Elementos de um Novo Bandung

Para uma Frente de Solidariedade Internacional

 

 

Paris Yeros (*)

 

 

 

A situação pré-revolucionária mundial

 

Estamos no limiar de uma situação revolucionária mundial. Podemos ter a certeza agora de que mobilizações em massa e surtos insurrecionais em série ocorrerão ao longo dessa década e que eles representarão muito mais do que uma fase passageira de inquietação social. A polarização está bastante avançada nas periferias da economia mundial e deu um salto também nas economias centrais desde 2008. Crença nos princípios neoliberais tem sido abalada pela crise prolongada e pela contínua ascensão da China. A tragédia pandêmica alterou ainda mais as condições subjetivas em todo o mundo. O momento histórico decisivo que definirá o século XXI e além está sobre nós.

 

Mas as fissuras na arquitetura do capitalismo monopolista não irão, por si, propiciar uma transição mundial para o socialismo. O imperialismo persistirá num impasse neocolonial. Isso só poderá ser rompido com uma ideologia coerente, organização e solidariedade a nível internacional. O que se requer é um movimento para um Novo Bandung de Camponesas(es), Trabalhadoras(es) e Povos, uma frente de solidariedade internacional fundada no Terceiro Mundo com uma perspetiva socialista e anti-imperialista.

 

Após meio século de ataque neoliberal, as contradições se acumularam para além de qualquer contenção. O imperialismo travou uma guerra contra as aspirações de libertação dos povos do Terceiro Mundo numa tentativa de retroceder o relógio da descolonização. Empregou todo seu arsenal de poder monopolista, financeiro e militar, desencadeou sanções e vigilância, realizou invasões, golpes, guerra por procuração, e desestabilização sistemática. Ao conter a maior parte do Terceiro Mundo, o imperialismo prevaleceu sobre o sistema soviético no Leste e minou o Estado de bem-estar no Ocidente. Porém as contradições continuam a se acumular e o imperialismo tem sido incapaz de resolver sua crise econômica, que é uma crise permanente do capitalismo monopolista.

 

O choque pandêmico comprimiu e acelerou o curso das contradições. Em 2020, a economia capitalista mais uma vez estancou e expôs perante o mundo sua verdadeira imagem. Esse é um mundo de corporações gigantes que manipulam o planeta com as pontas dos dedos, onde bilionários derivam grandes fortunas da miséria e da destruição. Um mundo cujas fissuras ecológicas causam catástrofes em série para a saúde pública. Um mundo no qual raça, casta e patriarcado são princípios operacionais de gestão da crise e segregação. Um mundo no qual centenas de milhões de vidas entre (as)os mais vulneráveis são ceifadas impunemente. Um mundo cujo trabalho mais fundamental na produção, distribuição e reprodução é grosseiramente desvalorizado ou não remunerado. Um mundo no qual o grosso das necessidades básicas – alimento, suprimentos básicos, vacinas, serviços de saúde, internet, escola, transporte, moradia – está à mercê de monopólios com necessidades de acumulação insaciáveis. Esse é um mundo em que as periferias ainda servem às ordens dos centros, como amortecedores de crises e bodes expiatórios civilizacionais.

 

O fim da Guerra Fria alterou os parâmetros da luta, mas a principal contradição entre imperialismo e povos do Terceiro Mundo permanece. Nem o fim de impérios ou o colapso da União Soviética, nem mesmo o surgimento da China deslocaram a centralidade dessa contradição. O que mudou foi o caráter dos dois aspetos dessa contradição: o capital monopolista acelerou o caminho da centralização e financeirização, absorvendo as burguesias periféricas em sua estratégia global, enquanto os povos do Terceiro Mundo entraram em fase de semiproletarização generalizada. A força motriz da mudança histórica portanto permanece essencialmente a mesma: as(os) camponesas(es), trabalhadoras(es) e povos marginalizados do Terceiro Mundo. E é aqui que a chama se manteve acesa na luta contra o assalto imperialista e o aprofundamento da polarização.

 

Mal a tinta secou nos acordos que dissolveram a União Soviética, um levante de povos indígenas no estado de Chiapas, no sul do México, perfurou os projetos imperialistas e anunciou uma nova época de luta. Os zapatistas cavaram um território autônomo revolucionário, defendido pelas armas até os dias de hoje. Desde então, testemunhamos duas situações revolucionárias robustas, na Venezuela e no Zimbabwe, cujo radicalismo alterou as relações de forças internamente e em regiões inteiras, galvanizando a resistência anti-imperialista. E testemunhamos implacáveis mobilizações de massa, lutas armadas e pressões insurrecionais em todas as regiões do Terceiro Mundo: uma guerra popular de uma década no Nepal até 2006; a Primavera Árabe de 2010; os protestos em curso no Haiti desde 2018; a explosão social na América do Sul em 2019; uma mobilização de massa sustentada por agricultoras(es) e outros movimentos na Índia desde o final de 2020; e a lista continua.

