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A crise actual e as raízes do futuro
Devendo cada um produzir para ter dinheiro, isso conduz à acumulação do dinheiro e à apropriação das condições de produção por uma classe particular. É o desenvolvimento do capital (1), seguindo o esquema da reprodução simples D – M – D’. Na divisão do trabalho capitalista, o processo de produção é sempre constituído por uma multiplicidade de trocas, de metamorfoses. Cada capital-dinheiro deve poder transformar-se em diversos meios de produção, em matérias-primas, em força de trabalho, portanto também em meios de subsistência, etc.. Isto desmultiplica os «saltos perigosos» e as possibilidades de crise. Estas crises apresentam-se sempre como uma interrupção destas trocas num ponto qualquer da sua cadeia. São crises de desproporção: mercadorias que não podem ser vendidas, ou compradas, ou que se cria haver vendido (a crédito) mas não são pagas, ou que se compraram mas que não podem ser utilizadas, etc.. Com o desenvolvimento da acumulação capitalista tudo isto se resume – para lá da forma concreta, da causa imediata, do surgimento desta ou daquela crise – sob a forma de uma lei geral da acumulação capitalista: o desenvolvimento das forças produtivas é sempre mais importante que o aumento do consumo popular. Ou, dito de outro modo, há na apropriação privada das riquezas sociais sob todas as suas formas (materiais e intelectuais) um crescimento permanente do desnível entre o polo do capital e o polo do trabalho. Esta lei geral induz uma sobre-produção permanente de capital. Inicialmente localizada neste ou naquele ramo de produção, nos primeiros tempos do capitalismo, ela resolvia-se então por crises limitadas, rapidamente seguidas de retomas. Mas, com o prosseguimento da acumulação, ela torna-se, de ciclo em ciclo, cada vez mais uma sobre-produção generalizada. Ela é já uma crise generalizada e mundial desde a crise de 1929, que não pôde ser resolvida senão por intermédio da Segunda Grande Guerra. Nós sabemos o que quer dizer sobre-produção generalizada de capital: demasiado capital, sob todas as suas formas (dinheiro, mercadorias, máquinas, etc.) relativamente às suas possibilidades de valorização. Trata-se simplesmente do facto de que nem toda a mais-valia (MV) pode, num momento dado, transformar-se em capital adicional (CA). É uma característica da crise actual, que confirma brilhantemente o que Marx havia previsto através do seu conceito de «sobre-produção absoluta». Pode-se hoje, com efeito, ler frequentemente nos jornais, observações como esta: “os especialistas estão de acordo em pensar que, na Europa, este filão (as telecomunicações) vai gerar uma soma considerável, próxima dos 140 biliões de euros de «free cashflow» (liquidez disponível) ... Ora, que uso vai ser dado a este tesouro considerável?... À volta de metade vai ser gasto a limpar dívidas passadas. Mas que vai ser feito da outra metade?... Longe de ser utilizada em projectos de investimento... esta soma vai servir... para consolidações artificiais, para fusões que vão certamente alimentar a especulação mas que não têm uma forte racionalidade sob o plano industrial” (2). É uma constante que a falta de rentabilidade dos investimentos na produção, em termos de lucros para o capital, o conduzem a interessar-se apenas pelas manobras na esfera financeira e à procura de posições monopolistas pela compra ou a fusão com os concorrentes. “A produção estagna não quando a satisfação das necessidades o impõe, mas lá onde a criação e realização de lucros impõem essa estagnação” (3). Um jornal financeiro escreveu que “a máquina burguesa trabalha ao contrário” (4) ao constatar que a Bolsa distribuía mais dinheiro aos accionistas como dividendos do que aquele que estes lhe emprestavam para investir. Por exemplo, nos E. U. A., após 1985, “salvo durante o breve período 1991-1994, a Bolsa retirou sempre mais capital do que aquele que emitiu. A tal ponto que, apenas no decurso do ano de 2001, a emissão líquida de capital bolsista foi de menos 330 biliões de dólares”. E conclui então o editorialista: “... a abundância de liquidez distribuída aos accionistas, como dividendos ou resgate de acções, testemunha da ausência de projectos de crescimento – externo ou orgânico – da parte dos industriais.” Esta açambarcamento de mais-valia sob a forma fixa de capital-dinheiro intumesce de tal forma a esfera financeira que os agentes directores do capital, os Estados, não encontram melhor que fazer para relançar o processo de valorização do que abrir de par em par as comportas do crédito. O que desmultiplica o mesmo capital-dinheiro, em capital fictício, mas que acresce contudo do mesmo modo a sobre-produção de capital, aumentando a massa dos valores pretendentes à apropriação de uma parte da mais-valia social. Como toda a crise, a crise actual assinala um bloqueamento do processo de valorização. Para o relançar, é preciso reequilibrar a relação entre a massa do capital e a dos lucros. A crise é o momento em que a sobre-produção leva à desvalorização massiva de capital financeiro fictício e à destruição dos capitais menos produtivos, o que tem o duplo efeito de abaixar a massa global do capital e de aumentar o nível geral de produtividade, logo de aumentar a massa de mais-valia, sob a forma relativa. Os aumentos da produtividade social induzem na verdade uma baixa geral dos preços. O que tem uma tripla vantagem: 1) Para uma mesma quantidade de trabalho, um mesmo valor produzido, a mais-valia é maior, pois que o agregado do capital constante (Cc) com o capital variável (Cv) é mais pequeno. 