma moderna técnica criada, desenvolvida e aplicada com o fim de aumentar os lucros; arrumava-se, por outro lado, contra a vontade do autor entre as tentativas de ressurreição e supervalorização da «lei dos rendimentos decrescentes», sempre utilizada como «prova» das limitações naturais inelutáveis do aumento da produção agrícola e base teórica essencial das doutrinas malthusianistas.

 

A população e as subsistências

 

As ideias acerca das causas naturais impedindo o progresso da agricultura, ligadas a um tecnicismo de linguagem e a supostas comprovações experimentais, são, frequentemente, apresentadas como as mais remotas novidades. São, entretanto, ideias velhas e revelhas e a sua ressurreição por obra dos pregadores do atraso e miséria irremediáveis indica apenas a pobreza do seu arsenal ideológico.

 

Numa passagem, que se poderia tomar por escrita em nossos dias, Malthus - esse «plagiador-modelo», como lhe chamava Marx (32), mas que tanta influência teve e tem - dizia: «Num certo grau, ninguém pode duvidar da capacidade de desenvolvimento nas plantas e animais. Um nítido e decidido progresso já foi feito; e, apesar disso, penso que seria completamente absurdo dizer que este progresso não tem limites.» (33). No que esta frase tem de verdade é um oco lugar-comum; no seu real significado não é verdadeira. É partindo, porém, deste lugar-comum (que alguns hoje enroupam em complicada técnica) que Malthus declara ao mundo que o aumento das subsistências não acompanha nem pode acompanhar o aumento da população, assim como a tartaruga não pode apanhar a lebre.

 

Não é, pois, de admirar que, no mundo de hoje, as ideias do carácter inelutável do atraso agrícola caminhem a par com a ideia malthusiana do excesso da população em relação às subsistências. Pelo seu carácter absolutório do capitalismo e pelo seu significado de declaração de luta impiedosa contra os trabalhadores, a teoria de Malthus, incluindo as suas progressões, foi desenterrada e reposta em circulação.

 

O que distingue verdadeiramente Malthus dos seus actuais seguidores é ter, ao contrário destes, tirado francamente da «lei» muitas das consequências teóricas e práticas fundamentais. Estas estão implícitas naquela, mas são as consequências e não a «lei» que têm real importância. E como a quase todos os actuais seguidores de Malthus falta a franqueza do seu mestre, é útil conhecer Malthus para saber o que pensam e calam os malthusianistas contemporâneos.

 

Partindo da sua «lei», afirmando que a população cresce segundo uma progressão geométrica, enquanto os meios de subsistência não podem aumentar mais depressa do que segundo uma progressão aritmética (34), Malthus concluiu ser «uma inevitável lei da natureza» (35) a eliminação da população «excedente». «A grande lei da necessidade - escreveu ele - impede que a população cresça em qualquer país para além do alimento que este pode produzir ou adquirir» (36). Quando a mesa está cheia (escreveu numa passagem da 2.ª edição cortada nas edições posteriores), quem vem a mais não tem lugar vago, a natureza ordena-lhe que se vá e executa rapidamente as próprias ordens. A miséria, a fome, o trabalho excessivo, a mortalidade infantil, as habitações insalubres, as pestes, as guerras - tais os meios de que a natureza se serve para «corrigir» a desproporção. São males irremediáveis, eternos e necessários. Mais ainda: «Parecem ser instrumentos utilizados pela Divindade» (37), para advertir o homem dos resultados da procriação excessiva e exortá-lo à restrição. Os grandes males sociais sobem assim pela mão de Malthus à categoria de agentes naturais e de exortações divinas a que nos «devemos submeter». Remover esses males é, nas palavras de Malthus, «uma tarefa absolutamente sem esperança» (38). Mas não só ficam assim absolvidos o capitalismo e a burguesia. A «lei» da população dá base bastante para lançar as responsabilidades para cima dos trabalhadores. Se os trabalhadores vivem na miséria e se sujeitam a esses meios correctivos da natureza e da divindade, é porque não se abstêm de procriar. A grande culpa dos males que sofrem reside, pois, neles próprios (39).

 

Não se podia ter imaginado um leito mais macio (Engels chamava-lhe um «colchão de penas») para repousarem as almas intranquilas. Malthus não se limita, porém, a fornecer um tal colchão de penas. A sua «lei» da população fornece, também, base ideológica para uma verdadeira declaração de guerra contra as classes trabalhadoras.

 

À face da «lei» da população, todas as medidas tendentes a melhorar a sorte dos trabalhadores, animando ao casamento e à procriação, contrariam as leis naturais e os avisos da providência e, por isso, devem ser combatidas. Segundo Malthus, «se cada homem tivesse assegurada a manutenção confortável de uma família, quase todos os homens teriam uma; e se a geração nascente fosse libertada do medo da pobreza, a população cresceria com desusada rapidez» (40). Para evitá-lo, Malthus combateu abertamente o auxílio aos desempregados e aos pobres que, «embora podendo ter aliviado um pouco a intensidade do infortúnio individual, espalhou o mal sobre uma superfície mais vasta» (41), combateu os aumentos de salários, pois «quando os salários não mantêm uma família é um sinal incontestável de que o seu rei e o seu país não necessitam de mais súbditos, ou pelo menos de que não podem sustentá-los» (42); combateu a redução dos preços com fundamento de que, se os preços descessem, também os salários desceriam (43); combateu quaisquer reclamações dos trabalhadores, negando-lhes, à face das «leis naturais», o direito de reclamar (44); combateu a assistência pública e a caridade privada, porque «a pobreza e a miséria têm sempre aumentado em proporção com a quantidade de caridade indiscriminada» (45); combateu o auxílio às famílias numerosas (46); e até em relação às crianças miseráveis ou abandonadas, defendeu que «os filhos devem sofrer os erros dos pais» (47), que «não se pode exigir da sociedade» que se coloque no lugar destes, que o «recém-nascido é de pouco valor para a sociedade e outros ocuparão o seu lugar» (48) e, em consequência, lançou a sentença aos filhos dos pobres: «they must starve» (49) - que morram de fome!

 

Como se vê, toda a doutrina de Malthus é um plano de ofensiva violenta e desapiedada, não apenas no domínio da especulação teórica, mas também visando à aplicação no terreno da prática.

 

Como notou Marx, «era muito mais cómodo e muito mais conforme com os interesses das classes dominantes, que Malthus bajula como bom padre que é, explicar a "superpopulação" pelas leis eternas da natureza, do que explicá-las pelas leis históricas da produção capitalista» (50). As teorias que se opõem à realidade, a própria realidade as desmente. A história desmente de facto rotundamente a «lei» da população. As famosas progressões revelaram-se puro ilusionismo. O desenvolvimento técnico obrigou as subsistências a aumentar num ritmo superior ao da população. Na sua fase progressiva, o capitalismo deu enorme impulso às forças produtivas. Ao mesmo tempo, a acumulação do capital, com o uso da maquinaria em grande escala e a exploração acrescida dos trabalhadores, determinou a superpopulação relativa, que se revelou, não como excedendo as subsistências, mas como excedendo as necessidades do capital. Contra todas as previsões de Malthus, o volume da superpopulação relativa é tanto maior quanto maiores são o progresso técnico, a acumulação e o ritmo do aumento da composição orgânica do capital. «Os novos capitais formados no transcurso da acumulação chamam a si um número cada vez menor de operários em proporção à sua grandeza. Por outro lado, os antigos capitais, periodicamente reproduzidos com a composição renovada, vão repelindo um número cada vez maior de operários a que dantes davam trabalho» (51).