 

O Norte também não foi poupado. De fato, esperança foi criada pelas novas lutas, especialmente nos Estados Unidos da América, o centro organizador do sistema imperialista. A intensificação das lutas em meio à catástrofe pandêmica teve um efeito singular nos níveis de consciência política em todo o mundo. Em maio de 2020, uma corajosa revolta popular contra a brutalidade policial racista encorajou movimentos contra o racismo, casteísmo e violência policial pelo Norte e pelo Sul, da França e Grã-Bretanha ao Brasil, Nigéria e Índia. Essa sequência de eventos demonstrou o poder latente da solidariedade internacional entre os povos oprimidos. Foi plenamente justificada a afirmação de Ângela Davis feita após os protestos de Ferguson em 2014, de que “as pessoas estão prontas para um movimento”. No entanto, a implacável cooptação dos protestos no Norte pelas ONGs continua a pesar na política nacional e na solidariedade internacional.

 

O que realmente está em jogo agora? As respostas mais contundentes vieram da Palestina, uma das situações coloniais remanescentes, e do Afeganistão, o arquétipo do semicolonialismo moderno. Em maio de 2021, uma nova onda de rebeliões em toda a Palestina histórica foi respondida com violência genocida pelo estado sionista com o total apoio do imperialismo. Choveram bombas no enclave de Gaza, densamente povoado, matando 260 pessoas em apenas duas semanas, um quarto delas crianças, e ferindo mais de 2.000. Enquanto isso, no Afeganistão, o imperialismo mostrou o quão longe está disposto a ir para obter controle direto sobre posições estratégicas: vinte anos de ocupação militar, um trilhão de dólares gastos, mais de 100.000 tropas mobilizadas em seu auge, e possivelmente um total de 200.000 mortos ou feridos combinados entre a população militar, policial e civil num período de vinte anos. Isso não deixa dúvidas sobre o que espera os povos do Terceiro Mundo no século XXI: o imperialismo continuará a perpetrar e a patrocinar o genocídio, sem qualquer restrição moral.

 

Os povos sob situações neocoloniais ou outras semicoloniais estão na mesma linha de fogo. Esse é um fato muito bem conhecido pelos povos indígenas e negros, sujeitos ao genocídio em curso nos estados de assentamento colonial branco das Américas; ou os povos invadidos de novo pela máquina de guerra imperialista e seus representantes no Caribe, no Norte e no Corno de África, no Sahel, e na Ásia Ocidental; ou os povos marcados por discriminação racial, de casta, étnico-comunal e religiosa em países encurralados por forças neofascistas ascendentes; ou mesmo os povos sujeitos a infindáveis sanções imperialistas e desestabilização, em Cuba, Venezuela, Zimbabwe, Iran, e Coréia do Norte. Centenas de bases militares estadunidenses persistem em todos os cantos do planeta, gerando conflitos e acometendo sobre as fragilidades dos países periféricos.

 

É necessário tirar as conclusões corretas sobre qual solidariedade é necessária para que a situação revolucionária no mundo possa atingir seu pleno potencial. O risco é que o potencial do presente seja desperdiçado, e a humanidade entregue à barbárie de uma vez por todas. Novos apelos por unidade e organização internacionais estão sendo feitos; e diversas organizações com desígnio internacionalista já existem, ou estão sendo formadas. Mas uma frente de solidariedade internacional do Terceiro Mundo com uma perspetiva revolucionária e anti-imperialista permanece questão em aberto.

 

O risco também é que uma “esquerda” pró-imperialista prevaleça com sensibilidades eurocêntricas e social-reformistas, para falar de boca para fora das aspirações de libertação dos povos do Terceiro Mundo. Já um esforço de reforma de última hora está em andamento para salvar o capitalismo monopolista de sua obsolescência, prometendo “economia verde” e benefícios materiais para o topo das classes trabalhadoras assalariadas, concentradas nos centros imperialistas. Isso também falhará e os bodes expiatórios serão novamente os mesmos. A condenação ao reformismo social feita por Lenin há um século é mais pertinente agora do que nunca. Uma plena crise existencial está se desenrolando para a maioria da população mundial, as(os) camponesas(es), trabalhadoras(es) e povos do Terceiro Mundo.

 

Camponesas(es), trabalhadoras(es) e povos

 

A economia mundial capitalista está cumprindo sua lógica essencial percebida há muito tempo por Karl Marx no que diz respeito ao crescimento inexorável de uma superpopulação relativa, não direta ou regularmente empregada e remunerada pelo capital. Pela distribuição atual de regimes de trabalho ao redor do mundo, é de se entender que se confunda esse capitalismo monopolista obsoleto com um sistema pós-capitalista!

 

Bem mais da metade da população economicamente ativa não está envolvida em empregos assalariados; está envolvida em trabalho autônomo ou trabalho familiar não-remunerado, ou está desempregada. E enquanto a proletarização avançou sob o neoliberalismo pela proporção de trabalho remunerado que aumentou em relação ao não remunerado, o crescimento dos autônomos ficou logo atrás. O desemprego global também continua a crescer em termos absolutos, enquanto o desemprego, especialmente entre os jovens de 15 a 24 anos de idade, está devastando o Sul global.

