A história secreta da acumulação primitiva

e a economia política clássica

 

 

Michael Perelman (*)

 

 

 

A mensagem de laissez faire da economia política clássica

 

A economia política clássica, as principais obras da literatura económica desde a época de William Petty até à de David Ricardo, apresenta uma fachada imponente. Essas figuras cimeiras do início da economia política forjaram uma nova maneira de pensar sistematicamente sobre assuntos económicos, com pouco mais do que os escritos de homens de negócios e filósofos morais para orientá-los.

 

Por mais de dois séculos, gerações sucessivas de economistas têm elaborado esforçadamente textos para demonstrar como estes primeiros economistas descobriram que os mercados fornecem o mais eficiente método possível para organizar a produção. Essa conclusão é, ostensivamente, a lição pretendida da economia política clássica.

 

A maioria dos leitores contemporâneos de Adam Smith, David Ricardo e dos outros economistas políticos clássicos aceitam o seu trabalho pelo seu valor facial, assumindo que esses primeiros escritores são intransigentes defensores do laissez faire. Na sua maior parte, mesmo muitos marxistas aceitam essa interpretação da economia política clássica.

 

Paralelamente ao seu trabalho de pura teoria económica, os economistas políticos clássicos se comprometeram num projeto paralelo: promover a reconstrução forçada da sociedade para refazê-la como a sua pura sociedade orientada para o mercado. Embora os historiadores económicos possam debater o quão profundamente a maioria das pessoas foi envolvida em atividades de mercado, continua incontestável o facto de que a maioria das pessoas na Grã-Bretanha não se envolveu com entusiasmo no trabalho assalariado - pelo menos enquanto teve uma alternativa.

 

Os economistas políticos clássicos defenderam ativamente medidas para privar as pessoas de qualquer alternativa ao trabalho assalariado. Os atos brutais associados ao processo de despojamento da maioria das pessoas dos meios de produção para si próprias podem parecer distantes da reputação de laissez faire da economia política clássica. Na realidade, a desapropriação da maioria das pessoas e a construção do laissez faire estão intimamente ligadas, tanto que Marx - ou pelo menos os seus tradutores - chamou a essa expropriação das massas, "acumulação primitiva".

 

O próprio som da expressão, acumulação primitiva, vibra com ecos pungentes de consequências humanas. O termo "primitivo" tem uma série de conotações. Sugere uma brutalidade desprovida da sutileza das formas mais modernas de exploração com as quais estamos familiarizados. Implica que a acumulação primitiva foi anterior à forma de acumulação que as pessoas geralmente associam ao capitalismo. Finalmente, implica algo que podemos associar às partes "primitivas" do mundo, onde a acumulação de capital não avançou tão longe quanto em outros lugares.

 

Tenha-se em mente que o segundo termo na expressão "acumulação primitiva" nos lembra que o foco principal do processo é a acumulação de capital e riqueza por um pequeno setor da sociedade. A este respeito, lembre-se a descrição de Marx da acumulação como "a conquista do mundo da riqueza social. É a extensão da área de material humano explorado e, ao mesmo tempo, a extensão da influência indireta e direta do capitalista" (Marx 1977, pp. 739-40). Certamente, pelo menos nos estádios iniciais do capitalismo, a acumulação primitiva foi um elemento central no processo de acumulação.

 

Embora muitos estudiosos modernos reconheçam a natureza disseminada da acumulação primitiva, durante o tempo em que os economistas políticos clássicos escreveram, ninguém, a meu conhecimento, reconheceu que os economistas políticos clássicos defendiam fortemente políticas que promovessem o processo de acumulação primitiva.

 

Além disso, eu argumento que os economistas políticos clássicos se envolveram em um subterfúgio grave. Ao mesmo tempo em que promoviam energicamente a ideologia do laissez-faire, repetidamente defenderam políticas que contradiziam frontalmente os seus princípios de laissez-faire, especialmente em sua análise do papel dos pequenos produtores rurais.

 

A história secreta da acumulação primitiva

 

Talvez porque muito do que os economistas clássicos escreveram sobre sistemas tradicionais de produção agrícola estivesse divorciado de suas observações aparentemente mais intemporais sobre pura teoria, mais tarde os leitores passaram por essas partes dos seus trabalhos de forma distraída. Embora esse aspeto da economia política clássica pudesse parecer estar fora do seu núcleo central temático, eu argumento que essas recomendações intervencionistas foram um elemento significativo no impulso geral dos seus trabalhos. Especificamente, a economia política clássica defendeu que se restringisse a viabilidade de ocupações tradicionais no campo, para coagir as pessoas a trabalhar por salários.

 

A vitalidade desses produtores rurais geralmente se baseava em uma cuidadosa combinação de atividades industriais e agrícolas. Apesar da eficiência deste arranjo, a economia política clássica estava decidida a estrangular os pequenos produtores. Os economistas políticos clássicos muitas vezes justificaram as suas posições em termos de eficiência da divisão do trabalho. Solicitaram medidas que promovessem ativamente a separação entre a agricultura e a indústria.

 

O conceito de Marx de divisão social do trabalho é muito importante a este respeito. Em contraste com a ênfase exclusiva de Adam Smith na divisão dos trabalhos - o arranjo do trabalho dentro da empresa - Marx sugeriu que também se prestasse atenção à distribuição de recursos entre empresas individuais e as famílias - a divisão social do trabalho.

 

Os economistas políticos clássicos não prestaram praticamente nenhuma atenção à divisão social do trabalho em seus trabalhos teóricos. Por exemplo, Adam Smith ofereceu uma descrição detalhada da divisão de trabalho em sua famosa fábrica de alfinetes, mas não se preocupou em alargar a sua discussão para a lógica pergunta seguinte: O que significa que a sociedade seja dividida de tal maneira que a indústria de alfinetes compre os seus metais e os seus combustíveis em lugar de os produzir ela própria? Como se origina esse arranjo? Poderiam essas mudanças no padrão das indústrias fazer diferença numa economia, mesmo que a sua tecnologia ficasse imutável?