 

Na agricultura, ainda este fenómeno se apresenta com mais evidência: aí os progressos da produção são acompanhados por uma forma latente de superpopulação relativa.

 

Mas, além das sociedades socialistas, onde não vigoram as leis do capitalismo, dentro do próprio capitalismo, o grande e definitivo desmentido à «lei» de Malthus foi dado pelas crises de superprodução. Surgindo periodicamente, através de século e meio, elas tornaram indiscutível que, no sistema capitalista, a miséria não é tanto produto da escassez, como da fartura. Quando nas crises, pela redução forçada das forças produtivas, pela destruição em massa de meios de subsistência, a apropriação procura domar a rebelião da produção social e restabelecer o equilíbrio, afirma-se, implicitamente, que o homem está apto a produzir o bastante para uma vida farta e confortável e que só essa apropriação o impede. Condenando milhões de seres ao desemprego e à fome ao mesmo tempo que destroem meios de subsistência, as crises (como sublinhava Engels no Anti-Dühring) põem a claro que esses seres não sofrem o desemprego e a fome por terem produzido de menos (conforme pretendia Malthus), mas por terem produzido de mais.

 

A «lei» de Malthus aparece assim completamente vazia de qualquer valor teórico, e reduzida ao que nela é a real substância: o «colchão de penas» e a «declaração de guerra».

 

É sintomático que esta «teoria» da inevitabilidade da escassez e da impossibilidade do aumento da produção de alimentos num ritmo acompanhando o do aumento da população tenha nascido em fins do século XVIII na Inglaterra, o país que então estava em plena revolução industrial, que era o primeiro país industrial do mundo e onde, então, era mais elevada a produtividade do trabalho.

 

O grande progresso das forças produtivas fora acompanhado pela expropriação dos pequenos produtores e pela criação de um numeroso proletariado vivendo em condições piores do que nunca. Foi missão do malthusianismo dar à burguesia uma justificação e uma defesa dessa piora trágica da situação dos trabalhadores.

 

E é igualmente sintomático que a nova vaga da «lei» de Malthus se dê hoje a partir do país capitalista industrial e agricolamente mais evoluído; um país onde a produção das subsistências tem aumentado de forma visível mais rapidamente que a população; um país onde a produção industrial em 1943 tinha mais do que duplicado em relação a 1937 (52), e onde a produção agrícola em 1944 e nos anos seguintes foi 36% superior à média de 1935-1939 (53) e onde a população, de 1937 para 1943, aumentou menos de 6% (54); um país onde o grande problema económico não é a carência de produtos alimentares, mas a existência de gigantescos «excedentes».

 

É de facto nos E.U.A. que sopra a nova onda de ideologia e linguagem malthusianista. Não se trata de especulações de teóricos isolados da vida prática, mas de opiniões de técnicos responsáveis da administração e, mais especialmente, de organismos de cooperação internacional. O sr. Vogt, por exemplo, chefe de um serviço de cooperação pan-americana, considera um erro da medicina moderna «julgar que tem o dever de manter na vida o maior número de pessoas possível», vê na redução da mortalidade uma causa das dificuldades de muitos países, apresenta o espectro do aumento da população e defende com mais ou menos clareza como meios de evitar o «desastre», as fomes, as pestes e - claro está - as guerras (55). Dentro da mesma orientação, os documentos de carácter económico aparecem crivados de conceitos malthusianos, de comparações pessimistas entre a população e as subsistências, utilizando-se as estatísticas modernas tal como Malthus utilizou através de centenas de páginas as rudimentares estatísticas da sua época.

 

E se falta a muitos dos malthusianistas actuais a franqueza de palavras do seu pai ideológico, não lhes falta a franqueza nos actos. Diz-se que a «lei» é particularmente evidente nos países atrasados, mas aí os capitais investidos obrigam à substituição da cultura de produtos alimentares pela de matérias-primas e à exportação do que se necessita, de maneira que a carência alimentar dos povos coloniais é o reverso da medalha de super-lucros nas grandes potências. Grita-se que faltam as subsistências, mas organiza-se a concorrência nos mercados mundiais, batem-se com produtos agrícolas os países importadores no seu próprio mercado interno, e a cinco anos do fim da guerra não se hesita em recomeçar destruições de produtos alimentícios. Em Novembro de 1950, por exemplo, anuncia-se que o Departamento da Agricultura dos EUA mandou destruir mais de 720 000 toneladas de batata (pouco menos que toda a produção portuguesa em 1949) com o único fim de manter os preços (56). Ao mesmo tempo que se impede o aumento da produção e se destroem géneros, arvora-se a escassez em lei eterna (tal como o fez Malthus) e defende-se, explícita ou implicitamente, a necessidade de reduzir a população. Os meios «correctivos» de Malthus voltam a estar na ordem do dia.

 

Não é difícil explicar esta nova voga de malthusianismo a partir dos países economicamente mais poderosos. Por um lado, agravam-se as contradições dentro deles próprios, sem que a grandeza da produção evite o desemprego e as dificuldades de vida. Por outro lado, tais países assentam em grande parte a sua «prosperidade» na dominação dos povos coloniais, no atraso desses povos, no seu baixíssimo nível de vida. Finalmente, para prosseguir o seu desenvolvimento económico, tais países necessitam de lançar-se em empresas para a conquista de novos mercados e fontes de matérias-primas. A ideologia malthusiana casa-se, pois, às maravilhas com as condições da vida económica dos países imperialistas. Ela justifica tanto as dificuldades domésticas como os horrores da situação dos povos coloniais e os empreendimentos militares.

 

Também entre nós a «lei» de Malthus entra em moda. Há já quem afirme que «a população portuguesa aumenta de facto em progressão geométrica» e descubra mesmo a razão respectiva (57). Há quem fale em «superabundância de capital humano», em «supersaturação» populacional (58). Há quem, referindo-se a um universal «princípio de escassez», exija a fixação de um «nível de vida mínimo», sem se lembrar de exigir a fixação de um nível de vida máximo (59), a fim de não se dilapidarem os recursos proclamados escassos. Há quem, citando «o perturbante problema que está gerando o crescimento constante de pessoas numa terra cada vez mais erodida», fale nos «traços cada vez mais nítidos» do «espectro de Malthus» (60). Sorri-se, por um lado, à ideia do aumento de um milhão de portugueses cada década; chora-se, por outro lado, a natureza pedregosa e árida do solo nacional.