 

Se avaliarmos ainda mais os grandes e crescentes contingentes de populações de menores de 15 anos dependentes de pessoas economicamente ativas na África, Ásia e América Latina e Caribe, essas diferenças ganham uma dimensão qualitativamente nova. Talvez até dois terços da população mundial viva em famílias que levam uma existência com uma relação tênue, irregular e esporádica com o trabalho assalariado. Essa situação só se intensificará à medida que mais dois bilhões (milhares de milhões) de jovens atingirem a idade ativa, em meados do século, principalmente nas reservas de mão-de-obra nas periferias. Portanto, não podemos falar apropriadamente da condição proletária como uma característica universal do capitalismo monopolista realmente existente nesta fase tardia do neocolonialismo.

 

Devemos primeiro reconhecer que o imperialismo mantém duas reservas de trabalho distintas nos centros e nas periferias. Nos centros imperialistas, antes da pandemia, o proletariado consistia em, aproximadamente, 86% da população em idade ativa, seguido por 78% na Europa Central e do Sudeste, 65% na América Latina e Caribe, 50% no norte da África e Leste Asiático, chegando a 21% no sul da Ásia e na África Subsaariana, de acordo com dados fornecidos pela Organização Internacional do Trabalho. Por outro lado, a população trabalhadora não-remunerada (o trabalho autônomo ou familiar não-remunerado) era mais baixa nos centros imperialistas, cerca de 10%, seguida de 20% na Europa Central e do Sudeste, 32% na América Latina e no Caribe, 26–31% no Norte da África e no Leste Asiático, e até 78% no Sul da Ásia e na África Subsaariana, onde, de fato, o crescimento populacional é maior. O tamanho das duas reservas de trabalho difere dramaticamente; aqueles nos centros imperialistas também têm uma interação mais estreita com o exército de trabalho ativo no mundo – o proletariado propriamente dito – que está concentrado nos centros. Condições muito diferentes, de marginalidade maciça e permanente, prevalecem nas formações sociais periféricas.

 

Se considerarmos ainda a relação intrínseca entre o trabalho produtivo e reprodutivo, em todos os regimes de trabalho, e que o trabalho reprodutivo é realizado preponderantemente por mulheres, é evidente que bem mais de dois terços das reservas de trabalho do mundo consistem de mulheres. Este enorme contingente de mulheres nas reservas de trabalho está também situado principalmente nas periferias da economia mundial, abrangendo diversas atividades econômicas que se ramificam, do trabalho doméstico ao de cuidados. A condição semiproletária generalizada das formações sociais periféricas é estruturalmente feminizada e dependente, em escala maciça, de regimes de trabalho sexualmente segmentados e do trabalho reprodutivo não remunerado, especialmente de mulheres. É aqui que o maior fardo da crise permanente do capitalismo monopolista é sistematicamente depositado, um fato que aparece rotineiramente em estatísticas sombrias sobre analfabetismo e desnutrição das mulheres, mortalidade infantil e violência baseada no gênero contra mulheres e meninas, bem como contra pessoas de orientações de sexo e gênero não conformistas e não-binárias.

 

O peso dos diferentes setores econômicos na economia mundial é ainda mais significativo: nos centros imperialistas, antes da pandemia, apenas 4% da população em idade ativa estava na agricultura, ao lado de 23% na indústria e 73% nos serviços. Isto compara-se com19, 26 e 55%, na agricultura, indústria e serviços, respetivamente, na Europa Central e do Sudeste; 16, 22 e 62% na América Latina e Caribe; 28, 23 e 49% na África do Norte; 34, 29 e 37% no Leste Asiático; 51, 20 e 28% no Sul da Ásia; e 62, 9 e 29% na África Subsaariana. A população agrícola mundial está quase inteiramente localizada nas periferias, e este é, em geral, um campesinato pobre e semiproletarizado.

 

É também o caso que, onde já ocorreu um forte êxodo rural nas periferias, a população migrante foi direcionada para a prestação de serviços e para a pequena produção, onde também prevalecem o trabalho autônomo e a informalidade. Os setores de serviços, nos degraus mais baixos dos sistemas globais de valor, têm se tornado cada vez mais os depositários da superpopulação relativa do mundo. Esse é o caso mais marcante na América Latina e no Caribe, mas é o caso da maioria das regiões onde o equilíbrio rural-urbano se inverteu no século XX, sem a criação de empregos seguros nas áreas urbanas, seja nos serviços ou na indústria.

 

Existe mais uma dimensão desta realidade. A força de trabalho industrial mundial também está concentrada nas periferias da economia mundial, possivelmente até 80% dela! Já não é o caso que os centros imperialistas detenham a maior parte da força de trabalho industrial; eles mudaram para serviços de ponta em sistemas globais de valor. Nas periferias, mesmo onde o êxodo fluiu para o emprego industrial, isso não implicou em contratos formais e grandes configurações fabris organizadas; sob os sistemas de valores globais contemporâneos, a atividade industrial tende fortemente à fragmentação e informalização. Isso se aplica a grandes empregadores industriais, como a Índia, onde a informalidade é extrema; e a China, fábrica do mundo, onde uma população rural-urbana flutuante foi mobilizada para servir ao crescimento puxado pelas exportações.