 

Essas questões pareciam estar tão longe do alcance da economia política clássica que, mais de dois séculos depois, Ronald Coase ganhou um Prémio Nobel por trazê-las para a atenção dos economistas da corrente dominante. Na esteira de Coase, um grupo de economistas modernos desenvolveu uma nova escola institucionalista de economia (ver Perelman, 1991). De acordo com os novos institucionalistas, as forças económicas se organizam naturalmente em algum padrão ótimo. Como muitos outros economistas, a nova escola institucional tem orgulho em localizar antecipações dos seus trabalhos na economia política clássica, especialmente nas obras de Adam Smith. Embora a nova escola institucional se preocupe com a divisão social do trabalho, as suas teorias não têm utilidade para a análise da acumulação primitiva.

 

Eu suspeitava que o contínuo silêncio sobre a divisão social do trabalho pudesse ter algo de importante para revelar. Seguindo esta linha de investigação, olhei para o que a economia política clássica tinha a dizer sobre o campesinato e agricultores auto-suficientes. Aqui, novamente, o padrão era consistente.

 

Os economistas políticos clássicos não estavam dispostos a confiar nas forças do mercado para determinar a divisão social do trabalho porque achavam que a tenacidade dos produtores rurais tradicionais era muito desagradável. Em vez de defender que as forças do mercado deveriam determinar o destino desses produtores de pequena escala, a economia política clássica pediu intervenções estaduais de um tipo ou de outro para prejudicar a capacidade dessas pessoas para produzir em resposta às suas próprias necessidades. As suas recomendações políticas equivalem a uma manipulação flagrante da divisão social do trabalho.

 

Não podemos justificar tais políticas em termos de eficiência. Se a eficiência fosse de grande importância para eles, os economistas políticos clássicos não teriam ignorado a lei que permite aos nobres (“gentry”) atravessar os campos dos pequenos agricultores em perseguição de raposas, enquanto proibia aos agricultores que livrassem as suas terras de fauna selvagem capaz de comer as colheitas. Estas leis destruíram uma enorme parcela da produção agrícola total.

 

A história secreta da economia política clássica

 

Por que razão este aspeto da acumulação primitiva passou despercebido por tanto tempo a tantos estudantes da economia política clássica? É verdade que os economistas políticos clássicos geralmente mantiveram silêncio em relação à acumulação primitiva ao discutir assuntos de pura teoria económica - embora não fossem absolutamente consistentes a este respeito.

 

Por causa da novidade do seu tema, esses escritores não estavam inteiramente no controlo das suas próprias ideias. Especificamente, descobri que a economia política clássica expressava abertamente a sua insatisfação com a divisão social do trabalho existente, de uma forma clara, em diários, cartas e outros escritos mais práticos sobre assuntos contemporâneos. Esta descoberta levou-me a oferecer uma leitura substancialmente nova da história da economia política clássica.

 

Em seus momentos de candura, a intuição dos economistas políticos clássicos levou-os a exprimir importantes verdades, sobre as quais eles não podem ter sido senão vagamente conscientes, se de todo. Em resultado disso, eles deixaram emergir a ideia da divisão social do trabalho, de vez em quando, mesmo em seus trabalhos mais teóricos. Normalmente, o assunto da divisão social do trabalho surgia quando eles reconheciam que o mercado parecia incapaz de engajar a população rural de forma suficientemente célere para o que eles achavam necessário – ou, para ir mais ao ponto, que as pessoas estavam resistindo ao trabalho assalariado. Consequentemente, muito nessa discussão abordou aquilo a que agora chamamos de "acumulação primitiva".

 

Embora esses deslizes tenham desmentido as teorias do laissez faire contidas em seus livros, eles adicionam muito ao valor da economia política clássica. Na verdade, se a economia política clássica fosse apenas uma tentativa consciente de encarar e justificar as forças emergentes do capitalismo, ela hoje teria muito menos interesse.

 

Assim como um psicólogo pode detectar uma revelação importante numa observação aparentemente improcedente de um paciente, de vez em quando, a economia política clássica nos revela informações sobre o seu programa a que os economistas políticos clássicos não dariam conscientemente as boas vindas. Essas ideias reforçarão as conclusões que extraímos da leitura de seus diários, cartas e escritos mais práticos.

 

Este livro (1) é novo em quatro aspectos principais. Primeiro, aborda a questão do que é que determina a divisão social do trabalho, a divisão da sociedade em firmas e indústrias independentes, da perspetiva da economia política clássica. Em segundo lugar, desenvolve as implicações teóricas da acumulação primitiva. Em terceiro lugar, oferece uma interpretação significativamente diferente da economia política clássica, demonstrando que esta escola de pensamento apoiou o processo de acumulação primitiva. Finalmente, analisa o papel da acumulação primitiva no trabalho de Karl Marx. Todos estes tópicos se juntam para nos ajudar a entender como o capitalismo moderno se desenvolveu e o papel da economia política clássica na promoção desse processo.

 

Esboços negros

 

A economia política clássica é o produto de um período tormentoso, distinguido pela emergência das relações sociais capitalistas. No entanto, as mudanças verdadeiramente importantes deste tempo não parecem estar retratadas nos grandes trabalhos teóricos da economia política clássica. Na verdade, estes escritores mostraram pouco interesse em transmitir informações sobre os grandes conflitos entre capital e trabalho ou entre o capital e as subsistentes relações pré-capitalistas no campo. No entanto, estas questões eram de grande importância para a economia política clássica.

 

Embora vislumbremos ocasionalmente a acumulação primitiva nas obras canónicas da economia política clássica, na maioria das vezes devemos ler os grandes conflitos da época indiretamente. Nossa tática é abordar a economia política clássica da mesma forma como as crianças aprendem a ver um eclipse solar, fazendo um pequeno orifício num pedaço de papel colocado por cima de outra pedaço de papel. O esboço a negro que aparece no papel inferior é uma sombra do eclipse, embora com alguma refração.

 

Os economistas políticos clássicos tornaram necessária essa abordagem indireta porque foram geralmente bem sucedidos a obscurecer o papel da acumulação primitiva em seus textos teóricos. Ainda assim, quando nos voltamos para as suas cartas, diários e trabalhos mais orientados para a política, a importância da acumulação primitiva torna-se muito mais clara.

 

Podemos levar a nossa analogia entre a economia política clássica e eclipses solares um pouco mais longe. Ambos representam eventos raros e fascinantes. As pessoas interpretaram supersticiosamente os eclipses solares como sinal de mudanças de época iminentes. Da mesma forma, pensou-se que os titãs da economia política conseguiam ver o futuro por cima das cabeças de seus contemporâneos. Nesse sentido, suas teorias prenunciavam as mudanças futuras na estrutura da sociedade.