2) As mercadorias são produzidas em maior número, mas a baixa dos preços aumenta o poder aquisitivo dos salários e permite o alargamento do consumo, logo a realização desta mais-valia acrescida. 3) A baixa dos preços de alguns elementos de Cc, tais como os meios de transporte, acrescida à simplificação do trabalho operário produzida pela mecanização, favorecem o alargamento mundial das bases da valorização e da acumulação do capital. Todavia, ao mesmo tempo, estes ganhos são minados pelo crescimento de efeitos contrários mais possantes, a longo termo. Eles conduzem aos «rendimentos decrescentes», em termos de lucros e dos ganhos de produtividade, bem como a uma forte desaceleração dos investimentos, ou até mesmo à sua paralisação pura e simples. Ora, o capital não pode relançar a sua acumulação e sair de uma crise senão através do aumento inevitável do nível geral da sua produtividade, logo também de um alargamento da sua área de valorização, da massa de indivíduos que ele pode assalariar a fim de compensar (e mais que compensar) a redução dessa massa implicada por uma elevação da produtividade. O que caracteriza a crise actual é que estes ganhos de produtividade se confrontam com a sua ineficácia relativa em termos de lucros, isto é, com o fenómeno dos «rendimentos decrescentes». São estes os limites do projecto em curso da “globalização”. O âmago da questão é a diminuição do trabalho vivo produtivo que é trazida inevitavelmente pelos ganhos de produtividade. Numa primeira fase ela é uma diminuição apenas relativa, face ao aumento do trabalho morto (nomeadamente o capital fixo). A massa operária empregada continua a crescer com o alargamento da produção e a globalização do modo de produção capitalista. Mas a composição orgânica, ou seja, a proporção de trabalho morto relativamente ao trabalho vivo pago pelo capital, vai aumentando inexoravelmente. Apesar do seu carácter aproximativo – que se atenua, porém, desde que se tenha em conta a medida geral das evoluções – as estatísticas mostram claramente esta tendência histórica. Por exemplo, o estudo da relação entre PIB e capital fixo mostra que aquele decresce regularmente no confronto, o que demonstra a parte cada vez mais importante que tem o trabalho morto no valor da produção (o que não é surpresa, evidentemente). Nos E.U.A., de uma rácio de 14,20 em 1820 passamos para uma rácio de 4,98 em 1870, 1,73 em 1929, 1,17 em 1992 (5). Em sentido contrário a este aumento da composição orgânica, há uma elevação constante da riqueza produzida por hora de trabalho, o que manifesta o aumento da taxa de exploração (6). Todos os países industriais conhecem esta tendência. De tal forma que se torna cada vez mais difícil para o capital economizar tempo de trabalho, pois que este é já cada vez menos utilizado, em relação com a riqueza produzida e os meios mecânicos utilizados. Aproximamo-nos assim, mas sem que jamais o atinjamos verdadeiramente, de forma assintótica, de um limite absoluto. A acumulação tende a estagnar, mas através de movimentos soluçantes de avanço e recuo. Não é o imobilismo mas, pelo contrário, uma instabilidade permanente, com curtas remissões seguidas de longas recaídas, sem que se vislumbre o mínimo sinal de uma melhoria durável. Que os arautos do capital proclamem vê-la enfim, definitivamente, a cada retoma, não surpreende. Fazem apenas aquilo pelo qual são pagos, de forma cada vez mais enfadonha. Não apenas a quantidade de trabalho vivo que o capital pode empregar produtivamente tende a estagnar, ou mesmo diminuir de forma absoluta (como iremos ver já de seguida), mas a taxa de exploração (Mv – Cv) que poderia compensar esta diminuição não pode também ser aumentada indefinidamente. Há um limite, posto pela resistência operária. Além disso, como é óbvio, os efeitos da elevação da taxa de exploração sobre a massa de mais-valia produzida diminuem, com a diminuição do número de operários sobre a qual ela incide. Por fim, esta diminuição da quantidade do trabalho pago põe ao capital a eterna questão do limite do sub-consumo, que se aproxima aceleradamente ao mesmo tempo que o aumento da produção induzido pelo aperfeiçoamento das máquinas. Deste modo, verifica-se que, como a quantidade de trabalho vivo empregue é ao mesmo tempo a base fundamental da produção da mais-valia e também da sua realização, a sua diminuição leva necessariamente a um momento em que a massa mesma dessa mais-valia não pode já ser aumentada, ou só o pode muito tenuemente. Esse momento coincide também com o da impossibilidade para o capital de abaixar ainda mais os salários, pois que ele já foi procurar os salários mais baixos possíveis em todos os cantos do planeta, e porque a resistência dos operários aumenta com a sua crescente exploração. A crise actual manifesta concretamente, com fragor, toda esta lógica, de múltiplas formas. Podemos recordar as principais, que são também as mais visíveis, ao ponto de todos os economistas as terem de constatar eles mesmos. 1) A sobre-produção de capital infla imensas bolhas financeiras (fuga para ao investimento produtivo não rentável, «armadilha da liquidez» organizada pelos Estados e as suas dívidas gigantescas). 2) A taxa de crescimento diminui regularmente a longo prazo, apesar de todos os esforços feitos pelos Estados para socializar, pela via da dívida pública, a valorização do capital. Por exemplo, em França, “o crescimento era em média de 5,6% nos anos 60, de 3,7% nos anos 70, não sendo já mais de 2,2% nos anos 80 e apenas 1,8% em média nos anos 1990” (7). Isto é assim por todo o lado, com a excepção – provisória, porque conjuntural e frágil – de alguns países como a China. 