 

A conclusão geral a ser tirada é a seguinte: a situação neocolonial tardia é caracterizada por uma condição generalizada de semiproletarização nas reservas de trabalho periféricas da economia mundial. As formações sociais nas periferias ganham características particulares de uma região para a outra, mas estão todas permanentemente presas em uma relação decadente entre regimes de trabalho remunerado e não-remunerado, abrangendo campos, cidades, litorais, setores econômicos e fronteiras internacionais, entre famílias que se espalham sobre grandes distâncias, em sua luta por salários, pequena acumulação e reprodução social.

A semiproletarização não é uma condição nova. Lenin a identificou nos campos da Rússia imperial e chamou a atenção para a importância política do povo trabalhador não-proletário; Mao observou cuidadosamente o semiproletariado nas condições específicas da China semicolonial ao lado de outras classes. Na situação neocolonial tardia de hoje, a semiproletarização não é incipiente nem conjuntural, é uma condição generalizada e permanentemente instalada nas reservas de trabalho das periferias. Isso também quer dizer que a própria urbanização não completa o processo de proletarização; ela produz uma população massiva de gente semiproletarizada, tanto nas cidades como nos campos, e em fluxo entre os dois.

 

A outra conclusão é que, independentemente da distribuição das relações inter-setoriais ao redor do mundo, a questão agrária sob o imperialismo permanece sem solução em escala mundial. A semiproletarização não resolveu a questão agrária; ilusões a respeito da “descamponesação” ou do fim da questão agrária, ou até mesmo do seu rebaixamento a um problema do “Terceiro Mundo”, devem ser confrontadas abertamente. A questão agrária é uma questão global, enquanto o fardo de sua não-resolução é carregado principalmente pelas(os) camponesas(es) semiproletarizados, trabalhadoras(es) e povos marginalizados que estão presos em áreas degradadas e favelas urbanas, ou de outros modos arriscam suas vidas para migrar para o exterior. Essa, afinal, é a lógica essencial do imperialismo: apropriar-se da força de trabalho, dos recursos naturais, das agriculturas das periferias e semiperiferias, enquanto degrada as capacidades dos povos do Terceiro Mundo de desfrutar da riqueza produzida por seu próprio trabalho e suas dotações naturais; e não menos importante, expelindo os custos sociais e ambientais dessa apropriação para o próprio Terceiro Mundo.

 

O semiproletariado ocupa um largo espectro de posições, apesar de seu destino comum. Inclui camponeses pobres e agricultores sob contrato, trabalhadores agrícolas sazonais, pescadores, indígenas, quilombolas, povos pastoris e outros povos tradicionais, trabalhadoras(es) urbanos informais, trabalhadoras(es) autônomas(os), entregadoras(es), trabalhadoras(es) em domicílio, donas de casa e empregadas(os) domésticas(os). Essa condição semiproletária generalizada ocupa o estágio central em uma formação social que inclui outros segmentos de classe e classes próximas, a saber: o lumpen-proletariado dos permanentemente excluídos e indigentes imersos na desesperança, recrutados pelo crime ou aprisionadas(os) pela exploração sexual, as(os) encurraladas(os) em organizações fundamentalistas ou mobilizados por campanhas midiáticas predatórias, como contra a “corrupção”; o proletariado, composto por trabalhadoras(es) mais assegurados, nos setores público ou privado, que podem se engajar em greves, mas não podem, por si sós, superar a perspetiva corporativista; e as pequenas-burguesias, as pequenas empresas capitalistas em áreas urbanas e rurais sujeitas a variadas políticas e perspetivas de acumulação – às quais aspira uma boa parte do semiproletariado.

 

O semiproletariado, em toda sua heterogeneidade, constitui uma força de trabalho cujo leque de reivindicações sociopolíticas é evidente: antes de mais nada, o acesso à terra e ao território, que é o elemento mais concreto da produção, residência e da reprodução social; acesso a mercados para a pequena produção e distribuição com uma estrutura adequada de preços; acesso a salários, condições de trabalho e pensões dignos; acesso a serviços sociais gratuitos e de qualidade, pré-escola, educação, saúde, água, saneamento, e transporte público, gozo de paz e proteção contra a violência doméstica, racial, de casta, comunal, relacionada às drogas, paraestatal e, não menos importante, do próprio aparelho estatal. Estas são as necessidades urgentes para a maioria das famílias rurais e urbanas na condição de semiproletarização.

 

O leque de demandas só é superado pela diversidade de partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais urbanos, movimentos sociais rurais, organizações não-governamentais, organizações religiosas, organizações criminosas e entidades beneficentes que buscam e se firmam na vulnerabilidade social e desorganização política das formações sociais semiproletarizadas. A penetração política pelo Norte, via financiamento, de ONGs, sindicatos, movimentos sociais, instituições de caridade e ordens religiosas do Sul continua endêmica. Organizações religiosas fundamentalistas também prosperaram na situação neocolonial tardia, sejam das tradições cristã, islâmica ou hindu, em toda a África, Ásia, América Latina e Caribe, para propagar a lumpenização ideológica da sociedade. Há também um ativismo midiático social galopante que alimenta e amplia todas as tendências, mas permanece sob o controle dos monopólios corporativos.