 

Ambos os fenómenos, as configurações planetárias situadas a milhões de quilómetros de distância e as mudanças sociais ocorridas há um século ou mais, no passado, refletem forças importantes que ainda moldam nossas vidas.

Especificamente, a luta contra o autoaprovisionamento não se limita ao passado distante. Continua em curso ainda hoje mesmo (ver Perelman 1991b).

 

Com efeito, podemos observar o eclipse das relações de produção pré-capitalistas mais ou menos do mesmo modo, com uma grande exceção: no caso de eclipses solares, o brilho da fonte pode destruir a nossa visão. No caso da economia política clássica, a nossa visão sofre com a escuridão da fonte.

 

Revisando a economia política clássica

 

Nossos antepassados clássicos podem ter sido brilhantes, mas eram seres humanos falíveis. Eles certamente que não eram observadores totalmente desinteressados. Suas teorias tinham como objetivo avançar os seus próprios interesses ou os de grupos com quem eles se identificavam. Esses interesses coloriram as suas obras, quer eles se apercebessem ou não dessa influência.

 

No caso da luta pela acumulação primitiva, estes escritores parecem ter sido intencionalmente obscuros, quanto o puderam, de forma a não prejudicar a reivindicação de generalidade da sua teoria. Consequentemente, a luta contra o autoaprovisionamento das pessoas rurais lançou apenas uma sombra ligeira nas páginas da economia política clássica, a sombra de um modo de vida quase esquecido, agora obliterado pelo processo de acumulação primitiva. Este processo passou em grande parte despercebido entre leitores modernos da economia política clássica, sobretudo porque os próprios economistas políticos clássicos tentaram evitar que seus leitores vislumbrassem esse processo.

 

Embora nos achemos reduzidos a estudar as sombras desta luta, a tentativa continua ainda a vale a pena do esforço. De facto, a economia política clássica está em conformidade com um padrão consistente de quase sempre apoiar posições que funcionariam para subordinar os pequenos produtores agrícolas aos interesses do capital.

 

Isso contradiz a teoria comumente aceite de que a economia política clássica ofereceu o seu apoio incondicional ao laissez faire. Eu questiono a importância relativa do quase universalmente admirado Adam Smith, defendendo que Smith e os outros autores clássicos tentaram promover o processo de acumulação primitiva. Esta releitura sugere que a economia política clássica prosseguiu um projeto diferente, que contradiz a interpretação padrão da economia política clássica.

 

Antes de me voltar para o corpo principal deste trabalho, desejo avançar uma advertência sobre a minha imagem do eclipse. Ao estudar as sombras lançadas pelos clássicos, devemos ter em mente que essas imagens têm menos dimensões do que o objeto sob estudo. Uma dimensão que desaparece da perspetiva da economia política clássica diz respeito às relações sociais entre o trabalho e o capital. Escrevendo a partir das confortáveis alturas da sua elevada posição social, os economistas políticos clássicos interpretaram a organização da classe trabalhadora como uma mera desordem. Por causa desta insensibilidade, um trabalho como este, será necessariamente desequilibrado. É aqui dada muita atenção aos esforços do capital para controlar o trabalho, mas pouca é dedicada ao inverso. Deixo ao leitor a responsabilidade de estimar o equilíbrio real de forças.

 

Compulsão e a criação de uma classe trabalhadora

 

O processo brutal de separar as pessoas dos meios de se proverem a si próprios, conhecido como acumulação primitiva, causou enormes dificuldades para as pessoas comuns. Essa mesma acumulação primitiva proporcionou uma base para o desenvolvimento capitalista.

 

A vedação dos terrenos comuns foi a técnica mais conhecida de acumulação primitiva. Membros abastados da nobreza reivindicavam, como propriedade privada, terras que grupos de pessoas haviam compartilhado anteriormente. Joan Thirsk, um dos mais experientes historiadores dos inícios da agricultura britânica, descreveu a natureza de algumas das transformações sociais e pessoais associadas às vedações.

 

Algumas pessoas denunciaram esta expropriação. Marx ecoou esse sentimento, acusando: "A expropriação dos produtores diretos foi realizada por meio do mais implacável barbarismo e sob o estímulo da mais infame, da mais sórdida, da mais mesquinha e da mais odiosa das paixões" (Marx 1977, pág. 928).

 

Ainda assim, essa desapropriação era legal, em certo sentido. Afinal, os camponeses não possuíam direitos de propriedade em sentido estrito. Eles só tinham direitos tradicionais. À medida que os mercados evoluíram, primeiro a nobreza faminta de terra e, mais tarde, a burguesia, usaram o Estado para criar uma estrutura legal para revogar estes direitos tradicionais (Tigar 1977).

 

O simples despojamento dos terrenos comuns era uma condição necessária, mas nem sempre suficiente, para acorrentar as pessoas comuns ao mercado de trabalho. Mesmo depois das vedações, trabalhadores rurais mantiveram acesso costumeiro a "arbustos, bosques, matagais rasteiros, pedreiras e poços de saibro, obtendo assim combustível para cozinhar e lenha para os animais, frutos silvestres e avelãs das sebes, silvados, tanásias e outras ervas selvagens a partir de qualquer outro troço de monturo... Quase todas as coisas vivas na paróquia, por mais insignificantes que fossem, poderiam ser destinadas a bom uso pelo frugal trabalhador camponês ou por sua esposa” (Everitt 1967, p. 405).

 

Na medida em que a economia tradicional pudesse ainda permanecer intacta, apesar da perda dos terrenos comuns, um fornecimento de trabalho satisfatório para o capital poderia não estar disponível e o nível real dos salários ser mais elevado, impedindo assim o processo de acumulação. De forma não surpreendente, um por um, esses direitos tradicionais também desapareceram. Aos olhos da burguesia, "a propriedade tornou-se propriedade absoluta: todos os ‘direitos’ tolerados que o campesinato havia adquirido ou preservado... eram agora rejeitados" (Foucault 1979, p. 85).