3) Apesar de não haver ainda um crescimento zero, o desemprego, o sub-emprego e a precaridade aumentam por todo o lado. Aí incluídos os países ricos, que todavia beneficiaram enormemente do sobressalto de crescimento devido à globalização liberal, e puderam sobre essa base criar alguns empregos de “quadros”, e de serviços para esses mesmos quadros. Em França, em 2003, o saldo da criação e da destruição de empregos foi negativo em 67.000 postos (8), e a quantidade de trabalho diminuiu ainda muito mais se tivermos em conta o trabalho precário e a tempo parcial. A tendência é, em todo o mundo, para a diminuição absoluta do número de empregos, e não apenas para a elevação relativa do desemprego por efeito do crescimento demográfico. 4) O crescimento da produtividade baixa, sobretudo na indústria. A globalização permitiu certamente uma formidável baixa dos salários. O capitalista e os seus porta-vozes chamam-lhe alta da produtividade porque eles chamam assim a toda a alta dos lucros em relação ao capital avançado. Mas a globalização permitiu esta alta nos lucros pelo aumento da mais-valia sob a sua forma absoluta, ou seja, sem maquinarias mais aperfeiçoadas nem empregos acrescidos, sem investimentos de produtividade (9), a não ser que consideremos como tal os custos das deslocalizações. A fazer as vezes da alta de produtividade temos hoje sobretudo as altas dos lucros por baixa absoluta dos salários (globalização, precaridade, flexibilização), e pela utilização mais intensiva dos meios de produção existentes (eles são frequentemente utilizados a menos de 75% da sua capacidade, outro sinal da sobre-produção de capital). Sem esquecer, é claro, a eliminação dos capitais menos produtivos (logo, aumentando a produtividade média), que é típica de todas as crises. Todo isto se faz, evidentemente, sem investimento (a não ser, é claro, as fusões e aquisições de empresas, que não produzem nada de novo, a não ser desemprego), sem empregos produtivos suplementares, sem crescimento industrial, ou com muito pouco. É certo que a baixa geral dos preços permite aumentar a mais-valia relativa, mas esta possibilidade é muito limitada quando a quantidade de trabalho é já muito pequena, continuando a baixar muito rapidamente. 5) Os preços dos produtos manufacturados não cessam de baixar. Se considerarmos a gigantesca inflação monetária que se desenvolveu neste últimos anos, uma baixa, ou mesmo tão só uma estagnação dos preços nominais acarreta um afundamento dos preços «reais», ou seja, dos valores desses produtos. Afundamento esse que manifesta a queda das quantidades de trabalho neles contidos. De tal modo que a taxa de exploração (a relação entre a parte paga e a parte gratuita do trabalho vivo) pode bem aumentar com a baixa dos preços, sem que isso chegue já para produzir mais lucros. Isto porque a diminuição da quantidade de trabalho vivo é de tal ordem que arrasta também consigo a diminuição do trabalho gratuito - isto é, da massa dos lucros – apesar desse aumento da taxa de exploração. Tal é a característica principal da crise moderna, a causa imediata da sobre-produção absoluta de capital. Esta aparece pois concretamente, em essência, como uma consequência dos ganhos de produtividade, dado que estes acabaram por causar uma diminuição do trabalho vivo de tal ordem que aniquila os aumentos da mais-valia também por eles causados. Esta é uma tendência forte. Segundo J. Gouverneur, por exemplo, nos E. U. A., os valores dos bens de consumo já baixaram cerca de 55% no período 1948-1991 (10). E isso continua. Sempre nos E. U. A., “os preços dos bens duráveis regrediram 4,1% em 2003 (11). Marx tinha já encarado estes desenvolvimentos, que eram simplesmente lógicos na sua época mas que se tornaram hoje concretos. “Com o desenvolvimento da produção, a soma de trabalho vivo integrada em cada mercadoria singular diminui absolutamente, e essa baixa toma proporções tão consideráveis que faz baixar também em valor absoluto a massa de trabalho não pago que a mercadoria contém, qualquer que seja o seu aumento relativo com respeito à fracção paga. A massa de lucro por mercadoria será pois fortemente reduzida, à medida que se desenvolva a força produtiva do trabalho, maugrado a elevação da taxa de mais-valia...” (12). O que é notável e bem característico da crise moderna é que esta argumentação teórica se verifica hoje. Progressivamente, a «lei de dupla face» dos lucros apaga-se. Não somente a taxa de lucro diminui, mas a própria massa tem crescentes dificuldades em aumentar. Quando o capital atinge um estádio histórico da sua acumulação em que o nível da produtividade média é tal, em todo o lado no mundo, que qualquer elevação suplementar se confronta com o limite dos «rendimentos decrescentes», então ele chegou à sua idade senil. Pois que se todas as crises da sua fase madura se podiam resolver pelas altas da produtividade e consequente aumento da massa de mais-valia relativa, eis que isso agora não é mais possível. Os ganhos de produtividade e a economia de tempo de trabalho que eram a sua «vocação histórica», o seu papel progressivo na história, eis que tudo isto já não lhe interessa mais. Isto pela única, tacanha e mesquinha razão de que eles já não lhe permitem aumentar a mais-valia. “Por isso mesmo ele prova, uma vez mais, ter entrado num período senil, e cada vez mais vai