 

As armadilhas da condição semiproletarizada também se estendem às forças progressistas. Se há meio século Frantz Fanon tinha acionado o alarme sobre o papel da pequena burguesia na luta de libertação, ele não é menos válido hoje em relação às ideologias pequeno-burguesas que consomem movimentos inteiros e até são alimentadas pelo imperialismo. Especialmente o foco em questões únicas e a consequente fragmentação política levaram a um beco sem saída organizacional e ideológico. Isso permanece conveniente e útil para as classes dominantes domésticas e seus patronos imperialistas. O elemento que falta é uma força unificadora com uma perspetiva libertadora, capaz de articular as demandas sociopolíticas diversas à resolução das questões nacionais e pan-nacionais e à resistência ao imperialismo. Sob o neocolonialismo tardio não há substituto para uma perspetiva da libertação nacional na luta revolucionária. A real questão diz respeito à sua precisa base de classe e caráter ideológico, bem como a suas alianças internas e externas; a tarefa persiste em identificar corretamente os inimigos e amigos da revolução.

 

O reducionismo é abundante; e vai contra a natureza da condição semiproletarizada desorientar a unidade nacional e a solidariedade internacional. A dicotomia reducionista entre o urbano e o rural é uma das mais estabelecidas, mas continua a falhar na política. É essencialmente uma postura anticamponesa e anti-indígena baseada no eurocentrismo e em noções economicistas sobre quem é o agente natural e potencial da revolução. É também uma postura patriarcal, cega aos vínculos rural-urbano entre produção e reprodução.

 

A dicotomia mais fundamental apresenta-se como um conflito entre “cultura” e “classe”. A luta hoje em torno da “política de identidade” acrescentou um novo grau de complexidade. O conflito essencial surge de uma luta centenária para transformar o marxismo em um instrumento revolucionário para o Terceiro Mundo, que sempre foi composto de grandes campesinatos e povos indígenas e marginalizados sob condições coloniais, de colónias de povoamento e neocoloniais. É uma luta para superar o que Amílcar Cabral chamou de “desconexão” da libertação nacional da sua estrutura social, o que leva a deficiências ideológicas. Sob o capitalismo realmente existente, não há força econômica ou social desprovida de cultura. E sob o neocolonialismo tardio, os mais explorados são também os mais oprimidos historicamente. Remover a libertação da luta de classes, que afinal é uma luta pela renovação civilizacional, é tão cego quanto negar que a opressão tem uma base de classe no imperialismo.

 

Posturas ideológicas pequeno-burguesas, corporativistas e reacionárias continuam a desorientar as solidariedades, a nível nacional e internacional, bem como a análise adequada das contradições em evolução. Continua a verificar-se que a ideologia proletária fornece a estrutura analítica mais completa para a compreensão de todo o espectro de contradições do capitalismo monopolista. Nenhuma outra fonte ideológica única pode cumprir a tarefa revolucionária no século XXI. Mas a ideologia proletária não pode mais ser vista como sendo naturalmente pertencente o proletariado – não é! Tampouco pode ser vista como inatingível por povos semiproletarizados, ou mesmo por segmentos da pequena burguesia. O cooperativismo e a autossuficiência coletiva, os antídotos básicos para o capitalismo monopolista, requerem o cultivo de uma perspetiva proletária que deve recorrer às fontes existentes de solidariedade entre camponesas(es), trabalhadoras(es), indígenas semiproletarizados e outros povos marginalizados. Deve se adaptar às exigências das diversas formas de produção cooperativa, de reprodução social e aos modos de vida que vigoram nos territórios rurais e urbanos.

 

Segue-se que, sob o capitalismo realmente existente, a ideologia proletária só pode crescer a partir das lutas existentes de camponesas(es), trabalhadoras(es), e povos semiproletarizados. Entre as mais lamentáveis das oportunidades perdidas sob o neocolonialismo tardio está o fracasso em reconhecer o potencial radical, especialmente das lutas por terra e território, tanto rural quanto urbano, e sua unificação em uma perspetiva de libertação nacional. Essas são as principais lutas pela produção, reprodução e autonomia das(os) mais oprimidas(os) e exploradas(os), contra os elementos fundiários mais reacionários da sociedade, que são sustentados pelo poder financeiro. O problema se estende ao âmbito da solidariedade internacional em relação aos movimentos pela terra e pelos territórios, de camponeses e indígenas, onde o compromisso é muitas vezes condicional e romântico, se não mesmo ausente.

 

O mesmo problema não é resolvido pelos próprios movimentos camponeses organizados. Há uma forte tendência a reduzir a agenda camponesa, indígena ou urbana a uma questão alimentar ou agroecológica, em oposição à questão da libertação, que é o que sempre foi para os povos oprimidos do Terceiro Mundo. A libertação requer um compromisso inabalável com as questões fundiárias e territoriais do semiproletariado, que unem cidades e campos, mas também clareza sobre o funcionamento das hegemonias supremacistas em torno das questões fundiárias e nacionais, bem como um entendimento mais profundo do funcionamento do capital monopolista. Por mais importantes que sejam as questões da alimentação e da agroecologia para um século XXI revolucionário, muitas vezes, elas serviram para neutralizar o potencial radical do semiproletariado e separar as lutas das(os) mais oprimidas(os), aquelas com influência potencialmente decisiva sobre outras lutas.