 

A acumulação primitiva consistiu em duas partes, que podemos comparar com as duas lâminas de uma tesoura. A primeira lâmina serviu para minar a capacidade das pessoas para se proverem a si próprias, a outra lâmina foi um sistema de medidas severas necessárias para evitar que as pessoas encontrassem estratégias alternativas de sobrevivência fora do sistema de trabalho assalariado. Uma série de medidas, muitas vezes duras, projetadas para minar qualquer resistência que as pessoas mantivessem às exigências do trabalho assalariado, acompanhou a desapropriação dos direitos dos camponeses, mesmo antes de o capitalismo se tornar uma força económica significativa.

 

Por exemplo, começando com os Tudor, a Inglaterra promulgou uma série de medidas severas projetadas para evitar que os camponeses caíssem na vagabundagem ou recorressem a sistemas de assistência. De acordo com um estatuto de 1572, os mendigos com idade superior a 14 anos deveriam ser severamente flagelados e marcados com um ferro em brasa na orelha esquerda, a menos que alguém quisesse levá-los para seu serviço por dois anos. Os criminosos reincidentes com mais de 18 anos deveriam ser executados, a menos que alguém os levasse para seu serviço. Terceiras ofensas resultariam automaticamente em execução (Marx 1977, pp. 896ff; 1974, p. 736; Mantoux 1961, p. 432). Estatutos similares apareceram quase simultaneamente no início do século XVI em Inglaterra, Países Baixos e Zurique (LeRoy Ladurie 1974, p. 137). Eventualmente, a maioria dos trabalhadores, sem dispor de qualquer alternativa, teve de se decidir a trabalhar por salários, algures próximo do nível de subsistência.

 

Na sequência da acumulação primitiva, a relação salarial tornou-se aparentemente voluntária. Os trabalhadores precisavam de emprego e os empregadores queriam trabalhadores. Na realidade, o processo subjacente esteve muito longe de ser voluntário. Nas palavras de Foucault:

 

“Historicamente, o processo pelo qual a burguesia se tornou a classe politicamente dominante no decurso do século XVIII foi encoberto pelo estabelecimento de um enquadramento jurídico explicitamente codificado e formalmente igualitário, possibilitado pela organização de um regime parlamentar e representativo. Mas o desenvolvimento e generalização dos mecanismos disciplinares constituíram o reverso, o lado sombrio desses processos... apoiado por esses minúsculos, quotidianos mecanismos físicos, por todos esses sistemas de micropoder que são essencialmente não-igualitários” [Foucault 1979, p. 222].

 

Na verdade, a história do recrutamento de trabalho é uma história ininterrupta de coerção, quer através da força bruta da pobreza, quer através de uma regulamentação mais direta, que tornou impossível a continuação dos antigos modos de vida (Moore, 1951). Uma suposta necessidade de disciplina justificava as duras medidas que os pobres sofreram. Na verdade, escritores de todas as persuasões compartilhavam uma preocupação obsessiva com a criação de uma força de trabalho disciplinada (Furniss 1965; Appleby 1978). Apoiantes de tais medidas tipicamente defenderam a sua posição em termos de necessidade de civilizar os trabalhadores ou de eliminar a preguiça e a indolência.

 

O capital exigia essas duras medidas para conquistar a economia doméstica, de forma a poder extrair uma maior massa de mais-valia. Na verdade, quase todos os que conhecem o processo de acumulação primitiva, amigos ou inimigos do trabalho, concordaram com o veredicto de Charles Hall, de que "se não fossem pobres, eles não se submeteriam a empregos" (Hall 1805, p.144) - pelo menos enquanto a sua remuneração fosse mantida suficientemente baixa para gerar lucros substanciais.

 

Os empregadores perceberam rapidamente a relação entre pobreza e a hipótese de ganhar lucros apetitosos. Ambrose Crowley, por exemplo, instalou as suas indústrias no norte, em vez dos Midlands, pois lá "the cuntry is verry poore and populous soe workmen must of necessity increase” (citado em Pollard 1965, p. 197).

 

Este processo foi cumulativo. Um aumento da pobreza gerou mais população, o que, por sua vez, estimulou mais população. A este respeito, Marx observou que o nível de salários nos distritos agrícolas da Inglaterra variou de acordo com as condições particulares em que o campesinato tinha emergido da servidão (Marx 1865, página 72). Quanto mais empobrecidos os servos, mais baixos seriam os salários dos seus descendentes.

 

A economia política clássica e a guerra à preguiça

 

Os economistas políticos clássicos se juntaram ao coro daqueles que condenam a preguiça e a indolência por parte dos pobres. Embora tenham aplaudido as atividades de lazer dos ricos, eles denunciaram todo comportamento por parte dos menos afortunados que não implicasse o máximo de esforço de trabalho como sendo preguiça.

 

Considere-se o caso de Francis Hutcheson - "o inolvidável Dr. Hutcheson", como o seu estudante Adam Smith depois o descreveu (carta de Smith ao Dr. Archibald Davidson, 16 de Novembro de 1787; reimpressa em Mossner e Ross 1977, p. 309) - o mesmo Francis Hutcheson, cuja Breve Introdução à Filosofia Moral em Três Livros (1742) parece ter servido como modelo para as secções económicas das palestras de Smith em Glasgow (ver Scott 1965, pp. 235, 240). Uma sua obra posterior, o seu Sistema de Filosofia Moral, exemplifica as contribuições do Dr. Hutcheson para aquele nobre campo da filosofia moral. Depois de algumas notas breves sobre a necessidade de aumentar os preços, Hutcheson meditou:

 

“Se um povo não adquiriu um hábito de indústria, o baixo custo de todos os bens necessários à vida encoraja a preguiça. O melhor remédio é aumentar a procura por todos esses bens... A preguiça deve ser punida com pelo menos uma servidão temporária. [Hutcheson 1755; 2: pp. 318-19; sublinhado adicionado]

 

Estas três frases estavam todas contidas no mesmo parágrafo. O ameaçador "pelo menos" desta citação sugere que o nunca esquecido professor pode ter tido em mente um remédio ainda mais severo do que a mera servidão temporária. O que mais poderia o bom médico recomendar a estudantes de filosofia moral no caso de a servidão temporária se revelar inadequada para empurrar as pessoas para os seus locais de trabalho?