apenas sobrevivendo-se a si próprio” (13). Esses ganhos de produtividade permitiriam, é certo, economizar sofrimento humano, trabalho penoso, mas isso não interessa minimamente ao capital. Não é esse progresso em direcção à liberdade que o motiva, mas apenas o lucro, os progressos da alienação humana pela dominação do dinheiro. Que o capital se sobreviva não quer dizer que se vá desmoronar sozinho. Quer simplesmente dizer que o desenvolvimento de novas forças produtivas, de uma maior eficácia, estagna. A acumulação capitalista estagna, através dos perpétuos movimentos de alta e de baixa, de bolhas e de crashes, de inovações que são tão ou mais destrutivas que construtivas (em vez de serem as «destruições criativas» preconizadas por Schumpeter e outros darwinistas sociais). Está permanentemente em sofrimento, doente, em crise. “O verdadeiro limite à produção capitalista é o capital ele mesmo...” (14) dizia Marx. Alguns acreditaram poder concluir desta observação que o capital se desmoronaria por si próprio, sob o peso das suas contradições «económicas» (15), tais como a baixa da taxa de lucro, a sobre-produção absoluta de capital, o bloqueamento da acumulação. Ora, o capital é uma relação social, uma relação de apropriação que não pode ser abolida senão pelo remoção não apenas dos proprietários em título, mas também de todas as condições que produzem a propriedade (16). Só uma revolução social (da qual a revolução política é apenas um meio) pode abolir essas relações que são sociais. A era das revoluções proletárias abriu-se na Europa no século XIX. O seu teatro é hoje em dia planetário. O que se pode dizer desta fase de senilidade em que entrou o capitalismo, é que a «barreira» oposta à reprodução acumuladora do capital é de uma tal consistência que o conduz – a si e à sociedade capitalista – a uma situação de crise crónica. Isto é, a tentativas permanentes, desesperadas, ineficazes e sempre recomeçadas de franquear os seus limites, criando as condições para uma produção acrescida de mais-valia. É pois uma luta de classes permanente contra o proletariado que deve agravar-se incessantemente. Constatamo-lo facilmente hoje, mas frequentemente sem ver que não se trata de uma questão de «maldade» mas de uma verdadeira necessidade para o capital. Apesar desta luta intensa, ele não se desenvolve (ou fá-lo muito debilmente), mas apenas sobrevive. Os factos testemunham disso mesmo. Por exemplo: - o crescimento da pauperização, não apenas relativa mas absoluta, que se constata por todo o mundo do capital globalizado, traduzindo-se nomeadamente por fomes, pandemias, epidemias ferozes, uma miséria galopante em megapólis monstruosas; - a multiplicação das guerras nos quatro cantos do mundo para tentar manter a ordem necessária aos livres movimentos do capital e das mercadorias, ou para rivalizar na apropriação de matérias-primas e de mercados; - a evolução totalitária da democracia burguesa. Todos estes factos são outros tantos exemplos evidentes da intensificação da luta de classes que a burguesia deve imperiosamente mover para tentar organizar a sobrevivência do capitalismo (e com ela a sua própria), na sua fase senil. O limite último do capital está nesta obrigação de conduzir uma luta total, uma guerra aberta, contra o proletariado mundial. É que a burguesia não pode mais manter a coesão social pela «reforma» distribuidora de migalhas, que tinha culminado no Estado-providência dos anos 50 na Europa. Ela pode apenas sobreviver através de uma guerra de classe intensa e constante. Até que finalmente a perca. O escândalo do modo de produção capitalista é que ele impõe assim um despontar de pobreza e morte no momento mesmo em que (não sendo embora esse o seu objectivo, o que é indiferente) ele havia reunido todas as condições que permitiriam satisfazer as necessidades humanas – e mais ainda, de as enriquecer, de as desenvolver – com muito pouco custo em termos de esforço e desgaste físico. É isso mesmo, esta eficácia tão grande do trabalho mecanizado, que constitui uma calamidade tal para o capital que o conduz às guerras e às destruições de todo o tipo. Quando essa mesma eficácia, produto genial do desenvolvimento humano histórico, permite hoje encarar com realismo uma humanidade desembaraçada da dominação do trabalho constrangido, artística e intelectualmente limitado. A humanidade poderia viver numa abundância real mas razoável, porque controlada, na qual os homens se poderiam construir a si próprios por intermédio do trabalho e das actividades livres. É todo este magnífico potencial – homens com necessidades ricas, ocupados em actividades elevadas, alargando sem cessar «o processo da vida» - que o capital impede de se realizar e de se expandir. Isto porque ele não pode ter outro fim senão o objectivo mesquinho, limitado, alienante, de submeter o desenvolvimento da capacidade produtiva dos homens à criação de mais-valia. E assim mergulha o planeta inteiro em catástrofes cada vez maiores, porque o meio - o aumento da produtividade - que ele necessariamente emprega para prosseguir aquele objectivo produz por fim o efeito contrário. O meio, o «desenvolvimento incondicionado da produtividade social», torna-se antagónico com esse fim limitado: «a valorização do capital existente» (17), a obtenção de um máximo de trabalho vivo gratuito. Com o capitalismo senil, o escândalo é de uma tal amplitude que coloca a exigência da condenação do capital à pena capital. Como tolerar que um excesso de dinheiro, de meios de produção, de mercadorias, se faça