 

O que une camponesas(es), trabalhadoras(es) e povos marginalizados na luta de libertação é o controle sobre os meios de produção e reprodução contra ordens racistas, de casta, étnicocomunalistas e patriarcais que sustentam as classes capitalistas dominantes e seus patrões imperialistas. Deve-se observar as particularidades de cada país e região, mas sem perder de vista o desafio da situação revolucionária mundial que se coloca diante de nós. Este desafio requer reflexão profunda e ação decisiva nas frentes nacionais e internacionais.

 

O desafio também se aplica à questão de como se relacionar com as pequenas burguesias e outras frações da classe capitalista, cujas estratégias de acumulação introvertidas podem ter o potencial de servir à libertação nacional. Cada contexto terá suas particularidades que precisam ser devidamente compreendidas. Aplica-se ainda à questão de como se relacionar com os movimentos populares e partidos políticos nos centros imperialistas, aqueles com potencial para se comprometerem com uma solidariedade genuína com as lutas de libertação no Terceiro Mundo. A experiência histórica mostra que as lutas negras e indígenas do Norte têm uma tendência mais forte para se identificarem com os movimentos de libertação do Terceiro Mundo, mas isso não é automático, nem dado ideologicamente.

 

Não há recuperação sem reconstrução

 

O capitalismo monopolista está em crise permanente. Isso significa dizer que a taxa de lucro nos setores geradores de valor no centro do sistema imperialista está em declínio por décadas, desde meados da década de 1960, que é exatamente quando a descolonização avançou decisivamente. Houve apenas duas fases de recuperação parcial, alcançando, no máximo, dois terços do nível de 1965, até à eclosão da crise financeira em 2008, que reduziu os lucros a um terço do nível de 1965.

 

As expectativas atuais para a recuperação póspandêmica no centro imperialista giram em torno de uma taxa de crescimento anual de dois por cento no médio prazo. Prove-se ela maior ou menor, não se trata ainda de recuperação das margens de lucro nos setores geradores de valor. Este é o outro grande obstáculo para o capitalismo observado por Marx há muito tempo: os capitalistas buscarão uma fuga da crise por meio de saltos tecnológicos, e cada salto tecnológico adicionará capital e eliminará trabalho nos setores geradores de valor, reduzindo a taxa de lucro. Hoje, a recuperação dos lucros pelos monopólios ocorre por outros meios: pela degradação do processo de trabalho nas periferias, pela busca de lucros financeiros nas bolhas financeiras e pela escalada da acumulação primitiva e da guerra.

 

A recuperação que deverá ocorrer será estimulada por pacotes de estímulo fiscal e monetário que juntos compõem o tão chamado Plano Biden. Por um lado, as compras de ativos pelo Tesouro já dobraram para oito trilhões de dólares, devido às gigantes compras de ativos pós-2008; por outro, o estímulo fiscal como uma porcentagem do GDP está projetado para ser duas vezes mais amplo do que os do governo Obama depois de 2008, e ainda mais robusto do que os de Roosevelt em 1934. Esses são subsídios inéditos, diretos e indiretos, aos monopólios financeiros e corporativos eles mesmos. E, apesar das aparências keynesianas, o capital internacional financeiro continuará a dominar o poleiro até que rebente a próxima bolha épica.

 

Nada disso é um bom presságio para o Terceiro Mundo, cuja dívida total duplicou na década anterior à pandemia. Dezenas de países correram de volta para o Fundo Monetário Internacional. A questão da recuperação, portanto, não se refere a um caminho alternativo de desenvolvimento. As reservas de trabalho do mundo continuarão a aumentar, o conflito social se intensificará, as sanções e intervenções pseudo-humanitárias aumentarão, enquanto uma parte da força de trabalho nos centros será reposicionada para colher os benefícios do Plano Biden, enquanto durar.

 

A China tem sido a fonte principal de dinamismo para a economia mundial, respondendo por mais de um quarto do crescimento do PIB mundial nos últimos anos. Mas esse dinamismo tem sido contraditório e, por sua própria dependência do capitalismo monopolista ocidental, necessariamente chegará ao fim em sua forma atual. A China deu esperança ao Terceiro Mundo de maneira única, pelo grau de autonomia estratégica que exerceu contra o Ocidente. Sua estratégia de crescimento resultou em um deslocamento das placas tectônicas de comércio e investimento longe do controle do monopólio ocidental. A China forneceu novos investimentos substanciais em desenvolvimento de infraestrutura para preencher um vazio crítico, sem se empenhar a criar as armadilhas de dívida ou militarizar as relações econômicas.