 

Do simples facto de ter Portugal um hectare de superfície por habitante, conclui-se que «este sombrio panorama agro-social, correspondendo a uma proporção de menos de um hectare de terra agricultável, mas pobre, por indivíduo, bem pode explicar o motivo por que muitos continuam a clamar (...)» (61). Insiste-se na «gravidade da situação económica que em todo o mundo se observa com o crescente aumento da população e a diminuição dos recursos alimentares» (62). Até pessoas com pretensões a esclarecidas bebem e dão a beber o narcótico malthusiano, tal como certos editores portugueses, apresentando (como «ferramenta de trabalho» destinada aos leitores que «como cidadãos pretendem dominar e auxiliar a resolver os problemas da colectividade em que vivem e da época em que vivem») um Curso de Economia Política, onde, entre outras muitas enormidades, é proclamado: «Não se poderá afirmar que, na época actual, o problema da população se apresente em termos totalmente diferentes dos que formulou Malthus» (63). E há, também, quem entre mais afoitamente pela matéria, afirmando que «nem as guerras, as fomes e as epidemias alcançam, apesar da grandeza apocalíptica que frequentemente assumem, reduzir, no conjunto, o acréscimo demográfico que se verifica no globo e que se traduz, no ponto de vista económico e alimentar, num aumento incessante do número de bocas a prover o sustento, sem paralelismo na intensificação da produção» (64). É todo um amplo reviver das ideias de Malthus, ou expressas com clareza ou timidamente insinuadas, postas nos seus termos clássicos ou implícito em formas de exposição, em considerações demográficas e agronómicas, em justificações da miséria, da emigração, do atraso geral.

 

Existem de facto países onde a produção tem diminuído relativamente à população, e mesmo alguns onde há uma diminuição absoluta. Em Espanha, posterior a 1939, «enquanto a população continuou crescendo firmemente à razão de 1% ao ano, a produção agrícola total caiu 20% e a produção de cereais cerca de 30%» (65). Segundo técnicos espanhóis, a produção agrícola teria baixado ainda mais acentuadamente, não indo, em 1948, além de 63,7% da de 1929 (66). Em Portugal, se em muitos casos a produção agrícola tem aumentado, a sua capitação, em especial nos cereais, tem diminuído, conforme já mostrámos. Ao contrário, porém, dos novos arautos do malthusianismo que erguem a incapacidade e as contradições do capitalismo à categoria de factos inelutáveis, negamo-nos a aceitar que a diminuição das capitações da produção sejam consequência de leis da natureza que, no caso de Espanha, estariam (para assombro dos teorizadores) vigorar numa parte em sentido inverso ao anunciado. Ao contrário dos defensores das razões biológicas, naturais e técnicas do atraso da agricultura, nós acreditamos nas possibilidades do seu rápido e substancial progresso. Ao contrário daqueles que, seguindo Malthus, vêem como solução única a diminuição da população, por meios preventivos, ou pelos meios «correctivos», ao contrário dos que, como o sr. Vogt, condenam a melhoria de vida dos trabalhadores porque reduz a mortalidade, nós defendemos que o caminho que se abre perante a humanidade não é o trágico aniquilamento de vidas com pretexto de as reduzir ao nível das subsistências, mas o desenvolvimento das forças produtivas materiais a cujo progresso apenas as relações de produção capitalistas se opõem.

 

Malthus dizia que as subsistências (a tartaruga) não podem apanhar a população (a lebre), se esta não descansa. Os teorizadores de hoje continuam a afirmar ser a agricultura uma tartaruga imodificável. Nós acreditamos que não só em parte do mundo (como já sucede), mas em todo ele a tartaruga pode apanhar e virá um dia a apanhar a lebre, sem que esta seja forçada a retardar a marcha pelos meios «correctivos» do padre Malthus.

 

O poder do homem

 

Foi em grande parte por se ter inspirado em Malthus que Darwin não pôde compreender o problema humano. É certo que as ideias da concorrência e da luta aplicadas à natureza viva facilitaram a descoberta da selecção natural e do processo fundamental da evolução das espécies. Mas, embora Darwin, contra o que pretendem alguns dos seus detractores, considerasse a «luta pela vida» não apenas a luta de um indivíduo com indivíduos da mesma espécie, mas também, e fundamentalmente, «com indivíduos de espécies diferentes, ou com condições físicas de vida» (67), embora considerasse justamente em muitos casos a «concorrência» dentro de uma espécie não como uma guerra, mas como a simples «sobrevivência do mais apto», ou seja, a sobrevivência do mais capaz de resistir ao meio e à luta que lhe movem as outras espécies, ele não pôde sonhar a existência da ajuda mútua entre indivíduos da mesma espécie.

 

Darwin viveu numa sociedade onde predominava a concorrência e a luta sem tréguas entre classes sociais. Dada a acção da base material das sociedades sobre as respectivas ideologias, compreende-se que, pela sua mão, a «lei» de Malthus, reflectindo essa concorrência e essa luta, tenha estendido a sua aplicação à natureza viva e que a organização social da Inglaterra do século XIX, com as suas ideologias e sentimentos dominantes, se apresente ingenuamente atribuída a animais e plantas. Foi preciso que homens se educassem numa sociedade sem classes para tornar possível a descoberta da ajuda mútua entre os indivíduos de uma mesma espécie, ponto concordante do mundo biológico com essa nova sociedade. E, se algum espanto ou reparo há a fazer, acerca desta descoberta, não é que ela se tenha feito sem factos bastantes em que se apoiar, mas que tenha tardado tanto a fazer-se quando agora se vê que os factos há muito a justificam. Se mesmo no domínio da biologia, a influência malthusiana limitou e prejudicou o seu trabalho, o grande erro de Darwin foi reintroduzir os princípios malthusianos no estudo das sociedades humanas, fortalecidos agora por uma pretensa comprovação na natureza e aparecendo assim como leis universais e inelutáveis cientificamente aferidas. A concorrência, a luta de classes, o esmagamento violento de algumas camadas da população (fenómenos temporários correspondendo a uma fase do desenvolvimento da sociedade) seriam leis válidas e eternas para todas as espécies, incluindo a humana.

 

Darwin, a quem se deve a descoberta e provas definitivas da transformação das espécies e da origem animal do homem, não pôde compreender a evolução e transformação das sociedades humanas, das ideologias e dos sentimentos, e do próprio homem depois que emergiu da animalidade. Não pôde compreender que as sociedades, evoluindo por acção do homem, transformam o próprio homem que as faz evoluir.

 

Com frequência, Darwin insistiu em que «as espécies evoluem em passos muito pequenos» (68), em que a evolução é «um processo extremamente lento» (69), em que a «selecção natural não pode produzir grandes ou repentinas modificações» (70). Não pôde assim compreender como as transformações quantitativas se convertem em qualitativas, e a consequente importância dos saltos bruscos, tanto na evolução no mundo biológico como na evolução das sociedades humanas.

 

Darwin definiu a selecção natural como a «preservação de diferenças e variações individuais favoráveis e a destruição das que são nocivas» (71) de onde resulta que «todos os dotes corporais e mentais tenderão a progredir para a perfeição» (72). Não pôde, assim, compreender como os progressos em um sentido são retrocessos em outros sentidos e como nas sociedades humanas a selecção, muitas vezes, determina a preservação dos piores e menos aptos.

 

Darwin defendeu que «as faculdades mentais do homem e dos animais inferiores não diferem em qualidade, embora difiram imensamente em grau» (73), viu nos animais inferiores sensibilidade, ideias, conceitos estéticos e morais semelhantes aos do homem e tomou geralmente como padrão de beleza, de moralidade e até de civismo (padrão para a humanidade e as outras espécies animais) o seu próprio padrão de beleza, moralidade e civismo (74). Não pôde assim compreender que as ideologias são especificamente humanas e determinadas por uma base social material, que numa mesma sociedade não há ideologia uniforme e geral, mas conceitos e sentimentos divergentes, e que a evolução da vida material dos homens determina a evolução da sua vida mental.