acompanhar de um «excesso» cada vez maior de desempregados e de miséria? Como tolerar destruições massivas e permanentes de riquezas, ao mesmo tempo que se dá uma expansão massiva e permanente da pobreza? Como tolerar que tanto tempo liberto das necessidades do trabalho constrangido seja transformado em tempo de embrutecimento e de alienação? A senilidade do capital constitui pois o facto de que, tendo ele atingido uma imensa eficácia produtiva do trabalho humano, esta se lhe torna insuportável. No seu célebre resumo do movimento histórico Marx exprimiu perfeitamente este antagonismo: “a um certo estádio do seu desenvolvimento, as forças produtivas entram em contradição com as relações de propriedade no seio das quais elas se moveram até então... Abre-se então uma época de revolução social” (18). A senilidade do capitalismo não conduz a uma morte natural, mas ao reforço desta exigência, desta necessidade de revolução social que se torna mais forte que nunca. Eis a conclusão à qual conduz a análise da crise do capital moderno. Ela é, como é evidente, exactamente contrária às efabulações interessadas daqueles que afirmam que entramos na época do «fim da história», da vitória definitiva da democracia e do livre mercado – isto, é do capitalismo – sobre o comunismo – isto é, a abolição das classes e a comunidade internacional dos indivíduos sociais. Mas ela opõe-se também às teorias mais hipócritas que, com o manto da crítica de alguns aspectos isolados do capitalismo, mascaram a sua oposição a esta revolução social que deve conduzir à abolição das relações de propriedade privada. É este hoje o caso, nomeadamente, daqueles que querem caiar de novo a fachada do reformismo social-democrata, esse velho e manhoso inimigo do proletariado, hoje tão senil, degradado e apodrecido como o conjunto da classe da qual representa uma facção – a burguesia. A sua ideia, sabemo-lo bem, é criticar, não o capital, mas apenas algumas das suas consequências, apresentadas como sendo «excessos». O inimigo seria, por exemplo, tão só o capital financeiro e a «globalização liberal». Repitamos, uma vez mais, que a globalização liberal não é a causa da crise. Ela, pelo contrário, deu mesmo um novo sopro de vida à acumulação do capital. O que é significativo é que este não tenha conseguido sair da crise apesar da globalização liberal, e não por causa dela. O que é significativo é que, apesar da amplitude considerável da baixa dos custos do trabalho e do alargamento da sua área de valorização a centenas de milhões de novos proletários (arrancados aos campos), de que pôde beneficiar nestes últimos trinta anos, o capital não pôde ainda assim retomar um ciclo de acumulação durável. Eis o que só a teoria marxista pode explicar, como tentamos expor precedentemente. E quando a causa é assim encontrada, o remédio pode sê-lo também. Aparentemente de opinião inversa à destes apologistas de um alter-capitalismo reformado e humanizado, outros ideólogos profetizam que o capital vai de algum modo ruir por si próprio, ou quase. Segundo estes, soou a hora do «fim do trabalho». E, evidentemente, se não há mais trabalho, não há mais proletariado nem burguesia. Estas criaturas tomam o pretexto da real e forte diminuição da quantidade do trabalho vivo utilizado pelos modernos meios de produção para esquecer que elas próprias são alimentadas, alojadas, aquecidas, vestidas, transportadas, lavadas, curadas, como toda a gente, pelo trabalho de centenas de milhões de proletários e de camponeses de todo o mundo. Anunciar o «fim do trabalho» e a chegada da era dos robots, é tentar desembaraçar-se do proletariado de forma demasiado expedita (19). E, com ele, do capitalismo também. É também esquecer que o capital senil sobrevive, isto é, mantém em vida o trabalho proletarizado, por intermédio de destruições e criações permanentes, desvalorizações e valorizações com a amplitude necessária à sua sobrevivência. Pode mesmo ainda acumular um pouco, ao custo de uma exploração ainda mais violenta dos proletários e da natureza. E é isso mesmo que ele faz, com risco de destruição para o planeta e os seus habitantes. Tudo isto mostra claramente que chegou para ele a hora de se retirar, como o dizia Marx amavelmente (20). Mas para isso temos ainda que passar pelo processo de transformação das relações de apropriação que o vai permitir. Isto é, por um período de lutas de classes, de ditadura do proletariado, que todos os humanistas e legalo-progressistas abominan particularmente, pois que é a revolução não por palavras, mas na prática. Não é simples, doce e garantida, mas complicada, dura, e eventualmente vencida. Resumidamente, o fim do trabalho constrangido, do «reino da necessidade», para dar lugar ao domínio do trabalho livre, ao «reino da liberdade», necessita ainda de grandes desenvolvimentos das forças produtivas. Eles serão possíveis muito fácil e rapidamente, tendo em conta o nível científico e tecnológico já atingido, quando esses conhecimentos puderem ser apropriados e desenvolvidos por todos os indivíduos graças ao tempo disponível que lhes pode ser abundantemente facultado, o qual é a verdadeira riqueza proporcionada pela produtividade. E o que é que impede este desenvolvimento da potência produtiva dos homens, base para que eles se construam a si próprios de forma livre, responsáveis pelo seu próprio desenvolvimento como homens? Simplesmente, as relações de apropriação privada que bloqueiam este desenvolvimento, desde que ele não seja mais produtor de mais-valia, desde pois que ele diminua «demasiado» o trabalho proletário, o trabalho forçado, o trabalho alienado. É pois esta propriedade privada das condições de produção que é preciso eliminar para sair da crise permanente do capital e dar livre curso ao desenvolvimento humano. Mas, para levar as coisas até à própria raiz, o que é ao certo esta propriedade privada que bloqueia o desenvolvimento da potência produtiva dos homens? Não é tanto aquela dos pequenos produtores ou do capitalismo familiar que, hoje em dia, não detém senão uma parte mínima da propriedade das condições da produção. Estas aqui, pelo menos no plano jurídico, estão teoricamente nas mãos de uma miríade de accionistas, de aforradores, na sua maior parte mais credores do que proprietários de um capital que, hiper-centralizado, está separado deles e escapa de facto ao seu controlo. Este capital concentrado “aparece cada vez mais como um poder social (e não mais privado, nota do autor TT) do qual o capitalista é agente” (21). Seria preciso dizer pois que os capitalistas são os agentes. São todos aqueles que dirigem e organizam a produção da mais-valia, isto é, aqueles que detêm o controlo desta produção, a qualquer título que seja. Não são apenas os proprietários jurídicos do capital-dinheiro, os quais personificam ainda por vezes o capital enquanto indivíduos isolados, ou mais geralmente o representam anonimamente enquanto «a Bolsa», «a Finança». É que a propriedade é uma coisa bem diversa da simples posse de títulos portadores de juros ou dividendos. É uma coisa diversa de um direito reconhecido pela lei. Ela é um comportamento de apropriação das condições concretas de existência, a começar pela mais fundamental dessas condições: os meios de subsistência e de produção. Aqueles que detêm os meios para exercer esta apropriação dominam a vida daqueles que deles estão privados, e podem consequentemente apropriar-se do trabalho destes últimos, comandando-o. Eles comandam o trabalho porque detêm o controlo sobre as suas condições, tais como organização, cooperação, ferramentas, ciência, tecnologia, etc.. Apropriar-se é controlar, poder utilizar ao seu gosto e em seu proveito. O comportamento de apropriação está alicerçado nos meios que se possuem para fazer isto (22). Hoje em dia, a apropriação real das condições de produção está nas mãos de uma classe burguesa formada de múltiplas potências especializadas: administradores, engenheiros, comerciantes, financeiros, altos funcionários, etc.. Nenhum deles controla sozinho o processo de valorização, do qual são todos agentes, todos rivalizando para a apropriação da maior fatia possível de mais-valia. Mas colectivamente eles são um só face ao proletariado, e reciprocamente. Eles são apenas os agentes do capital, pois que não existem como potências apropriadoras da riqueza social senão enquanto organizam a existência (e portanto a valorização) do capital. Eles exercem estas funções porque os meios para isso são sua propriedade. Porque que se apropriaram das condições materiais e intelectuais, objectivas e subjectivas, da produção. Se se compreende que a propriedade privada das condições da produção é que é a raiz das contradições que conduzem à crise generalizada de que expusemos as principais características; se portanto se compreendeu que é esta raiz que é preciso erradicar para sair da situação escandalosa e catastrófica em que o capitalismo senil mergulhou três quartos da humanidade; então é preciso entender também esta propriedade como esse comportamento de apropriação por uma classe particular do «intelecto geral», dessa quintessência do património legado pelas gerações passadas. Sabendo o que é preciso erradicar, que vai muito para além da simples propriedade jurídica e financeira (que em si é simples de eliminar), permanece a questão: podemos aí chegar? A resposta é conhecida. É possível porque o capitalismo cria as condições da sua superação ao mesmo tempo que os obstáculos à sua existência. O que é obstáculo para ele é promessa para a humanidade. Os obstáculos? Conhecemos bem aqueles que formam a última barreira. O capital não existe senão pela mão dos proletários, mas reduzindo-os a uma tal miséria que os obriga a revoltarem-se, apesar da a maior parte deles se contentar com muito pouco. Não existe senão pelo seu trabalho, e no entanto diminui-o sem cessar, com o aumento da produtividade. “Um desenvolvimento das forças produtivas que reduzisse o número absoluto dos operários… levaria a uma revolução, porque colocaria a maioria da população fora de circuito” (23). Aquilo que o capital desenvolve – o proletariado e a potência produtiva – são para ele calamidades, e são exactamente ao mesmo tempo as forças e as condições de uma comunidade futura liberta da exploração do homem pelo homem. Estas forças e condições objectivas positivas crescem historicamente ao mesmo tempo que as dificuldades do capital em prosseguir a sua acumulação, em reproduzir a sociedade burguesa (24). As principais destas potencialidades objectivas são as seguintes: - A produção de uma grande quantidade de valores de uso ao preço de quantidades de trabalho (ou valores de troca, nas sociedades capitalistas) cada vez mais reduzidas. Ou seja, a produção da «abundância», que o mesmo é dizer nada menos que ser libertado dos trabalhos vulgares, extenuantes e pobres em conteúdo artístico e intelectual. - Seja ainda, vista a coisa de um outro ângulo, a produção da verdadeira riqueza: o tempo disponível, condição necessária (ainda que não suficiente) para que cada um possa desenvolver-se através de