 

No entanto, a estratégia de crescimento da China sustentou as necessidades hiperconsumistas e financeiramente predatórias do Ocidente, ao mesmo tempo que desencadeou seus próprios desequilíbrios internos e bolhas especulativas. Também tem contado com as exportações de matéria-prima e importações de manufaturados das periferias. Esse padrão geral, ainda atendendo às necessidades de acumulação primordiais do Ocidente, continua a pesar contra caminhos alternativos de desenvolvimento. Desde 2013, a Iniciativa Cinturão e Rota, da China, aumentou novamente as apostas. Continua a ser possível – na verdade, é imperativo – que a relação de forças mude ainda mais na crise atual, no interesse da China e de todo o Terceiro Mundo. O crescente reconhecimento, pela própria liderança chinesa, dos graves desequilíbrios internos do país e das ameaças ao seu caráter socialista, agravado por seu impasse terminal com o Ocidente, dá uma nova esperança de que uma mudança mais resoluta em direção ao desenvolvimento autônomo irá ocorrer novamente. É hora de uma nova era de autossuficiência coletiva ser colocada claramente na agenda.

 

Isso seria do interesse de todo o mundo, visto que o Plano Biden é, acima de tudo, um plano de guerra contra a China e todo o mundo, não um plano de recuperação para o mundo. O confronto dos Estados Unidos com a China é uma estratégia de domínio tecnológico na chamada quarta revolução industrial e uma batalha pelo controle dos sistemas globais de valor em setores estratégicos. As apostas tecnológicas estendem-se diretamente ao campo militar, onde todos os elementos da quarta revolução industrial serão mobilizados: inteligência artificial, robótica, sistemas de big data e logística integrada. O cerco militar da China e a expansão das bases militares ao redor do mundo, e o controle das rotas comerciais terrestres e marítimas, da energia e de outros recursos naturais, permanecerão no centro do plano de guerra dos Estados Unidos. O novo megapacto militar secretamente traçado entre os Estados Unidos, a Austrália e o Reino Unido é precisamente a estratégia emergente.

 

Nem pode o chamado Novo Pacto Verde (“Green New Deal”) previsto pelo Plano Biden ser separado do plano de guerra. Sua meta declarada de “emissões líquidas zero” até 2050 só pode ser alcançada por um assalto “verde” ao Terceiro Mundo, para escavar sumidouros de carbono extraterritoriais por meio da apropriação de terras, contra camponesas(es), indígenas e outros povos tradicionais, e criar monoculturas intensivas no uso da água contra a biodiversidade dos trópicos e subtrópicos. O plano é uma negação das obrigações históricas da dívida climática. É, mais precisamente, um plano de escapatória, para compensar as persistentes emissões de carbono dos Estados Unidos e para garantir as necessidades de acumulação de seus monopólios corporativos no setor de energia.

 

Em 2050, o prazo limite declarado do Plano Biden, é provável que o aquecimento global já alcance 1,5°C acima dos níveis pré-industriais se continuar a aumentar na taxa atual, de acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. O impacto nos ecossistemas terrestres, de água doce e costeiros já terá mudado substancialmente as condições de produção e reprodução para os povos mais vulneráveis dos trópicos e subtrópicos. Estas são as regiões, especialmente na África e na Ásia, que são as mais vulneráveis ao declínio da produção agrícola devido à desertificação. Obviamente, é necessária uma mudança rápida e radical de rumo - em termos de padrões de produção, consumo e uso da terra - que não é possível sob a égide dos monopólios e de suas necessidades de acumulação.

 

Não há recuperação sem reconstrução. A reconstrução pode ser entendida de muitas maneiras, mas não significará nada a menos que estabeleça condições de vida e trabalho estáveis e seguras para os povos semiproletarizados do mundo. Isso só pode ser obtido por um novo equilíbrio rural-urbano, que cada região e país deve buscar de acordo com suas próprias necessidades de produção e reprodução. Isso também significa que os sistemas globais de valor e os padrões de consumo privilegiado associados a eles, tanto no Norte quanto no Sul, devem ser superados. Significa ainda afirmar a soberania radical sobre os bens comuns nos trópicos e subtrópicos, no interesse de novos direitos à terra e novos usos da terra, e com base em objetivos claros: padrões mais elevados de consumo e reprodução social para as maiorias semiproletarizadas; produção sustentável e cooperativa; absorção e estabilização da força de trabalho nacional e regional; e desenvolvimento industrial e tecnológico autônomo.

 

O desenvolvimento no século XX foi definido em termos de urbanização. Essa visão agora está extinta. No século XXI, o desenvolvimento deve buscar a reconstrução do mundo por meio de uma via camponesa no campo e de garantias territoriais para os indígenas e demais povos marginalizados, que são as únicas garantias possíveis de equilíbrio rural-urbano, sustentabilidade ecológica e, sim, relações mutuamente benéficas entre Norte e Sul. A contrapartida da via camponesa em zonas urbanas é também, necessariamente, a provisão de condições para o desenvolvimento da pequena produção e da reprodução social. Em outras palavras, o único ponto de partida possível para uma transição mundial para o socialismo é dar suporte à pequena produção que já é a realidade das grandes maiorias que vivem sob o capitalismo monopolista. Os métodos de planejamento devem ser ajustados a esta realidade, de forma a conduzir uma economia pequeno-burguesa para estruturas cooperativas, ao mesmo tempo que a vincula ao desenvolvimento industrial estratégico.