 

Considerando o homem sob o ponto de vista puramente animal, Darwin atribuiu a causas biológicas o atraso de povos de algumas raças, aproximou-os constantemente (tanto nos seus caracteres físicos como intelectuais) dos animais inferiores e foi ao ponto de considerar alguns macacos moralmente superiores aos «selvagens»... (75) Não compreendeu, assim, a existência de razões sociais determinando o atraso desses povos nem as possibilidades actuais de superar esse atraso.

 

Darwin fez aceitar pela ciência a origem do homem. A sua contribuição foi, a este respeito, decisiva. Mas foi incapaz de vislumbrar que, a partir de certo momento da sua evolução, os caracteres do homem se diferenciaram qualitativamente dos das outras espécies.

 

A partir do momento em que o homem fabricou instrumentos de trabalho, a sua evolução passou a reger-se por leis diversas das que regem a evolução das outras espécies. O homem deixou de ser apenas uma espécie animal, adaptando-se ao meio e a novas circunstâncias por acção incontrolável da selecção natural. Na sua evolução, o homem não se limita a adaptar-se ao meio; ele adapta o meio a si próprio. «(...) o homem - escreve Marx - age em face da matéria natural como uma força natural. (...) age sobre a natureza exterior, modifica-a e modifica ao mesmo tempo a sua própria natureza». Modificando o meio com um propósito consciente, o homem, na sua lua com a natureza, não se limita a combater e eliminar outras espécies. O homem povoa o mundo com espécies por ele próprio escolhidas e ajuda e orienta a sua selecção. A «luta pela existência» do homem não toma assim apenas o carácter da destruidora e implacável «luta pela vida» de Darwin e Malthus; ela toma, também, o carácter de uma luta construtiva e criadora.

 

Darwin, que partia da selecção pela domesticação para a selecção natural, que conhecia (como ninguém) as transformações pela selecção, que em alguns casos verificou terem sobrevivido espécies graças apenas à acção do homem, sem a qual soçobrariam na natureza, não soube aí descobrir a afirmação das características específicas da espécie humana. E, embora acreditando no poder seleccionador e transformador do homem sobre outras espécies, apenas considerava a capacidade humana «pelo grande efeito produzido pela acumulação de uma mesma direcção, durante gerações sucessivas, de diferenças absolutamente inapreciáveis para olhos inexperientes» (76). Esta ideia foi ultrapassada pela história. O campo da intervenção modificadora do homem na evolução das espécies animais e vegetais alarga-se dia a dia. Quando nos lembramos de que o visconde de Coruche, justificando o atraso da agricultura, julgou ter encontrado argumento irrespondível e definitivo ao referir que «não é possível produzir hoje cereais, linho, lã, uvas, batatas ou laranjas em menos tempo do que em outras eras» (77), não podemos deixar de sorrir, porque a vida deu já um desmentido literal à fraca ironia do visconde.

 

O poder do homem permite-lhe construir o seu próprio futuro. Não há qualquer lei natural, quaisquer razões biológicas ou técnicas que limitem o ritmo da produção das subsistências. Esse ritmo depende apenas da acção do homem. De há muito o homem dispõe de meios técnicos capazes de inverter as progressões nos dois termos da «lei» de Malthus.

 

Com métodos rudimentares, apenas à custa de trabalho e da sua imaginação criadora, pôde o povo português transformar, em vastas regiões, a fisionomia agrícola de Portugal. Nas encostas nuas do Douro ergueu essa monumental escadaria onde hoje se exibem os vinhedos que dão do melhor vinho do mundo. Nas íngremes vertentes e nos vales apertados do Minho, de Trás-os-Montes, da Beira, da Estremadura, foi também dispondo e segurando em socalcos terra trazida à força de braços e foi buscar às entranhas da terra água para fazer verdejar jardins. Desde o canteiro minúsculo ao retalho rendoso, solo fértil surgiu onde ontem existiam apenas penedias. Terras minhotas, naturalmente pobres, tornaram-se terras ricas pela rega e estrumagens. Nas areias sáfaras da Gafanha ou da Póvoa ou nas dunas das Caldas, com adubações intensas de caranguejo, de sargaços, de moliço, nasceram belas hortas. Nas serras mais pedregosas - na Estrela, na de Aire, em tantas outras - das fendas da pedra brotaram olivais ou, nos ásperos declives, manchas lavradas. Nas charnecas alentejanas e na borda do Tejo, os seareiros romperam os matagais e obrigaram a terra a dar pão. Nos «foros» de Almeirim, Mugem, Salvaterra, culturas viçosas surgiram como oásis em campos de areia. Na generalidade dos casos, todo esse esforço gigantesco, realizado com a miragem de uma vida desafogada, revelou-se uma ilusão para os seus autores. Uns semearam, outros colheram. Mas esse esforço evidencia o poder do homem, evidencia como o homem pode impor e impõe à natureza uma direcção, como pode arrancar e arranca da terra as subsistências que ela por si só recusa, como pode modificar e modifica a terra, as espécies vivas, a paisagem. E se isto pôde fazer o nosso povo à força de braço e de imaginação, mas apegado a recursos velhos de séculos, o que não poderá ele fazer ganhando para o seu serviço a ciência e a técnica modernas?

 

Quando nos dizem e repetem ser Portugal país pobre, de solo fraco, de terreno acidentado e pedregoso, de clima irregular, e quando assim pretendem amarrar o povo português a um irremediável destino de miséria - nós respondemos que não só o nosso país tem raras e favoráveis aptidões agrícolas, como pode o nosso povo transformá-lo num verdadeiro jardim da Europa à beira-mar, que só o é no entender dos poetas.

 

Centenas de milhares de hectares no Alentejo, nos incultos e nas terras áridas sem fim podem encher-se de campos vicejantes com águas levadas das bacias do Tejo e do Guadiana ou arrancadas aos lençóis subterrâneos. Os rios podem ser dominados e disciplinados, dando rega e energia, em vez de enxurradas e cheias devastadoras, alternando com secas. Grandes manchas de floresta podem levantar-se em montes descarnados, em areias nuas, em terrenos pantanosos, também junto às linhas de água, dando novos meios de vida, formando cortinas de protecção contra os ventos prejudiciais e contra as areias e torrentes, aumentando a capacidade de absorção de humidade pelos solos, diminuindo o escoamento e a evaporação, facilitando a condensação do vapor de água da atmosfera, defendendo o solo da erosão, dando até melhor ar para o homem respirar e paisagem mais bela para alegria dos olhos.

 

A oliveira e a nogueira, os freixos e ulmos, o eucalipto e a acácia tornarão ricas e acolhedoras zonas hoje desérticas. A arborização de cumes rochosos de onde as torrentes trazem marés de areia salvará magníficos terrenos de aluvião da ameaça agora iminente da ruína e da esterilidade. A regulamentação do regime das águas abundantes das Beiras oferecerá prados onde se multiplicará o gado. A defesa das cheias, o enxugo, a drenagem, darão produtividade insuspeitada aos aluviões do Mondego e dos seus afluentes, às margens do Lis, às baixas dos afluentes do Tejo, particularmente do Sorraia, assim como aos «focos miasmáticos e palustres» do sul do Tejo. Os ricos fundos dos pauis e brejos numerosos podem ser roubados às águas estagnadas. Pela defesa das marés, o dessalgamento, a drenagem e a irrigação podem tornar-se fertilíssimos os aluviões marítimos e fluviais do Algarve e os vastos sapais do Ribatejo, ilhotas e esteiros no delta do Vouga e podem ser libertados da esterilidade.