actividades superiores – científicas, artísticas, etc. – como homem rico de qualidades, e por essa via desenvolver todos os outros, reciprocamente, por intermédio da troca de qualidades diversas. - O património da humanidade já não está parcelizado em diversas pequenas culturas locais ou regionais limitadas, recolhidas sobre si próprias e obnubiladas pela obsessão conservacionista. Ele constituiu-se num vasto e universal «intelecto geral», do qual portanto todo e qualquer um se pode apropriar, para o utilizar, aperfeiçoar e desenvolver, tendo para isso tempo livre. Daí um desenvolvimento universal ainda mais rápido e mais elevado da humanidade. - A existência de um vasto proletariado mundial, indivíduos cada vez mais despojados de toda a propriedade sobre as condições da sua existência pelo pólo do capital, e por isso mesmo obrigados por ele a unir-se na luta pela existência. Esta luta verificar-se-á não poder ser outra senão uma luta revolucionária, à medida que o capital for constrangido a colocar uma massa cada vez maior da população «fora de circuito». O tempo disponível, tempo não empregue em trabalho constrangido, aparece como o eixo central objectivo de tudo isto: a raiz da crise e a raiz do futuro. Sob o capitalismo ele é uma calamidade, para o capital como para os proletários. O que demonstra também o esgotamento deste modo de produção. “Desde que o trabalho sob a sua forma imediata deixou de ser a grande fonte de riqueza, o tempo de trabalho deixa necessariamente de ser a sua medida, e de seguida, o valor de troca deixa de ser a medida do valor de uso… Isto significa o desmoronamento da produção repousando baseada no valor de troca…” (25). Este desmoronamento necessita, como sua primeira condição, do derrube do poder do Estado burguês. Mas a tomada do poder político pelas forças da revolução não é a abolição das relações burguesas de apropriação. Ela não é senão um meio necessário para aí chegar. A história mostrou já abundantemente que este meio podia se voltar contra aquele fim, pois que ele se mantém inelutavelmente ligado à persistência das relações de apropriação, podendo tão bem combatê-las como reproduzi-las. A tomada do poder político permite à partida aumentar consideravelmente o tempo disponível, pela eliminação de todo o tipo de produções e actividades parasitárias tornadas inúteis, bem como pela partilha de todo o trabalho constrangido remanescente entre todos (26). O tempo livre assim disponibilizado torna-se então uma base para a conquista dos meios para uma apropriação por todos das condições de trabalho, objectivas e subjectivas (ciência, tecnologia, cooperação, planificação). “O tempo livre, que é tanto tempo de lazer como tempo destinado a uma actividade superior – transformou naturalmente o seu possuidor num sujeito diferente e é enquanto tal que ele entra agora no processo de produção imediata” (27). Quanto mais crescem as capacidades científicas dos produtores, mais eles podem controlar o processo de produção e, para lá disso, a sua vida social. E também mais a produtividade pode ser desmultiplicada, pela participação de todas as inteligências nos progressos tecnológicos. O que acelera ainda mais a produção de tempo livre disponível por todos para se apropriar e desenvolver o «intelecto geral». Desencadeia-se assim uma espiral positiva na dialéctica tempo livre / tempo de trabalho, que acaba por reduzir a pouco o tempo de trabalho constrangido e fazer de toda a actividade (ou quase) um trabalho rico. Para o capital, a contradição trabalho necessário / sobre-trabalho (ou trabalho pago / trabalho gratuito) acaba por se tornar antagónica, pois que para ele a diminuição do primeiro termo, que ele persegue com todas as suas forças, acaba por arrastar a desaparição do segundo, o que provoca crises destruidoras. Pelo contrário, o socialismo destrói esta contradição pela apropriação por todos do trabalho, ou seja, das suas condições (e, por conseguinte, dos seus resultados). Esta apropriação permite fazer do trabalho um só tempo: ele é calculado não para acrescer, apenas e ao máximo, o sobre-trabalho dos proletários, mas para satisfazer as necessidades imediatas e futuras (o «alargamento da vida») do conjunto da sociedade. É pois um tempo para os trabalhadores, determinado por eles, que decidem que trabalho dedicar às necessidades imediatas e que trabalho dedicar ao desenvolvimento. Ademais, o verdadeiro critério da economia torna-se a economia do tempo de trabalho. “Não é mais então o tempo de trabalho, mas o tempo disponível que se torna a medida da riqueza” (28). Então o tempo de trabalho constrangido não se opõe mais de forma antagónica ao tempo disponível, pois que não é já tempo sacrificado face ao tempo para gozar a vida. É que agora o primeiro é deste modo destinado a acrescer o segundo, e o segundo a transformar o primeiro em tempo de trabalho rico, segundo o movimento dialéctico acima evocado. Repitamo-lo, a apropriação da construção da vida é a apropriação do trabalho, a apropriação de todas as condições do trabalho, objectivas e subjectivas. É isso a modificação das relações de propriedade, a revolução social. Não é senão através da dialéctica tempo de trabalho / tempo disponível que se pode fazer a apropriação das condições subjectivas. Ela é também uma luta, pois que a burguesia defende por mil meios, os mais subtis, os mais dissimulados, tanto (se não mais) a sua apropriação das condições subjectivas como a das condições objectivas. Donde a necessidade de um período mais ou menos longo de transição, após o derrube do Estado burguês oficial, para que este processo possa se completar plenamente, conseguir a apropriação por todos do «intelecto geral». Não haverá então senão um só tempo: a vida, a construção, o alargamento da vida. A crise do capital senil abre uma época de intensas lutas de classes, na qual o que está em jogo é nada menos que a vida, a degradação da vida ou o seu alargamento. A aposta consiste na apropriação por todos das condições de trabalho. O que é ao mesmo tempo a transformação do trabalho constrangido e alienado em trabalho rico e livre. O que é catastrófico para o capital, obrigando-o a destruir o planeta, é também aquilo que pode permitir realizar estas transformações revolucionárias. Esta constatação indica que o sucesso nesta empresa histórica é não somente razoável, mas bem possível.
