Introdução

 

 

 

A crise global do capitalismo parece agora acercar-se inexoravelmente de mais um choqe violento, provavelmente a ser despoletado pela crise europeia das dívidas soberanas, com Portugal na primeira fila. Os grandes agentes da agiotagem mostram-se agitados. Marcam-se cerradamente uns aos outros, lançam manobras de diversão, ensaiam correrias futuras. Face ao estrangulamento no processo de valorização do capital, os miasmas putrefatos da finança mundial devoram-se mutuamente, lançam-se em celeradas operações depredadoras, em busca de quaisquer bolhas de oxigénio que lhes permitam manter a cabeça à tona de água. Os perdedores serão os de sempre: os trabalhadores, os desempregados, as mulheres, os camponeses, os precários e informais. Ao menos no mundo ocidental, o ciclo histórico do capitalismo está claramente esgotado, mas não será vencido sem uma mobilização consciente das grandes massas populares, com base num projeto transformador claro e estrategicamente coerente.

 

Abrimos este número de ‘O Comuneiro’ com o primeiro artigo que publicamos de Leo Panitch, um dos mais lúcidos pensadores marxistas da atualidade. ‘Analisando o capitalismo’ é uma sucinta mas aguda reflexão estratégica para a esquerda revolucionária, que nos convoca a todos para as tarefas mais imediatas no processo de superação deste sistema condenado. Dialogando de algum modo com este artigo (em particular no que respeita ao objetivo da nacionalização da banca), publicamos de seguida um texto do nosso já bem conhecido François Chesnais. ‘As dívidas ilegítimas’ é uma convocatória para a batalha anticapitalista de retoma da cidadania, em particular no que respeita ao problema candente da necessária auditoria e repúdio de dívidas públicas abusivas.

 

No mundo da língua portuguesa, Reinaldo Carcanholo é um pensador inigualável e imprescindível para trazer até à nossa circunstância presente, de uma forma densa mas com gande clareza, a crítica da economia política inaugurada por Karl Marx. É o que ele faz em ‘A atual crise capitalista’, que devia ser leitura obrigatória para todos os jovens indignados e “à rasca”, neste tempo tão necessitado de instrumentos críticos fortes.

 

A velha Europa é o palco frontal da crise neste momento e é certamente nela que se vai jogar uma boa parte do seu desenlace. Ficaremos a saber se existem ainda, nas suas classes populares, na sua juventude, a energia rebelde, a capacidade de iniciativa e a confiança nas suas próprias forças que lhes serão indispensáveis para levar a efeito uma viragem de destino de alcance histórico. De Eric Toussaint, publicamos ‘Oito proposições urgentes para uma outra Europa’, que pode bem ser um primeiro caderno de trabalhos e reivindicações para esse movimento. Do nosso companheiro Giovanni Alves, publicamos ‘A crise europeia e o «moínho satânico» do capitalismo global’, que contém uma reflexão sobre algumas importantes debilidades do movimento social europeu, como observadas por alguém vindo de fora. A ‘Declaração da conferência europeia da esquerda anticapitalista’ é um documento político atual, subscrito, entre outros, pelo Bloco de Esquerda, de Portugal. Deste partido, na sua prática política concreta, ainda não vislumbramos qualquer sinal de que defenda “nas mobilizações, assim como no terreno eleitoral, ou no parlamento, uma alternativa anticapitalista que ofereça uma perspectiva da ruptura com sociedade capitalista, ruptura que pode somente ser conseguida por um movimento de toda a população que desafie o poder absoluto que a oligarquia capitalista exerce sobre a sociedade e colocando a questão de um governo democrático dos trabalhadores e dos povos”.

 

Michael Lebowitz é outro velho amigo de ‘O Comuneiro’ e dele publicamos um extenso ensaio doutrinal, ‘O caminho para o desenvolvimento humano’, que pode ser uma excelente introdução contemporânea ao pensamento crítico marxista, para uso de uma nova geração. ‘A grande regressão’ do economista francês Jacques Généreux, é uma peça muito significativa, bem reveladora de que existe um novo pensamento crítico anticapitalista, mesmo a partir de quadrantes políticos convencionais e reformistas.

 

‘O desafio de uma economia democrática’ do nosso companheiro José Brendan Macdonald é uma reflexão oportuna e bem informada sobre a atualidade da reivindicação democrática e de auto-organização operária a partir do local de trabalho. Valério Arcary, em ‘Marx e Engels e as avaliações estratégicas após a derrota da Comuna de Paris’, questiona em que termos os fundadores do marxismo caucionaram efetivamente uma transição pacífica ao socialismo e, na medida em que o fizeram, se os seus pressupostos cobram ainda validade nos dias de hoje. Ângelo Novo, em ‘O 18 de Janeiro na história das ideias’, traz-nos uma reflexão histórica sobre o movimento operário português da primeira metade do século XX.

 

Como habitualmente, agradecemos toda a divulgação possível, nomeadamente em listas de correio, portais, blogues ou redes sociais de língua portuguesa. Comentários, críticas e sugestões serão benvindos. A partir da construção e alargamento constante de uma comunidade de leitores, gostaríamos que se firmasse também entre eles um compromisso de luta pela possibilidade de um outro mundo.

 

 

 

 

Pela Redação de ‘O Comuneiro’

 

Ângelo Novo

 

Ronaldo Fonseca