 

Podem fabricar-se solos ricos das terras pobres. Podem escolher-se, seleccionar-se e criar-se os tipos de plantas mais apropriados ao meio português, ou, mais exactamente, aos diversos meios portugueses. Podem obter-se plantas mais rendosas e também animais mais rendosos: podem apressar-se os prazos de maturação das plantas e de desenvolvimento dos animais. Uma planificação da agricultura permitirá um melhor aproveitamento do solo nacional. Com as máquinas e a técnica ao seu serviço, o trabalho será menos penoso e renderá incomparavelmente mais. Haverá mais fartura nos lares e sairá do que se produz para a compra do que se necessita.

 

Temos no nosso próprio país todo um novo país a conquistar, um país mais fértil e até mais belo. Temos todas as condições naturais para uma vida desafogada para todos os portugueses. Que se chame a isto um sonho: são legítimos os sonhos de quem dá a vida para realizá-los. Mas não, não é apenas um sonho. Acrescentando-se à simples consideração dos factos nacionais, o triunfo do socialismo em grande parte do mundo dá a certeza de que tal sonho será realizado.

 

Se já no século XIX alguém pôde dizer ter o homem modificado de tal forma a natureza que «os efeitos da sua actividade não podem desaparecer senão com a morte geral do planeta» (78), seguindo o mesmo pensamento os mitchurianos, seguros do carácter material da vida, puderam demonstrar no século XX ser possível «obrigar cada variedade de animais ou vegetais a desenvolver-se e a modificar-se mais rapidamente e no sentido favorável ao homem». Sendo o homem guiado pela máxima de que não podemos esperar as dádivas da natureza, antes é necessário arrancar-lhas, não é possível prever quaisquer limites a essa criadora intervenção humana.

 

Não há qualquer lei natural, quaisquer razões biológicas ou técnicas, qualquer fraqueza de espécie humana, que forcem a agricultura ao atraso. Apenas factores sociais a isso a obrigam.

 

A propriedade privada da terra

 

Se se importam artigos que a agricultura portuguesa produz e concorrem desastrosamente com os de produção nacional; se não se colocam nos mercados internacionais os produtos agrícolas que o mercado interno não pode absorver; se se elevam os preços dos adubos químicos restringindo-se ou impossibilitando-se o seu uso pelos pequenos agricultores; se se obriga ao transporte de adubos por via férrea criando dificuldades ao seu consumo; se, taxando-se preços não compensadores para a pequena produção, forçando-se a uma distribuição centralizada, obrigando-se à venda ao desbarato e à perda de colheitas por falta de mercados, se provoca a restrição das culturas; se, por uma política fiscal regressiva, se sufoca o pequeno agricultor com impostos, levando-o a cortar despesas essenciais ao amanho das terras - é evidente que a acção quotidiana do governo tem efeitos directos e imediatos no nível da produção e da produtividade, nas dificuldades e no atraso da agricultura.

 

Entretanto, o atraso geral da agricultura, a lentidão do seu desenvolvimento, em relação à indústria, resulta, fundamentalmente, da propriedade privada do solo e da exploração dos camponeses, e tais causas não se podem remover dentro do capitalismo.

 

Originando a renda absoluta, impedindo, por isso, que mais-valia criada na agricultura participe na formação da quota média de lucro, provocando a elevação dos preços das matérias-primas necessárias à indústria e dos meios de subsistência - a propriedade privada da terra retarda a acumulação do capital. Obrigando a gastos de capital na compra da terra, desanimando os arrendatários a inverterem capitais na exploração - retarda o progresso agrícola. A propriedade privada da terra é, assim, um entrave ao desenvolvimento das forças produtivas levado a cabo pelo próprio capitalismo.

 

Podem ver-se com um pouco mais de atenção alguns aspectos desta questão primordial.

 

Primeiro aspecto: o obstáculo ao desenvolvimento económico geral pela criação da renda absoluta.

 

O lucro não é senão uma forma da mais-valia e a quota do lucro a relação entre a mais-valia social e o capital social. Uma vez que, dadas as diferenças de produtividade do trabalho, o valor é tanto menor quanto mais elevada for a composição orgânica do capital «se em todos os ramos da produção as mercadorias fossem vendidas pelo seu valor, a quota de lucro seria desigual nos diversos ramos» (79). Os capitalistas teriam quotas de lucros tanto mais elevadas quanto mais baixa fosse a composição orgânica do capital (e mais alta a taxa de mais-valia). Isto não acontece porque, por efeito das transacções de capital e da concorrência, as mercadorias são vendidas nuns casos acima e noutros abaixo do valor, ou seja, são vendidas a preços que correspondem aos preços de produção (despesas de produção mais lucro médio). Desta forma, embora o preço social das mercadorias seja igual ao seu valor social e embora o lucro social seja igual à mais-valia social, existe em cada caso um desnivelamento entre o preço e o valor e entre o lucro e a mais-valia. Forma-se uma quota média de lucro, comum aos sectores onde é elevada e àqueles onde é baixa a composição orgânica do capital.

 

Sendo o preço social das mercadorias igual ao seu valor social, ao venderem os produtos acima do valor, obtendo assim um lucro superior à mais-valia criada nos seus sectores, os capitalistas dos sectores onde é mais elevada a composição orgânica do capital partilham do valor criado não nos seus sectores, mas nos sectores onde a composição orgânica do capital é mais baixa. Isto significa que as indústrias menos evoluídas como que pagam uma «taxa invisível» às mais evoluídas. Esta «taxa invisível» é um factor da acumulação do capital e do desenvolvimento geral do capitalismo. (No capitalismo monopolista, sérias alterações são introduzidas neste processo, sem entretanto o desmentirem.)

 

Como a agricultura é um dos ramos da produção onde a composição orgânica do capital é mais baixa, a mais-valia nela criada devia também ser partilhada pelos capitalistas dos ramos onde a composição orgânica do capital é mais elevada. Se isso sucedesse, a agricultura, pagando a sua «taxa invisível» à indústria, faria elevar a relação entre a mais-valia social e o capital social, isto é, faria elevar a quota média do lucro. Ora, tal não sucede de facto. Na agricultura, dada a baixa composição orgânica do capital (e a elevada taxa de mais-valia), há um excedente da mais-valia nela criada sobre o lucro médio, mas tal excedente não passa para os outros ramos da produção. A propriedade privada da terra, impondo um preço de monopólio (Marx), impede o «nivelamento dos lucros» e mantém no sector agrícola a mais-valia nele criada. O excedente sobre o lucro médio é retido pelo proprietário da terra (seja ou não lavrador) sob a forma de renda.

 

A propriedade privada da terra concebe desta forma a renda absoluta, impede que a mais-valia criada na agricultura participe na formação da quota média de lucro social, faz da agricultura um compartimento vedado da economia nacional e deixa a determinação da quota média de lucro apenas à indústria, onde a composição orgânica do capital é mais elevada (e cada vez mais elevada) e onde, por isso, a quota de lucro tende a ser mais baixa (e cada vez mais baixa). A propriedade privada do solo entrava assim o aumento da quota de lucro e dificulta a acumulação do capital e o desenvolvimento geral do capitalismo.