 

Esta atitude, é claro, não é exclusiva da economia política clássica. Na verdade, podemos perguntar-nos, alguma vez houve uma nação em que os ricos achassem que os pobres eram suficientemente industriosos? O clamor universal de "preguiça e indolência" poderia ser ouvido tão longe quanto o Japão do século XIX (ver Smith 1966, p. 120). No entanto, nenhum país parece ter chegado tão longe como a Inglaterra em sua guerra contra a preguiça. Escritores desse tempo acusaram que uma falta de disciplina era responsável pela criminalidade, bem como pela doença (Ignatieff 1978, pp. 61ff). No final do século XVIII, mesmo os hospitais passaram a ser considerados como um meio adequado para instilar disciplina (ver Ignatieff 1978, p. 61).

 

Quase poeticamente, Thomas Mun queixava-se da "lepra geral do festejo, música, moda e esbanjamento do nosso tempo em prazeres e ócio" (Mun 1664, p. 193). Josiah Tucker empregou uma metáfora militar da guerra para construir um argumento semelhante:

 

“Numa palavra, o único meio possível de evitar que uma nação rival fuja com o nosso comércio, é impedir que o nosso próprio povo seja mais ocioso e vicioso do que o dela.... De modo que a única guerra que pode ser conduzida com o sucesso a esse respeito, é uma guerra contra o vício e a ociosidade; uma guerra cujas forças devem consistir - não em frotas e em exércitos -, mas em regulamentos e taxas de tal modo judiciosos que conduzam a paixão do amor-próprio privado para a via do bem público” [Tucker 1776a, pp. 44-5].

 

Acumulação primitiva e a erradicação dos feriados

 

Embora o seu padrão de vida possa não ter sido particularmente pródigo, os povos da Europa nortenha pré-capitalista, como a maioria dos povos tradicionais, desfrutava de uma boa quantidade de tempo livre (veja-se Perelman 1977, cap. 18; e Ashton 1972, p. 204; leia-se também Vernon Smith 1992 e Wisman 1989). As pessoas comuns cumpriam inúmeros feriados religiosos, que pontuavam o ritmo de trabalho. Joan Thirsk estima que, no século dezasseis e início do século dezassete, cerca de um terço dos dias laborais, incluindo domingos, foram passados em lazer (citado em Thomas 1964, p. 63; veja-se também Wilensky 1961). Uma estimativa ainda muito mais extravagante foi produzida por Kautsky, que estimou que 204 feriados anuais foram celebrados na Baixa Baviera medieval (Kautsky 1899, p. 107).

 

Apesar dos seus numerosos feriados, os camponeses ainda conseguiam produzir um excedente significativo. Na sociedade feudal inglesa, por exemplo, os camponeses sobreviveram, mesmo sendo a nobreza poderosa o suficiente para lhes extrair na ordem de 50% do produto (ver Postan 1966, p. 603). Com a evolução dos mercados, as punções sobre o trabalho dos camponeses aumentaram. Por exemplo, no sul da França, as rendas parecem ter crescido de cerca de um quarto do rendimento em 1540 para metade em 1665 (LeRoy Ladurie 1974, p. 117).

 

Embora as pessoas tivessem cada vez mais de restringir o seu lazer, a fim de satisfazer o crescimento das exigências dos não produtores, muitos observadores ainda reclamavam sobre a celebração excessiva de feriados.

 

O clero protestante foi especialmente loquaz a denunciar o excesso de feriados (Hill 1967, pp. 145-218; veja-se também Marx 1977, p. 387; e Freudenberger e Cummins 1976). Mesmo tão tarde quanto 1830, ouvimos a queixa de que o ano de trabalho irlandês continha apenas 200 dias úteis, depois de subtraídas todas as festividades (Grã-Bretanha 1840, p. 570; citado em Mokyr 1983, p. 222).

 

O tempo, numa sociedade de mercado, é dinheiro. Sir Henry Pollexfen, por exemplo, calculou: "se com apenas 2 milhões de trabalhadores a 6d. por dia chegamos a 500.000 l., elevando assim correspondentemente as nossas riquezas, tanto mais parece estar perdido para a nação por cada feriado que for mantido" (Pollexfen 1700, p. 45; citado em Furniss 1965, p. 44).

 

Não devemos interpretar o zelo na supressão de festividades religiosas como indicação de que os representantes do capital consideravam a devoção das classes trabalhadoras com demasiada ligeireza. Em alguns distritos rurais da Inglaterra do século XIX, trabalhar em seu próprio jardim a um sábado era considerado uma ofensa punível. Alguns trabalhadores foram até presos por esse crime (Marx 1977, pp. 375-76n). A piedade, no entanto, também tinha os seus limites. O mesmo trabalhador poderia ser acusado de violação de contrato se preferisse assistir à missa no sábado, em vez de se apresentar para o trabalho quando chamado a fazê-lo (Marx 1977, pp. 375-76n).

 

Em França, onde o capital foi mais lento a afirmar-se, a erradicação dos feriados foi mais tardia. Em 1766, Tobias Smollett reclamou dos franceses: "Quase a metade do tempo deles, que podia ser empregue lucrativamente no exercício da indústria, é perdido, para si e para a comunidade, na comparência às diferentes exibições de pantomima religiosa" (Smollett 1766, página 38).

 

Voltaire propôs o deslocamento dos feriados para o domingo seguinte. Uma vez que o domingo teria de ser um dia de descanso em qualquer caso, os empregadores poderiam assim desfrutar de aproximadamente quarenta dias de trabalho adicionais. Esta proposta fez com que o ingénuo abade Baudeau se interrogasse sobre a sabedoria da intensificação do trabalho, quando os campos já estavam sobrecarregados com um excesso de população (Weulersse, 1959, p. 28). Como poderiam estes despojados ser empregues?

 

É claro que estas mudanças impostas nas práticas religiosas da Europa não foram induzidas por uma escassez de pessoas, mas pela sua falta de vontade em se conformarem às necessidades do capital. Por exemplo, os dirigentes da Revolução Francesa, que se orgulhava de sua racionalidade, decretaram uma semana de dez dias com apenas um dia de folga.

 

A economia política clássica se reuniu entusiasticamente à condenação da celebração de tantos feriados (ver Cantillon 1755, p. 95; Senior 1831, p.9). Esta supressão de feriados religiosos era apenas uma pequena parte do mais lato processo de acumulação primitiva.

 

A economia política clássica e o dia de trabalho ideal

 

Uma vez que o capital começou a desalojar as amarras tradicionais da sociedade, a burguesia procurou todas as oportunidades possíveis para envolver as pessoas em trabalhos produtivos que gerassem lucro para aqueles que empregavam trabalho assalariado. Consequentemente, os economistas políticos clássicos propuseram ações para moldar a sociedade de acordo com a lógica da acumulação, a fim de fortalecer a dependência do trabalho assalariado.