(*) Tom Thomas é um ensaísta marxista francês, residente em Paris. Durante muitos anos militou em diversos agrupamentos da esquerda marxista-leninista, tendo fundado 'La Voie Proletarienne'. Actualmente é um escritor independente, sempre comprometido. É autor já de uma vasta obra, da qual alguns títulos foram publicados em português nas edições Dinossauro. O presente texto é uma tradução (ligeiramente adaptada) do último capítulo de um dos seus livros mais recentes, ‘La crise chronique ou le stade sénile du capitalisme’, Bruxelas, Contradictions, 2004.
(1) “É a separação entre as condições do trabalho, por um lado, e os trabalhadores, por outro, que constitui o conceito de capital.” Karl Marx, Le Capital, III, 1, p. 259, Éditions Sociales. (2) ‘Le Monde’, 24.02.2004. (3) Karl Marx, Le Capital, III, 1, p. 271, Editions Sociales. Sub-consumo das massas, ou sobre-produção de capital, ou ainda baixa da taxa de lucro por aumento da composição orgânica do capital, tudo isto não são senão formas diferentes pelas quais se exprime, sob o capitalismo, o mesmo fenómeno dos progressos da produtividade social do trabalho, o desenvolvimento da potência produtiva da sociedade (cf. também, Le Capital, III, 1, p. 227). Não se trata portanto de causas diversas da crise entre as quais Marx tenha hesitado, como têm afirmado certos comentadores apressados. (4) ‘Les Echos’, 16-17/04/2004. Y. de Kerdriel, editorialista. (5) Estudo citado em Actuel Marx, J. Johsua, ‘Le Grand Tournant’, quadro 2.1, p. 29. Evidentemente, não é só o capital fixo que aumenta, mas com ele todo o trabalho passado utilisado pela maquinaria: energia, matérias-primas, produtos semi-acabados, etc.. Quanto mais desenvolvidas são as forças produtivas, mais aumenta a quantidade de trabalho passado (adquirido pelo capital constante) consumido com o mais pequeno aumento da produção. Daí os aumentos brutais dos preços das matérias-primas que se constatam aquando dos bruscos (e breves) fogachos de crescimento, como por exemplo em 2004 devido à procura chinesa. (6) Ibidem, quadro 2.2., p. 33. (7) Fonte: INSEE, ‘Le Monde’, 17.06.2003. (8) Segundo o INSEE, citado em ‘La Tribune’, 20.04.2004. (9) “A Ásia obteve taxas de crescimento notáveis sem um aumento equivalente da produtividade. Este crescimento foi mais o produto da mobilização de recursos (da mão-de-obra barata, dizemos nós, TT) do que da eficácia, da transpiração do que da inspiração”, Paul Krugman, citado em ‘Problèmes Économiques’, n.º 2846, 3.3.2004. (10) J. Gouverneur, ‘Les fondements de l’économie capitaliste’, Bruxelles, Contradictions-l’Harmattan, 1994, p. 190. É interessante aqui recordar que os custos de fabricação pesam pouco nos preços finais, em relação com os custos anexos, por exemplo os custos de gestão, financeiros ou de «colocação no mercado» (publicidade, embalagem, marketing), etc. Há vinte anos, D. Clerc et alii estimavam-nos já, “para muitos produtos”, a menos de 20% do preço final (em ‘La crise’, p. 65). (11) Estudo da Merril Lynch, citado em ‘Le Monde’, 9.12.2003. (12) Karl Marx, ‘Le Capital’, III, 1, p. 239, Éditions Sociales. (13) Ibidem, p. 274. (14) Ibidem, p. 263. (15) Daí a sua caracterização como «deterministas» ou «economicistas». (16) Sobre esta questão, leia-se Tom Thomas, ‘Karl Marx et la transition au communisme’, Paris, Albatroz, 2002. (17) Karl Marx, ‘Le Capital’, III, 1, p. 263, Éditions Sociales. (18) Karl Marx, ‘Contribution à la critique de l’Économie Politique’, Editions Sociales, p. 4 (prefácio). (19) Sobre este assunto, leia-se Tom Thomas, ‘Ni fin du travail, ni travail sans fins’, Paris, Albatroz, 1988. (20) “A destruição violenta do capital, não por circunstâncias que lhe são exteriores, mas como condição da sua própria conservação, é a forma mais flagrante do conselho que lhe é dado para se retirar de modo a dar lugar a um nível superior de produção social.” Karl Marx, ‘Grundrisse’, II, p. 237-238, Éditions Sociales. (21) Karl Marx, ‘Le Capital’, III, 1, p. 276, Éditions Sociales. (22) Para maiores desenvolvimentos, leia-se Tom Thomas, ‘Karl Marx et la transition au communisme’, capítulos 4 e 5, Paris, Albatroz, 2002. (23) Karl Marx, ‘Le Capital’, III, 1, p. 276, Éditions Sociales. (24) Quando uma classe não tem senão o meio das guerras, policiais e militares, para se reproduzir, juntamente com o modo de produção por ela dominado, isso é claramente o sinal do seu esgotamento. (25) Karl Marx, ‘Grundrisse’, II, p. 193, Éditions Sociales. (26) Sobre este assunto, leia-se Tom Thomas, ‘Crise, technique et temps de travail’, Paris, Albatroz, 1998. (27) Karl Marx, ‘Grundrisse’, II, p. 200, Éditions Sociales. (28) Ibidem, p. 196.
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