 

Segundo aspecto: obstáculo ao desenvolvimento da própria agricultura pela renda diferencial. A renda absoluta é, como se acaba de ver, um excedente do preço de produção, ou seja, um excedente do lucro médio. Há, porém, outro excedente do lucro médio provocado pela diferença da produtividade do trabalho derivada da diferença da fertilidade das terras. A sua causa não é especificamente a propriedade privada da terra, mas coexiste com ela e só com ela pode desaparecer.

 

O valor dos produtos agrícolas, tal como o de quaisquer outros produtos, é o tempo de trabalho necessário para a sua produção. Os capitalistas não estão, porém, dispostos a investir os seus capitais em empreendimentos que não lhes assegurem o lucro médio. Dada a desigualdade da fertilidade das terras, as terras menos férteis cultivadas são aquelas onde o valor dos produtos é igual ao preço de produção, ou seja, aquelas em que os capitalistas, vendendo os produtos aos preços gerais do mercado, obtêm a quota média de lucro. Se o valor fosse inferior ao preço de produção, tais terras seriam abandonadas; se fosse superior, entrariam em cultura terras ainda menos férteis. Além disso, a oferta e a procura determinam variações na correspondência entre o preço e o valor, e consequente entrada em cultura ou abandono de terras agrícolas. (Também provocadas pelas alterações na quota média de lucros.) Tais desvios tendem, porém, a compensar-se num ponto de equilíbrio: serem os terrenos menos férteis cultivados aqueles onde o valor dos produtos agrícolas (o tempo necessário para a sua produção) iguala o preço de produção. Isto tem sido esquecido por alguns vulgarizadores de Marx, conduzidos por tal esquecimento a negar a aplicação da lei do valor na agricultura.

 

De outra forma pode exprimir-se a mesma realidade e essa forma permite compreender a renda diferencial. Se só entram em cultura os terrenos que asseguram o lucro médio, isto é o mesmo que dizer que o preço social dos produtos agrícolas é determinado pela produtividade do terreno de mais escassa fertilidade. Nos terrenos mais férteis, o preço individual de produção é inferior ao preço de produção nos terrenos menos férteis. Ao venderem-se os produtos das terras mais férteis, apura-se um excedente sobre o preço individual de produção. Esse excedente, essa diferença entre o preço individual e o preço social da produção, é a renda diferencial, recebida igualmente pelo proprietário da terra.

 

As tabelas 9 e 10 ilustram o que afirmamos.

 

Querendo determinar as diferenças de produtividade resultantes apenas da diferença da fertilidade dos terrenos, temos de admitir que, em terrenos de igual dimensão, a um igual número de horas de trabalho, correspondem produções diferentes. Na hipótese da tabela 9: 180 horas de trabalho estão contidas nos 200 kg produzidos no terreno A, nos 300 kg produzidos no terreno B e nos 400 kg produzidos no terreno C. O valor é determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessário, isto é, 0,6 (540:900).

 

 

TABELA 9

Valor dos produtos agrícolas

 

 

Terrenos

Horas de trabalho

Produção (kg)

Horas por kg

Valor da colheita

A

180

200

0,90

120

B

180

300

0,60

180

C

180

400

0,45

240

 

540

900

0,60

540

 

 

A tabela 10 - ilustração clássica do processo - mostra como o preço social dos produtos agrícolas é determinado pela produtividade no terreno de mais escassa fertilidade. O preço individual de produção no pior terreno é que determina o preço social (como se vê pelo confronto das duas tabelas, esse preço individual é igual ao valor - trabalho socialmente necessário). Para os terrenos B e C o excedente do preço individual é a renda diferencial.

 

 

TABELA 10

Renda diferencial

 

 

Terrenos

Capital

Lucro médio

Preço de produção

Colheita

Preço individual da produção

Preço social da produção

Preço da colheita

Renda

A

100

20

120

200

0,6

0,6

120

---

B

100

20

120

300

0,4

0,6

180

60

C

100

20

120

400

0,3

0,6

240

120

 

300

360

900

---

0,6

540

180

 

 

Pode fazer-se uma objecção: se o preço social da produção é determinado pela produtividade do trabalho no pior terreno, neste o preço social é igual ao preço individual e, portanto, não existe aí esse excedente, isto é, a renda diferencial. Como sucede então que também pelos piores terrenos se cobre renda? Como pode o rendeiro pagar essa renda? Em primeiro lugar: em todos os terrenos, mesmo nos piores, se produz a renda absoluta. Em segundo lugar: o pior terreno pode produzir renda diferencial, se em inversão suplementar de capital num terreno mais fértil o trabalho for menos produtivo do que no pior terreno; a produtividade nessa inversão suplementar substitui a do pior terreno na determinação do preço social dos produtos e, assim, tanto no pior terreno, como na primeira inversão de capital no melhor, se produz renda diferencial. Em terceiro lugar: em muitas pequenas explorações agrícolas (aquelas a que, em geral, cabem os piores terrenos) o rendeiro, não só entrega ao proprietário a renda absoluta e a diferencial quando ela existe, como partilha com ele, ou lhe entrega totalmente, o próprio lucro médio. Tal como sucedia na economia feudal, é entregue ao senhor tudo quanto excede os meios de subsistência do produtor e, às vezes, até parte do trabalho necessário.

 

Compreendida a renda diferencial, compreendem-se novos obstáculos ao desenvolvimento da agricultura. É evidente que um rendeiro pode conseguir obter um considerável aumento da renda diferencial («segunda renda diferencial») com inversões suplementares do capital; mas é também evidente que, nesse caso, não a entrega ao proprietário. Daqui a grande diferença de desejos entre proprietário e rendeiro; o proprietário deseja prazos curtos, para se aproveitar das inversões suplementares de capital na terra e do aumento da sua fertilidade e poder assim aumentar a renda; o rendeiro deseja prazos prolongados que lhe permitem reter a segunda renda diferencial obtida com a inversão de novos capitais; o proprietário deseja beneficiar-se dos melhoramentos que o rendeiro faz; este evita fazê-lo por não estar disposto a «fazer filhos em mulher alheia». Assim se criam dificuldades ao investimento de capitais e, particularmente, ao aumento da composição orgânica do capital na agricultura.

 

Estas dificuldades criadas ao progresso agrícola são reconhecidas mesmo pelos mais apaixonados defensores da propriedade privada da terra e representantes dos proprietários rurais. «O rendeiro empreendedor - diz um técnico - arrisca-se, quando se retirar ou for despedido, a ficar com todo o seu trabalho inutilizado (...) indo todas as benfeitorias, realizadas em prédios que não são seus, favorecer outro ou outros (...). Por isso, na maioria dos casos, não faz melhoramentos ou executa apenas os que considera estritamente indispensáveis, com prejuízo para o proprietário (!) e para a nação» (80). E outro técnico, embora atribuindo ao arrendamento a virtude de «acudir» à falta de terra da parte do rendeiro e à falta de capital da parte do proprietário, reconhece que, «trabalhando em terra alheia, sujeito a renda pesada, o rendeiro não tem interesse em fazer trabalhos e despesas que, aumentando a produção total, diminuam o custo de produção unitária, e não tem interesse porque não tem garantia de não perder os adiantamentos feitos à terra ou de não ver ainda uma parte ou quase tudo do que a mais conseguiu ir ter às mãos do proprietário num ulterior aumento de renda» (81).