 

Na utopia dos primórdios da economia política clássica, os pobres trabalhariam em todas as horas de vigília. Um escritor sugeriu que os lacaios da nobreza pudessem se levantar cedo para empregar suas horas de repouso fazendo redes de pesca, junto com "soldados desmobilizados, prisioneiros pobres, viúvas e órfãos, todos os artesãos, artífices e trabalhadores pobres, suas esposas, filhos e servos" (Puckle 1700; 2: p. 380; citado em Appleby 1976, p. 501).

 

Outros apelaram a novos arranjos institucionais para manter um fluxo cada vez maior de trabalho assalariado. Andrew Fletcher de Saltoun recomendou a escravidão perpétua como o destino apropriado de todos os que não respondessem a medidas menos duras para integrá-los na força de trabalho (ver Marx, 1977, p. 882). Hutcheson, como vimos, seguiu o exemplo. Sempre o idealista, o bispo Berkeley preferia que uma tal escravidão fosse limitada a "um certo termo de anos" (Berkeley 1740, p. 456).

 

Nenhuma fonte de trabalho deveria ser negligenciada. Por exemplo, num movimento que Foucault denominou de "o grande confinamento", instituições foram fundadas para tomar a seu cargo, indiscriminadamente, doentes, criminosos e pobres (Foucault 1965, pp. 38-65). O objetivo não foi melhorar as condições dos internados, mas sim forçá-los a contribuir mais para a riqueza nacional (para uma seleção de citações que refletem mais carinhosamente sobre os primeiros economistas políticos, veja-se Wiles, 1968).

 

Joseph Townsend propôs que, à noite, quando os trabalhadores agrícolas retornassem da debulha ou de arar, "eles poderiam cardar, poderiam fiar, ou poderiam fazer malha" (Townsend 1786, p. 442). William Temple defendeu a inclusão de crianças de quatro anos na força de trabalho (Temple 1770, p. 266; Furniss 1965, pp. 114-15). Para não ser superado, John Locke, muitas vezes visto como um filósofo da liberdade, pediu o início do trabalho na madura idade de três anos (Cranston 1957, p.450).

 

Ocasionalmente, escritores desse tempo encontraram sinais de progresso. Em 1723, Daniel Defoe ficou encantado por descobrir que tanto progresso havia acontecido em Norwich que "as próprias crianças, depois dos quatro ou cinco anos de idade, podiam cada uma ganhar o seu próprio pão” (Defoe 1724-26, pág. 86, veja também p. 493).

 

Para a economia política clássica, estas cenas edificantes de trabalho duro não eram suficientemente comuns. Para seu crédito, Jean-Baptiste Say, geralmente um forte defensor do desenvolvimento capitalista, escreveu um dos poucos protestos do estado de coisas na Grã-Bretanha, numa carta dirigida a Robert Malthus:

 

“Não devo tentar apontar as partes desta imagem que se aplicam ao seu país, caro senhor... Mas se a vida social [um termo que Say usava quase com o sentido de divisão social do trabalho] for uma galé, na qual têm de remar com todas as suas forças durante dezasseis horas das vinte e quatro do dia, eles podem na verdade estar justificados em não gostar da vida social... Eu não mantenho nenhuma outra doutrina quando afirmo que a utilidade das produções já não vale mais os serviços produtivos, à taxa em que somos obrigados a pagar por elas” [Say 1821, pp. 50-51; veja também Ricardo 1951-73; 8: p. 184].

 

Infelizmente, nenhum outro economista político clássico estava disposto a alinhar com Say a este respeito.

 

O laissez faire autoritarista de Bentham

 

A economia política clássica formulou frequentemente suas recomendações com uma retórica de liberdade individual, mas a sua conceção de liberdade estava longe de ser abrangente. A liberdade para o capital dependia do trabalho árduo das pessoas comuns.

 

Lionel Robbins, um forte defensor da sociedade de mercado, também aludiu a esse lado autoritário do laissez faire, observando que "a necessidade de um enquadramento legal e de um aparato de execução é uma parte essencial do conceito de uma sociedade livre" (Robbins 1981, p.8). Anteriormente, ele escreveu: "Se existe alguma ‘mão invisível’ numa ordem não coletivista, ela opera apenas num enquadramento deliberadamente constringente de lei e ordem" (Robbins, 1939, p. 6, veja também Samuels, 1966).

 

Dentro destas constringentes lei e ordem, os trabalhadores encontraram seus direitos a organizar sindicatos, e até mesmo a agir politicamente, severamente restritos. Todo o edifício judicial foi erguido com um olho postado na direção de tornar a propriedade do capital mais rentável (Tigar 1977).

 

Max Weber uma vez observou que os métodos contabilísticos racionais estão "associados ao fenômeno social de ‘disciplina da loja’ e à apropriação dos meios de produção, o que significa: com a existência de um ‘sistema de dominação’ [Herrschaftverhaeltniss]" (Weber 1921, p. 108; também Perelman 1991, Cap. 3). Da mesma forma, o sistema de contabilidade racional da economia política exigiu um 'sistema de dominação', embora em uma escala maior. Weber concluiu: "Nenhuma prova especial é necessária para demonstrar que a disciplina militar é o modelo ideal para a moderna fábrica do capitalismo" (Weber 1921, p. 1156).

 

Nesse sentido, podemos ver Jeremy Bentham, em vez de Adam Smith, como o arquetípico representante da economia política clássica. De facto, a defesa dogmática que Bentham faz do laissez faire superou a de Adam Smith. Por exemplo, depois de Smith ter defendido o papel do governo no controlo das taxas de juros, Bentham o censurou causticamente com as palavras: "Para evitar que façamos mal uns aos outros, é mesmo muito necessário colocar açaimes em nossas bocas... " (Bentham 1787b, p. 133).

 

Embora Bentham teoricamente defendesse o laissez faire em nome da liberdade, o seu intento era subordinar todos os aspectos da vida aos interesses da acumulação. Bentham limitou a sua preocupação apaixonada com o laissez faire àqueles que se conformavam com as normas de uma sociedade capitalista; um confronto cerrado com o poder do Estado deveria ser o destino dos restantes. De acordo com Bentham, "Propriedade - não a instituição de propriedade, mas a constituição da propriedade - tornou-se um fim em si mesmo" (Bentham 1952; i, p. 117).