 

Rumo a uma Frente de Solidariedade Internacional

 

Essa mudança de direção poderá ser feita sem solidariedade internacional? Não poderá. A solidariedade internacional hoje permanece ad hoc e ideologicamente incerta. E enquanto inúmeras e corajosas lutas de solidariedade existem e continuam a brotar nas atuais condições insurrecionais, uma frente coordenada de movimentos sociais e partidos políticos enraizados no Terceiro Mundo com perspetiva revolucionária e anti-imperialista não se materializou. É inimaginável que uma perspetiva anti-imperialista comprometida surja espontaneamente, para coordenar e orientar o tipo de reconstrução mundial que é necessária hoje e enfrentar os desafios conhecidos e desconhecidos conforme eles surjam.

 

Uma frente internacional de solidariedade de camponesas(es), trabalhadoras(es) e povos deve surgir e ter como objetivo reiniciar e reforçar uma transição socialista mundial na primeira metade do século XXI. Isso deve ter em seu início um quadro tricontinental de convergência política no espírito de Bandung, para estabelecer princípios de solidariedade internacional e prevenir contra a cooptação por forças pró-imperialistas – seus fundos, capacidades, sensibilidades e agendas. O propósito programático de uma frente de solidariedade internacional deve ser estabelecer uma estrutura de diálogo sistemático entre movimentos e partidos e fornecer apoio ideológico, político e logístico às lutas à medida que elas evoluem.

 

No curto prazo, a estratégia deve ser convocar um novo encontro de Bandung. Esta deve ser uma reunião física de representantes de partidos comunistas selecionados, de base popular, movimentos de libertação nacional com credenciais radicais e movimentos sociais que representem camponesas(es), trabalhadoras(es), indígenas e outros povos tradicionais. A reunião pode ser planejada para 2025, por forma a comemorar o 70° aniversário da conferência afro-asiática de Bandung. Entretanto, devem ser empreendidas várias iniciativas para criar a infraestrutura para a convergência política, incluindo um diálogo estruturado.

 

Uma frente de solidariedade internacional deve começar a ser visualizada. Tal frente não pode aspirar a um nível de centralização que pertence aos partidos políticos nacionais ou movimentos sociais. Porém, a coerência política deve ser buscada, partindo de uma assembleia de representantes, autorizadas(os) por seus partidos políticos e movimentos sociais, e por meio de uma comissão política com funções pré-definidas. A construção de tal assembleia e comissão pode se tornar o objetivo concreto do encontro comemorativo do Novo Bandung. Os partidos e movimentos convidados a participar devem ter filiação em massa comprovada e estruturas democráticas internas e, como as organizações, não depender de fontes externas de financiamento. Todos esses partidos e movimentos devem ser explicitamente guiados por uma perspetiva anti-imperialista, anticolonial e socialista.

 

Camponesas(es), Trabalhadoras(es) e Povos do Mundo, Uni-vos!

 

 

 

 

 

 

 

(*) Paris Yeros é um académico e militante político internacionalista de origem grega. Possui graduação e mestrado em Relações Internacionais (Universidade de Denver, 1990-93), mestrado em História Económica (London School of Economics, 1994) e doutoramento em Relações Internacionais (London School of Economics, 2002). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do ABC Paulista. Também é pesquisador adjunto do Sam Moyo African Institute of Agrarian Studies, Harare, Zimbábue, e editor da sua revista Agrarian South: Journal of Political Economy. Tem experiência na área de Economia Política Internacional, atuando principalmente nos seguintes temas: África, Relações Norte-Sul e Sul-Sul, Estado e Desenvolvimento, Questão Nacional, Questão Racial, Questão Agrária e Movimentos Sociais. Entre os seus livros, destacam-se, como coeditor, Poverty in World Politics: Whose Global Era? (Palgrave MacMillan, 2000), Reclaiming the Land (Zed Books, 2005), Reclaiming the Nation (Pluto Press, 2011), Reclaiming Africa (Springer, 2018), Rethinking the Social Sciences with Sam Moyo (Tulika Books, 2020), Farming and Working Under Contract: (Tulika Books, 2022). A presente intervenção visa reforçar o diálogo entre quadros políticos e intelectuais preocupados com os rumos da solidariedade e da convergência tricontinental. As ideias apresentadas neste ensaio são fruto de pesquisas realizada no âmbito da Rede Sul Agrário (Agrarian South Netowrk, ASN) ao longo de mais de uma década e do Grupo de Estudos sobre “Formações Sociais, Passado e Presente” desta mesma rede, reunido em março-novembro de 2021. Os argumentos se beneficiaram especialmente de discussões com Praveen Jha, Archana Prasad, Max Ajl e Freedom Mazwi. Referências foram excluídas, porém permanecem disponíveis. O artigo foi publicado originalmente em inglês no Agrarian South Network Research Bulletin, N.º 10 (ago.–set.), 2021, pág. 26–40. Esta tradução de Kenia Cardoso para a língua portuguesa (a que demos pequenos retoques), foi publicada originalmente também na Agrarian South Network.