 

Ao mesmo tempo que se coíbe de empregar capitais, o rendeiro procura extrair da terra o mais possível, mesmo ao preço do seu esgotamento. Nisto estão também de acordo todos os especialistas. O sistema de arrendamento a 3 anos - lê-se num estudo - «ao mesmo tempo que esgota a fertilidade das terras (pois, em virtude do seu prazo, não se efectuam adubações orgânicas convenientes), não permite a realização de quaisquer melhoramentos fundiários como estábulos, montureiras, silos, etc.» (82). O rendeiro - lê-se noutro estudo - «tira da terra o mais que pode, sem atender à conservação da fertilidade, e nada melhora na incerteza de poder colher o que semeou» (83). Os rendeiros - lê-se noutro estudo «pouco ou nenhum amor podem dedicar a uma terra que só ocasionalmente cultivam e da qual pretendem tirar o máximo rendimento, sem cuidar das consequências futuras». «O solo enfraquece gradualmente» (84). E, sintetizando os efeitos prejudiciais do arrendamento, escreve outro especialista: «Geralmente, uma propriedade rústica arrendada mantém-se indefinidamente no mesmo estado, sem sofrer transformações ou benfeitorias que a melhorem» (85).

 

Tentando vencer esta resistência dos rendeiros ao emprego de capital, os proprietários têm procurado, por vezes, a via da coacção. Uma lei de 1946 (86), ao estabelecer na sua Base XI que «os melhoramentos fundiários realizados pelo senhorio ao abrigo desta lei em prédios arrendados obrigam o arrendatário a compensá-lo do encargo que assumiu, pelo tempo correspondente à duração do arrendamento, acrescido de equitativo aumento de renda», tentou introduzir tal sistema. A falta de aplicação (pelo menos em escala apreciável) deste preceito mostra bem que a causa das magras inversões de capital nas terras arrendadas não é questão de boa ou má vontade do arrendatário, nem de carência de recursos, mas a própria instituição da propriedade privada da terra.

 

Terceiro aspecto: obstáculo ao desenvolvimento económico geral pela existência de capitais improdutivos.

 

A terra, não sendo produto do trabalho, não tem valor. Mas tem preço. Esse preço, além de aumentar com os capitais investidos na terra, tem como origem fundamental o querer o proprietário, vendendo a terra, continuar recebendo o equivalente à renda. A renda é assim transformada em juro e o preço da terra não é mais que «renda capitalizada». O preço da terra, que aumenta com a diminuição da taxa de juro (tendência da economia capitalista), obriga à paralisação de importantes e crescentes capitais e retarda a renovação da composição orgânica do capital resultante da acumulação.

 

Através de tudo quanto fica dito, vê-se bem ser a propriedade privada da terra não só um entrave ao desenvolvimento geral do capitalismo como um entrave particular ao desenvolvimento das forças produtivas na agricultura. A ruína e a expropriação da população rural pelo curso da evolução do capitalismo, a feroz exploração dos camponeses pela burguesia e pelos proprietários rurais e a exploração da aldeia pela cidade impedem que a agricultura acompanhe o desenvolvimento económico geral. Revela-se que, por detrás do atraso agrícola, não estão condições naturais inelutáveis, nem leis biológicas, nem a impotência da espécie humana, mas condições sociais geradas pelo capitalismo.

 

A conhecida afirmação segundo a qual a propriedade privada é instituição baseada na violência ou no roubo não é mais que «uma frase declamatória». Afirmá-la produto do direito natural, outra declamatória frase.

 

Note-se que, para roubar, é necessário existir a propriedade privada e, por isso, a «violência poderá mudar o possuidor, mas não poderá criar a propriedade privada como tal» (87); e note-se que o «direito natural» serve tanto os teorizadores radicais pequeno-burgueses como os ultra-reaccionários. Com a censura ao roubo e à violência e com a apologia do direito natural, tanto se pode condenar como defender a propriedade privada. Tão vazia é a condenação baseada na primeira como a defesa baseada na segunda. Como Marx e Engels enunciaram, a propriedade privada resultou da necessidade do desenvolvimento da produção e do comércio, isto é, de causas econômicas (88).

 

Também a propriedade da terra não foi gerada pela violência, embora a transferência do estado possessório o tenha sido inúmeras vezes. Também ela está ligada (como sublinharam Marx e Engels) a determinadas condições de produção e de troca. Harmonizou-se com as condições das sociedades escravistas e a sociedade feudal, e tomou-se, então, instituição necessária. Não se harmoniza com as próprias do capitalismo e, como este, toma-se dispensável.

 

Que assim o é, mostra-se claramente não só pelos obstáculos que levanta ao desenvolvimento do capitalismo (conforme se acaba de ver) como ainda pela diferenciação, provocada pelo desenvolvimento do capitalismo, entre a propriedade do solo e a exploração agrícola. Por um lado, como «o direito de propriedade da terra é o direito à renda», aquele que empresta dinheiro ao proprietário, recebendo a renda sob a forma de juro, torna-se o efectivo proprietário e a instituição revela-se inútil no processo de produção. Por outro lado, o proprietário rural, que arrenda as suas terras, não as explorando directamente, revela como «está a mais» no processo de produção capitalista - como salientou Marx e, depois, Lénine (89). O progresso do crédito hipotecário e do arrendamento, evidenciando a dissociação da propriedade territorial e da exploração agrícola, a dissociação das entidades proprietário e lavrador, evidencia também o carácter supérfluo da propriedade privada da terra na economia capitalista.

 

 

 

 

 

(*) Este interessantíssimo texto de Álvaro Cunhal, constitui o terceiro capítulo da sua obra ‘Contribuição para o estudo da questão agrária’, a que se acrescentaram os parágrafos inaugurais do capítulo seguinte. Esta obra teve uma primeira edição no Brasil, pela Editora Civilização Brasileira, em 1968, sob o título ‘A questão agrária em Portugal’, sendo reeditada em 1976, em dois volumes, pelas edições Avante!. (primeira edição portuguesa) sob o título mais modesto acima citado. No prefácio à edição brasileira, datado de 1966, Cunhal afirma ter a obra sido escrita “há cerca de dez anos”. Pela correspondência, sabe-se que os seus estudos sobre questões agrárias e sobre Darwin datam do início da década de 1950, no Estabelecimento Prisional de Lisboa. Quando foi transferido para a cadeia de Peniche, em Julho de 1956, Cunhal leva consigo um extenso manuscrito com “um estudo sobre a agricultura portuguesa (possível tese de doutoramento)”. A crítica a Malthus é retomada (em relação à tese de licenciatura sobre o aborto, de 1940), mas desemboca aqui numa negação geral da existência de limites naturais ao crescimento económico e à produtividade do trabalho. Aqui se contém ainda uma das primeiras críticas a António Sérgio a partir dos quadrantes marxistas. A discussão sobre a renda, bastante complexa, revela algumas imprecisões conceituais ou, pelo menos, terminológicas.

 

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NOTAS:

 

(1) Armando Castro, «Contribuição para a Análise da Primeira Estimativa Oficial do Rendimento Nacional Português», Revista de Economia, XII, 1951, p. 199.

 

(2) André Navarro na Assembleia Nacional, Diário das Sessões de 17 de Abril de 1952, p. 704.

 

(3) Henrique de Barros, Economia Agrária, v. II, p. 78.

 

(4) A Agricultura e o País, primeira conferência, 1886, p. 41.