 

Bentham expressou-se de forma absolutamente clara sobre a necessidade dessa "constituição da propriedade". Ele percebeu que, embora o controle sobre o trabalho seja uma fonte importante de riqueza, o trabalho resiste obstinadamente à vontade do capitalista. Na linguagem inimitável de Bentham:

 

“Os seres humanos são os instrumentos de produção mais poderosos e, portanto, todos estão ansiosos por empregar os serviços de seus companheiros na multiplicação de seus próprios confortos. Daí a intensa e universal sede de poder; o ódio igualmente prevalecente à sujeição. Cada um, portanto, encontra uma resistência obstinada à sua própria vontade, e isso, naturalmente, engendra antipatia em relação a seres que, assim, desconfiam e contrariam os seus desejos” [Bentham 1822, p. 430].

 

Bentham nunca reconheceu a existência de uma contradição entre sua advocacia do laissez faire e as suas propostas de gestão de mão-de-obra. Para ele:

 

“Entre riqueza e poder, a conexão é a mais íntima e apertada: tão íntima, de facto, que a destrinça entre eles, mesmo na imaginação, não é uma dificuldade pequena. São, cada um deles, respetivamente, um instrumento de produção do outro” [Bentham 1962, p. 48; citado em Macpherson 1987, pp. 88-89].

 

Bentham entendeu que as lutas para subjugar os pobres se espalhariam por todos os aspetos da vida. Ele esperava transformar essas lutas em lucros para si próprio e, em menor grau, para outras pessoas da sua classe. Dada a resistência natural colocada pelo trabalho à criação de riqueza para aqueles que o exploram, o trabalho sem liberdade revestiu de uma atração óbvia para Bentham. Ele projetou planos detalhados para o seu fabuloso Panopticon, uma prisão projetada para o controle máximo dos presos, a fim de lucrar com o seu trabalho.

 

Numa peça complementar de 1798 para o seu projeto para o Panopticon, Pauper Management Improved, Bentham propôs uma Companhia Nacional de Caridade, organizada sob o modelo da Companhia da Índia Oriental (“East India Company”) - uma sociedade privada por subscrição de capital, parcialmente subsidiada pelo governo. Ela deveria ter autoridade absoluta sobre "toda a massa inerte dos pobres" começando com 250 casas industriais que acomodariam meio milhão de pessoas, expandindo-se depois para 500 casas com um milhão de pessoas (Bentham n.d, pág. 369; citado Himmelfarb 1985, p. 78).

 

Bentham planejou lucrar generosamente com esses presos, especialmente com aqueles nascidos já nessas casas, que teriam que trabalhar como aprendizes dentro da companhia. Ele escreveu: "Tantas casas industriais, tantos cadinhos, em que escória deste tipo [os pobres] é convertida em ouro". Um regime rigoroso, supervisão e disciplina incessantes, economias na dieta, na roupa e no alojamento tornariam possíveis os lucros. Jeremy Bentham, vigoroso defensor que era da liberdade de comércio, sonhava com os lucros que resultariam do uso do trabalho de prisioneiros:

 

“Que poder pode ter outro fabricante sobre os seus operários, igual ao que o meu fabricante teria sobre os seus? Que outro mestre há que possa assim reduzir os seus trabalhadores, se ociosos, a uma situação próxima da fome, sem que eles pudessem ir para outro lugar? Que outro mestre existe cujos homens nunca poderão embriagar-se, a menos que ele determine que eles o façam. E que, longe de poderem aumentar seus salários por coligação, são obrigados a aceitar qualquer bagatela que ele ache ser do seu interesse conceder?” [Bentham 1797, p. 56; veja também Ignatieff 1978, p. 110; e Foucault, 1979].

 

Bentham estava decidido a subordinar todas as facetas da existência humana ao motivo de lucro. De acordo com a economia política clássica, todas as condições sociais e todas as instituições sociais deveriam ser julgadas apenas de acordo com os seus efeitos sobre a produção de riqueza. Bentham recomendou que as crianças fossem postas a trabalhar aos quatro anos, em vez de aos catorze, gabando-se de que, assim, seria evitado o desperdício de "dez anos preciosos em que nada é feito! Nada para a indústria! Nada para melhoria, moral ou intelectual!" (citado em Himmelfarb 1985, página 81).

 

Bentham queria mesmo promover a "mais gentil de todas as revoluções", a revolução sexual. A este respeito, Bentham não estava minimamente preocupado em promover o alargamento dos limites da liberdade humana, mas em garantir que os presos tivessem o maior número possível de descendentes (Ibid., p.83). Bentham estava mesmo planeando chamar-se a si próprio de "Subrégulo dos Pobres". Infelizmente, por falta de apoio do governo, os seus planos deram em nada. Em suas memórias, ele se queixou: "Se não fosse George III, todos os prisioneiros de Inglaterra teriam, há anos atrás, sido colocados sob a minha gestão" (Bentham 1830-1, p. 96).

 

Pobre dele, Bentham nunca conseguiu atingir estes seus objetivos pessoais. Talvez tivesse sido demasiado ganancioso. Possivelmente, os seus métodos eram demasiado grosseiros. Em vez disso, como veremos, o capitalismo encontrou métodos mais subtis para fazer aproveitamento do trabalho. Em resultado disso, hoje recordamos Bentham como um valente defensor dos ideais de laissez-faire em vez de como Subrégulo dos Pobres.

 

Vitória

 

A economia política clássica foi geralmente mais tímida na expressão das suas intenções do que Bentham. Apesar da sua antipatia para com a indolência e a preguiça, cobriu-se com uma enxurrada de retórica sobre liberdades naturais. Com um exame mais aprofundado, descobrimos que a noção de sistema de liberdades naturais foi consideravelmente mais flexível do que parecia. Voltemos novamente a Francis Hutcheson, que ensinou a Adam Smith as virtudes da liberdade natural. Num trabalho que serviu de modelo para as próprias palestras de Smith, Hutcheson escreveu:

 

“É único e excelente desígnio das leis civis fortalecer por sanções políticas as diversas leis da natureza... A populaça precisa de ser coagida por leis, nos melhores métodos de gerir os seus próprios assuntos e exercitar as artes mecânicas” [Hutcheson 1749, p. 273; ênfase adicionado].

 

Com efeito, Hutcheson percebeu que, uma vez que tenha ocorrido a acumulação primitiva, os atrativos da escravidão formal diminuem. Forças extramercantis de todos os tipos tornar-se-iam desnecessárias desde que o próprio mercado garanta que a classe trabalhadora permaneça em estado de privação contínua. Patrick Colquhoun, um magistrado da polícia de Londres, observou:

 

“A pobreza é esse estado e condição na sociedade em que o indivíduo não possui mão-de-obra excedente de reserva, ou, por outras palavras, nenhuma propriedade ou meio de subsistência, senão o que é derivado do exercício constante da indústria nas várias ocupações da vida. A pobreza é, portanto, um ingrediente necessário e indispensável na sociedade, sem o qual nações e comunidades não poderiam existir em estado de civilização. É o destino do homem. É a fonte da riqueza, uma vez que, sem pobreza, não poderia haver trabalho, não poderia haver riquezas, nenhum refinamento, nenhum conforto e nenhum benefício para aqueles que podem possuir riquezas” [Colquhoun 1815, p. 110].

 

Nas palavras de Marx, "encontramos no mercado um conjunto de compradores, possuidores de terrenos, maquinarias, matérias-primas e meios de subsistência, todos eles, salvo a terra, produtos do trabalho, e, por outro lado, um conjunto de vendedores que não têm nada para vender, exceto a sua força de trabalho, os seus atuantes braços e cérebros" (Marx, 1865, pp. 55-56).

 

Os economistas políticos posteriores ignoraram a compulsão necessária para forçar o trabalho a ingressar no mercado, assumindo alegremente que o mercado, por si só, seria suficiente para garantir que o processo acumulador pudesse avançar sem o auxílio de forças extramercantis. Os trabalhadores, nessa época, entenderam genericamente a importância estratégica dessas medidas para promover a acumulação primitiva. Nesse espírito, Thomas Spence, um valente defensor da classe trabalhadora, proclamou que "[É] infantil... esperar... tentar ver qualquer outra coisa senão a maior espremedura e trituração dos pobres, até que consigamos derrubar o atual sistema de propriedade territorial" (citado em Thompson 1963, p. 805).

 

O sistema, no entanto, não foi derrubado. Em vez disso, tornou-se mais forte. Os trabalhadores eram obrigados a ceder mais e mais dos seus períodos tradicionais de lazer (ver Hill 1967 e Reid 1976, pp. 76-101). O dia de trabalho foi prolongado (Hammond e Hammond 1919, pp. 5-7). A classe trabalhadora, na pessoa de Thomas Spence, gritou:

 

“Em vez de trabalhar apenas seis dias por semana, somos obrigados a trabalhar na ordem de oito ou nove, e no entanto mal podemos subsistir... e ainda e sempre ouvimos gritar trabalhe - trabalhe - você está ocioso... Nós, Deus nos ajude, caímos sob o jugo do mais endurecido conjunto de patrões que já existiu” [citado em Kemp-Ashraf 1966, p. 277; veja também Tawney 1926, especialmente p. 223].

 

Esta declaração foi suficientemente eloquente para valer ao seu autor uma sentença de três anos de prisão, após a sua publicação em 1803. Este incidente é típico do destino daqueles que desafiaram a ordem capitalista. Sempre que a classe trabalhadora e seus amigos protestaram efetivamente contra o capitalismo, a silenciosa compulsão do capital (Marx, 1977, p.899) deu lugar ao silêncio compulsivo.

 

O silenciamento de Spence não foi completamente efetivo. Embora alguns simplesmente o descartassem como um "excêntrico radical" (Knox 1977, p. 73), estudos mais recentes demonstraram que Spence merece uma consideração mais respeitosa (Kemp-Ashraf, 1966). Na verdade, o biógrafo de Spence afirma que o owenismo e a herança subsequente do socialismo britânico segue uma linha direta de descendência da crítica ao capitalismo feita por Spence (Rudkin 1966, pp. 191). Jornalistas desse tempo concordaram com esta avaliação (veja Halevy 1961, p. 44fn). Infelizmente, todos os Spences do mundo não conseguiram reverter ou mesmo impedir o processo de acumulação primitiva.

 

Nenhuma sociedade foi tão longe quanto a britânica em termos de acumulação primitiva. Este aspeto do desenvolvimento capitalista está quase esquecido hoje em dia. Em vez disso, separados por dois séculos, economistas modernos, como Milton Friedman, dissimulam o lado negro do capitalismo, ignorando que ele implica subordinação, enquanto celebram a liberdade de dispor da própria propriedade (Friedman, 1962). Estes economistas modernos estão muito enganados, na sua interpretação da evolução dos chamados mercados livres.

 

 

 

 

 

(*) Michael Perelman (n. 1939) é um economista e historiador de temas económicos norte-americano, professor na California State University, em Chico. É convidado regular de vários programas radiofónicos, incluindo Media Matters, Pacifica Radio, KPFA 94.1 Berkeley e WBBR (Bloomberg Radio). Escreveu, entre muitas outras obras: Farming for Profit in a Hungry World (1977), Classical Political Economy, Primitive Accumulation and the Social Division of Labor (1983), Karl Marx’s Crises Theories: Labor, Scarcity and Fictitious Capital (1987), Information, Social Relations, and the Economics of High Technology (1991), Class Warfare in the Information Age (1998), Transcending the Economy: On the Potential of Passionate Labor and the Wastes of the Market (2000), Steal This Idea: Intellectual Property and The Corporate Confiscation of Creativity (2002), The Perverse Economy: The Impact of Markets on People and Nature (2003), Manufacturing Discontent: The Trap of Individualism in a Corporate Society (2005), Railroading Economics: The Creation of the Free Market Mythology (2006), The Invisible Handcuffs of Capitalism: How Market Tyranny Stifles the Economy by Stunting Workers (2011). O presente ensaio é extraído do seu livro The invention of capitalism: The secret history of primitive accumulation. Durham & London: Duke University Press, 2000. A tradução é de Ângelo Novo.

 

 

______________

NOTA DO EDITOR:

 

(1) Este ensaio de Michael Perelman constitui um capítulo introdutório do seu livro The invention of capitalism: The secret history of primitive accumulation. Durham & London: Duke University Press, 2000.

 

 

 

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