 

(5) Elvino de Brito, Aviso aos Lavradores, in Bernardino Machado, O Ministério das Obras Públicas e Indústria em 1893.

 

(6) Bento Carqueja, O Povo Português. Aspectos Sociais e Económicos, 1916, pp. 95-96, nota.

 

(7) F. A. Almeida Figueiredo, Questões Agrícolas e Agronómicas, 1929, p. 133.

 

(8) Vitória Pires, «A Assistência e a Técnica Agrícola», no Boletim do Ministério da Agricultura, Fevereiro de 1932.

 

(9) Vitória Pires e Paiva Caldeira, Inquérito à Freguesia de Santo Ildefonso do Concelho de Elvas, 1934, pp. 84-85.

 

(10) Henrique de Barros, Economia Agrária, v. I, p. 126.

 

(11) Henrique de Barros, Economia Agrária, v. I, p. 213.

 

(12) Visconde de Coruche, A Agricultura e o País, p. 5.

 

(13) Lénine, A Questão Agrária e os Críticos de Marx, cap. 2 (126).

 

(14) Mário Pereira, A Empresa Agrícola Familiar no Pliocénico ao Sul do Tejo, in JCI, Problemas de Colonização, v. I, p. 63.

 

(15) António Sérgio, «Sobre a Agrobiologia ou Ciência da Agricultura da Abundância», in O Diabo de 24 de Junho, 8 de Julho e 5 de Agosto de 1939.

 

(16) António Sérgio, «As Surpresas Agradáveis da Viagem», O Diabo de 9 de Setembro de 1939.

 

(17) «Sobre a Agrobiologia», O Diabo de 5 de Agosto de 1939.

 

(18) O Diabo de 9 de Setembro de 1939.

 

(19) O Diabo de 24 de Junho de 1939.

 

(20) António Sérgio, História de Portugal, t. I, Introdução geográfica, p. 250.

 

(21) O Diabo de 24 de Junho de 1939.

 

(22) História de Portugal, p. 249.

 

(23) O Diabo de 19 de Agosto de 1939.

 

(24) História de Portugal, p. 250.

 

(25) O Diabo de 19 de Agosto de 1939.

 

(26) Ibidem.

 

(27) Ibidem.

 

(28) História de Portugal, p. 250.

 

(29) Confissões de Um Cooperativista, 1948.

 

(30) Ibidem, 1948, p. 20.

 

(31) Ibidem, 1948, p. 10, itálicos de A. S..

 

(32) Marx, O Capital, t. II, 5.ª secção (127).

 

(33) Malthus, An Essay on Population, III, 1.

 

(34) Idem, Ibidem, I, 1.

 

(35) Idem, Ibidem, IV, 1.

 

(36) Idem, Ibidem, II, XIII.

 

(37) Idem, Ibidem, IV, 1.

 

(38), Idem, Ibidem, III, XIV.

 

(39) Idem, Ibidem, IV, III.

 

(40) Malthus, An Essay on Population, III. 1.

 

(41) Idem, Ibidem, III, V.

 

(42) Idem, lbidem, IV, III.

 

(43) Idem, Ibidem, III, VII.

 

(44) Idem, Ibidem, IV, VI.

 

(45) Idem, Ibidem, IV, X.

 

(46) Idem, ibidem, IV, XI.

 

(47) Idem, Ibidem, IV, VIII.

 

(48) Idem, Ibidem, IV, VIII.

 

(49) Idem, Ibidem, IV, III.

 

(50) Marx, O Capital, t. 2, cap. XVII.

 

(51) Idem, Ibidem.

 

(52) Monthly Bulletin of Statistics, Fevereiro de 1951. Sendo a produção industrial em 1937 = 100, o índice de 1943 é 208.

 

(53) Salient Features of the World Economic Situation 1945-1947. Department of Economic Affairs, ONU, p. 33.

 

(54) Calculado na base de números do Monthly Bulletin of Statistics.

 

(55) William Vogt, Road to Survival.

 

(56) Diário de Notícias de 24 de Novembro de 1950.

 

(57) Ferreira Dias, Linha de Rumo, p. 87.

 

(58) Armando Cândido na Assembleia Nacional, Diário das Sessões de 4 de Março de 1952, p. 378.

 

(59) Henrique de Barros, Economia Agrária, I, p. 206.

 

(60) Marques Guedes, «Os Males Patentes da Erosão e a Nossa Política de Hidráulica Agrícola» (artigo em que, talvez por esquecimento, não se fala da hidráulica agrícola), Diário de Notícias de 14 de Julho de 1952.

 

(61) André Navarro, Novas Rotas - Velhos Rumos, cit. Diário das Sessões de 4 de Março de 1952, p. 365.

 

(62) Galiano Tavares na Assembleia Nacional, Diário de Notícias, 31 de Janeiro de 1952.

 

(63) Bertrand Nogaro, Curso de Economia Política, in Panorama da Ciência Económica, V. III, p. 127.

 

(64) A. A. Mendes Correia, «A Alimentação do Povo Português», in Rev. do C. E. Demográficos, n.° 6.

 

(65) Economic and Commercial Conditions of Spain, Board of Trade, Abril de 1948, p. 21.

 

(66) Bardon, B. Ayala, F. Casado e G. Diaz, «El Gran Inventario de Ia Riqueza Nacional», Revista de Economia, Junho de 1950.

 

(67) The Origin of Species by Means of Natural Selection or the Preservation of Favored Races in the Struggle for Life, Ed. The Modern Library, New York, III, p. 53.

 

(68) The Origin of Species..., VII, p. 182.

 

(69) lbidem, X, p. 249.

 

(70) Ibidem, XV, p. 351.

 

(71) Ibidem, IV, p. 64.

 

(72) Ibidem, Conclusão, p. 373.

 

(73) The Descent of Man and Selection in Relation to Sex, Ed. The Modern Library, VI, p. 513.

 

(74) Ibidem, III, pp. 467-468; VIII, pp. 570-571; XIII, p. 697; IV, pp. 480-481; V, p. 498; etc..

 

(75) Ibidem, Conclusão, pp. 919-920.

 

(76) The Origin of Species..., I, p. 30.

 

(77) Visconde de Coruche, A Agricultura e o País, p. 7.

 

(78) Engels, Dialéctica da Natureza, Introd., p. 127.

 

(79) Engels, Anti-Dühring, VII-VIII.

 

(80) Francisco A. M. Vilhena, Inquérito à Freguesia de Santo Tirso, p. 137.

 

(81) Lima Basto, Alguns Aspectos..., pp. 413-414.

 

(82) Vitória Pires e Paiva Caldeira, Inquérito à Freguesia de Santo Ildefonso, p. 33.

 

(83) J R. Vaz Pinto, A Colonização do Pliocénico, Campo Aberto à Iniciativa Particular, JCI, Problemas de Colonização, V. I, p. 78.

 

(84) João de Sousa e Melo, A Propriedade e a Exploração na Mancha Pliocénica ao sul do Tejo, p. 26.

 

(85) Lima Basto, cit. E. Castro Caldas, Formas de Exploração da Propriedade Rústica, pp. 187-188.

 

(86) Lei n.° 2017, de 25 de Junho de 1946.

 

(87) Engels, Anti-Dühring, Secção 2.ª, II.

 

(88) Idem, Ibidem.

 

(89) Lénine, A Questão Agrária e os Críticos de Marx, cap. II.